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Batalha
Ninguém entendeu quando o Jorge e a Gisela voltaram da lua-de-mel separadose, em vez de constituírem um lar, constituíram advogados. Afinal, a não ser por alguma revelação insólita – um descobrir que o outro não era do sexo que dizia ser, ou era tarado, ou era, sei lá, um vampiro – , nada que acontece ou deixa de acontecer numa viagem de núpcias é tão terrível que não possa ser resolvido com tempo, compreensão ou terapia. E o sexo não poderia ter sido tão desastroso assim.
– Nã, não – disse o Jorge. – O sexo foi ótimo. O problema foi outro.
– Qual?
– Batalha-naval.
O sexo tinha sido tão bom que Jorge e Gisela ficaram uma semana sem sair da cama. Mas o amor, como se sabe, é como marcação sob pressão no futebol. Por mais bem preparados fisicamente que estejam os jogadores, eles não podem marcar sob pressão os 90 minutos.
E foi para preencher os intervalos entre o sexo que o Jorge propôs a Gisela que jogassem batalha-naval. Tinham o que era preciso no quarto, papel e lápis. Qualquer borda reta serviria como régua para fazerem os quadradinhos. Não precisavam sair da cama. E o vencedor poderia escolher a forma como se amariam, depois da batalha.
– Jota 11.
– Água. Bê quatro.
– Outro submarino.
– Viva eu!
Quem passasse pela porta do quarto dos recém-casados e ouvisse aquilo não entenderia o que acontecia lá dentro. Jorge e Gisela, nus sob os lençóis, um atirando seus mísseis imaginários sobre a frota do outro. Gisela, estranhamente, acertando mais do que Jorge. Que já tinha perdido dois submarinos e um cruzador quando finalmente acertou um disparo.
– Agá nove – cantou Jorge.
– Ih… – lamentou-se Gisela – Parte do meu porta-aviões.
– Arrá! – gritou Jorge, triunfante.
– Ele 12 – tentou Gisele.
– Água, água – disse Jorge, ansioso para terminar o serviço no porta-aviões inimigos – Agá dez!
– Água. Dê 13…
– Água. Agá oito…
– Água. Efe dois…
– Água. Gê nove.
– Água. Ele seis.
– Água. I nove!
– Água. Ene…
– Espera um pouquinho. Como, água?
– Água. Você acertou na água.
– Você me disse que agá nove era parte do seu porta-aviões.
– E é.
– Mas eu disparei em volta do agá nove e não acertei mais nada.
– Exatamente. Só acertou água.
– E onde está o resto do seu porta-aviões?
– E eu vou dizer? Engraçadinho! Tente adivinhar.
Jorge estava de boca aberta. Quando ele conseguiu falar, foi com a voz de quem acaba de encontrar uma nova forma de vida e tem medo de provocá-la.
– Deixa ver se eu entendi. O seu porta-aviões não está todo no mesmo lugar…
– Claro que não! Eu divido em quatro partes, e boto uma bem longe da outra. Assim fica mais difícil de atingir.
Os amigos concordaram que seria perigoso ficar casado com uma mulher que esquarteja e espalhava o seu porta-aviões. Por melhor que fosse o sexo, era preciso pensar no resto da vida, quando os intervalos ficariam cada vez maiores. Jorge nem chegou a contar que os submarinos de Gisela não constavam no diagrama de sua frota. Segundo ela, estavam submergidos, podiam estar em qualquer lugar, nem ela saberia onde encontrá-los. Era melhor pedir o divórcio.