Vivemos numa sociedade obcecada por tamanho. Isso pode ser observado em nossa história (marcada por inúmeros conflitos entre nações para ampliar seus territórios), na arquitetura, em nosso vocabulário e até mesmo na forma como interagimos uns com os outros. Homens mais altos são considerados mais “masculinos”, e algumas estatísticas indicam que eles conseguem mais sucesso tanto na vida profissional quanto na amorosa. Além disso, muitas pessoas que se julgam modernas e inteligentes continuam escolhendo seus parceiros com base no tamanho disso ou daquilo em seus corpos, um comportamento que, pra mim, é no mínimo pré-histórico (pra não dizer outra coisa).
Mas, e quanto aos games? Será que essa obsessão por grandeza, que está encravada de forma profunda em tantos aspectos da sociedade humana, é refletida em nosso passa-tempo favorito? Como exatamente isso influencia a forma como os jogos são criados, criticados e apreciados (ou não) nessa indústria? Clique no “continue” para descobrir o que eu penso sobre isso. 🙂
Com certeza vocês já leram análises de jogos que agradaram bastante seus críticos, mas não ganharam notas maiores por terem sido considerados curtos demais. Faz sentido, afinal de contas muitos desses jogos são caros e seus consumidores desejam que sejam longos para justificar o investimento. Atualmente, numa geração que, além de ter os jogos (e consoles) mais caros da história, foi atravessada por uma crise financeira mundial, o aspecto custo x duração é cada vez mais levado em conta pelas pessoas na hora de decidir se vale a pena adquirir um determinado título. Porém, embora seja indiscutível que uma boa duração pode ser fundamental para o sucesso de um jogo, também é óbvio que tamanho não é sinônimo de qualidade. Além disso, ao contrário do que muitos acreditam, eu não acho que aumentar a duração e a escala de um jogo — por melhor que ele seja — resultará necessariamente num produto melhor. Pelo contrário, isso pode acabar completamente com a harmonia do jogo em questão, destruindo todos os elementos que o faziam ser bom em primeiro lugar. Então, da mesma forma que alguns títulos são criticados por serem curtos demais, eu realmente acredito que outros podem (e devem) ser criticados por serem longos demais. Assim como para quase tudo na vida, a palavra-chave é equilíbrio, e geralmente os jogos mais bem sucedidos são aqueles que conseguem chegar mais perto de uma harmonia entre serem grandes o bastante para justificar o dinheiro e o tempo investido neles, e não serem grandes demais a ponto de se tornarem cansativos ou sobrecarregar os jogadores.
A ideia de escrever este post surgiu há aproximadamente três semanas, quando comecei a jogar The Elder Scrolls IV: Oblivion. Eu, que sou completamente fanático por JRPGs, acompanho à distância a briga que as duas principais escolas travam atualmente pela hegemonia do gênero. Como só este ano consegui passar mais de dois meses com um console HD — e meu Wii deixava muito a desejar nesse aspecto —, apenas recentemente consegui experimentar meus primeiros RPGs de sétima geração (Enchanted Arms, Blue Dragon e agora Oblivion). Como isso é muito pouco para formar uma opinião concreta sobre o assunto, prefiro não me manifestar ainda, mas um dia pretendo escrever um post sobre isso. Por hora, basta dizer que continuo pendendo para o lado nipônico da força.
Para quem nunca jogou Oblivion, aqui vai uma breve descrição: o jogo começa no calabouço da Cidade Imperial, do qual, após criar seu personagem e passar por um rápido tutorial, você é abruptamente expelido — como bebê do útero — para um mundo gigantesco, onde praticamente tudo que se enxerga no horizonte pode ser explorado e a cada dois passos uma nova caverna, fortaleza, ruína ou aldeia é descoberta.
O esforço da Bethesda para criar um mundo enorme, aberto e livre para ser explorado da forma que o jogador bem entender é admirável, mas o tiro acabou saindo pela culatra quando optaram por adicionar uma nova locação a cada esquina. Pra mim, a graça de explorar algo (no mundo virtual, né… porque no real eu não “explorei” nem o barranco aqui perto de casa xD) está na surpresa e na satisfação que se têm ao encontrar um lugar especial no meio do nada, após uma longa jornada. Em outras palavras, achar um oásis no meio do deserto é tão mágico justamente pala raridade daquele pedacinho do paraíso no meio de um inferno vermelho. Se houvesse um oásis a cada cem metros, encontrar um seria apenas rotina (novamente em termos virtuais, pois aposto que qualquer um que se perdesse um deserto de verdade ficaria extremamente contente com essa situação :P). É claro que não ajuda o fato de praticamente toda categoria de dungeon ter basicamente o mesmo layout, a ponto de passar a impressão que os designers da Bethesda foram apertando Ctrl + C / Ctrl + V na hora de desenhar Cyrodiil. Porém, mesmo se cada uma das trocentas dungeons espalhadas pelo jogo fosse realmente única, tenho certeza que, devido à superlotação, encontrá-las e explorá-las continuaria sendo algo maçante e rotineiro para mim.
Não me entendam mal, pois minha intenção com este post não é exatamente criticar Oblivion — mesmo porque eu tenho plena consciência de que muitos adoram o jogo justamente por ser assim. Só estou usando-o como exemplo porque ele abriu meus olhos para essa questão de tamanho x qualidade nos jogos. Antigamente, sempre que terminava um jogo bom eu ficava com aquele gostinho de “quero mais” e a certeza de que ele seria ainda melhor se fosse mais longo, tivesse mais lugares para explorar, mais armas, segredos, inimigos, chefes, etc. Já cheguei até a evitar de zerar alguns jogos numa tentativa frustrada de prolongá-los — razão pela qual deixei de zerar muitos JRPGs antigos que joguei, pois eu gostava tanto deles, me envolvia tanto em seus universos e me identificava tanto com seus personagens, que não queria “perder” aquilo tudo ao completar o jogo. Agora, porém, eu não tenho mais essa certeza de que aumentar um jogo bom resultará necessariamente num jogo melhor. É normal querer que uma coisa boa seja maior e dure mais, mas talvez ela seja tão boa justamente por ser daquele tamanho. Talvez, se colocassem mais conteúdo em meus jogos favoritos, eles perderiam todo o brilho e o apelo que têm sobre mim, e, aos meus olhos, passariam a ser tão entendiantes quanto Oblivion. Em outras palavras, como diria minha avó, certas coisas são perfeitas do jeitinho que são, se melhorar (ou aumentar, no caso) estraga.
Acho que a melhor forma de exemplificar o que quero dizer é comparar Oblivion com seu total oposto: Shadow of the Colossus. Na obra prima de Fumito Ueda, o mundo no qual o protagonista se aventura atrás dos 13 colossos é menor que Cyrodiil em todos os sentidos. O único NPC do jogo é um cavalo, e, gigantes à parte, não há inimigo algum no mapa. Também não há cidades, dungeons, side-quests ou qualquer recompensa concreta por exploração a não ser frutos e rabos de lagarto para aumentar a eficiência de seu personagem. Porém, aqueles que se dão ao trabalho de desviar da trilha que leva aos colossos para explorar um pouco mais aquela terra são muito bem recompensados, pois, quando menos se espera, é possível se deparar com lagoas cristalinas, ruínas misteriosas ou belas paisagens, que quebram, mesmo que por um breve momento, o sentimento de solidão que o jogo transmite (de propósito) ao jogador. Eu sei que é injusto comparar Shadow of the Colossus com outros títulos, já que seu modelo é bem extremo e com certeza não funcionaria em qualquer jogo. Mas eu prefiro mil vezes esse extremo ao de Oblivion.
Finalizando, como disse anteriormente, creio que jogos podem ser criticados tanto por ter uma, quanto dez mil fases, e o grande desafio dos desenvolvedores é buscar harmonia através do equilíbrio. Porém, a grande verdade é que essa questão de tamanho em jogos é totalmente subjetiva, e tenho certeza que muitos de vocês adoram Oblivion e acham Shadow of the Colossus um saco. Então, vamos continuar essa discussão nos comentários? 🙂
Nota: A primeira imagem do post foi feita por fellcoda, e a tirinha foi criada por Rueme e traduzida por mim.