Pelos labirintos de Alcatraz em A Rocha, filme de 1996

Comecei a assistir a atual série Alcatraz e bateu vontade de relembrar A Rocha, um filme das antigas

Nessa temporada americana estreou a série do J.J. Abrams chamada Alcatraz, que tem como background a famosa prisão americana, situada numa ilha na cidade de San Francisco (Califórnia). A prova de fugas em seus tempos de funcionamento, mas que foi fechada há muito tempo atrás, mais precisamente em 1963. É sempre legal ver histórias, ainda que com muito ficção, sobre locais que realmente existiram.

Quanto a nova série Alcatraz via apenas seis episódios. Estou um pouco atrasado com ela, que já terminou seu primeiro ano. Mas não achei nada excepcional na série até onde vi. Vigora os velhos clichês de seriados policiais. Cada episódio acaba tendo como foco o bandido da vez, que foge, mata, dá trabalho na perseguição, mas que no fim ou morre ou é capturado. O desenvolvimento dos primeiros episódios segue uma narrativa bem semelhante de perseguição de gato e rato. Pistas aqui, suspeitas ali, tentativas rolam e fica nisso. Seria legal se fosse um filme, mas numa série, usar a mesma fórmula em todo bendito episódio a torna cansativa e previsível. Esse é o mal de séries policiais e por isso não sou muito fã delas, salvo várias exceções, como Castle (que melhora a cada ano, mas tome isso a originalidade dos casos mais o humor afiado do ator Nathan Fillion).

O plot de Alcatraz até chama a atenção, com prisioneiros que sumiram no passado e reaparecem em 2012 sem terem envelhecidos um único dia. Mas o quadro geral funciona como qualquer outra série do JJ com um grande mistério, o telespectador acaba recebendo míseras migalhas ao longo de toda a temporada, a famosa fórmula da encheção de linguiça, onde o começo da temporada cria o clima, mas que só mesmo ao fim dela é que volta-se a focar no mistério geral, nesse meio tempo acaba-se criando episódios padrões de bandidos do dia. É quase como filler em animês. É um saco as vezes. Bem, mas vou continuar vendo a série, já li pela internet que ela melhora… quero só ver.

Nesse meio tempo me bateu uma nostalgia. Não é a primeira vez que vejo Alcatraz como cenário de uma história. Lembrei que lá na década de 90 foi produzido um filme que também tinha a famosa prisão como ponto importante da trama. Talvez alguns se lembrem, enquanto outros (os mais novinhos) nem devem ter ouvido falar. Estou falando do filme A Rocha (The Rock no original). Produto da cachola de nomes famosos hoje em dia como  Michael Bay (Tranformers) e Jerry Bruckheimer (A Lenda do Tesouro Perdido) e com os atores Sean Connery e Nicolas Cage.

Assistir esses blockbusters dos anos 90 em nesta década faz a gente perceber o quanto o cinema de Hollywood mudou. Hoje em dia os filmes de ação e aventura se espelham muito na ficção e fantasia, faz sentido afinal essa é uma geração mais nerd, mais viajada, que sonha mais com o impossível, não que isso seja algo ruim.Os filmes de hoje são um reflexo de seu público então. Filmes de guerra contra alienígenas, robôs gigantes que ficam amigos de adolescentes, piratas bonachões que saem em busca de tesouros e por aí vai. Veja bem não é uma crítica, estou apenas apontando uma tendência dos filmes atuais. É natural essa mudança também pelo fato de que a tecnologia dos efeitos especiais permitem que se façam alienígenas, polvos gigantes, robôs e cenas apocalípticas praticamente reais. É óbvio que o cinema atingiu um ponto onde quase não há limites para o que possa ser feito, então até mesmo filmes de ação mais naturais tem aqueles efeitos meio Matrix, com mega explosões, cenas em câmera lenta, prédios sendo demolidos e afins. Muito se discute porém é que um dos problemas dos filmes atuais é que seus produtores esquecem que nem sempre basta efeitos especiais a cada 2 segundos, mas que a história precisa acompanhar a lógica e o interesse do público.

Nos anos 90, sem toda essa parafernália, porém sem tantas limitações da década anterior, os filmes eram um pouco mais reais, principalmente os de ação policial. Os policiais eram mais Bad Boys também, daqueles que atiravam primeiro e depois, se deve tempo, faziam as perguntas ao meliante. Perseguições em avenidas, carros explodindo, metralhadoras atirando para todo lado (mesmo que não acertassem nem 5% dos alvos) e muita gritaria, dosado com um certo humor. Hoje para se fazer um filme policial, Hollywood exagera até não poder mais, cenas extravagantes, plots que parecem a terceira guerra mundial, efeitos de ação que soam forçado (mas que enchem os olhos) e as vezes os atores não conseguem tempo de tela para terem aquela simpatia ou personalidade que os personagens policiais dos filmes dos anos 90 (e 80) possuíam. A geração super-heróis tem suas vantagens, mas também seus problemas.

Voltando para A Rocha filme. Resolvi ver esse clássico de 1996, primeiro porque não me lembrava nada dele. Faz anos que não o vejo passando na TV, nem mesmo na TV por Assinatura, e com todo esse clima de Alcatraz que a nova série do J.J. trouxe recentemente, me bateu a curiosidade de saber como o filme antigo retratou o famoso presídio. E que diversão A Rocha me rendeu em mais de 2 horas de filme ontem à noite.

Tem de tudo um pouco, e o roteiro é bem amarradinho. O vilão não é bem um vilão, é um ex-militar revoltado com as injustiças que o governo americano anda fazendo com as famílias de soldados mortos em combate. Indenizações que não são pagas, aposentadorias que não sustentam um veterano de guerra e tal. Tem um senso de patriotismo que motiva o vilão da história. Ele não é mal, ele não quer matar os reféns, ou cumprir as ameaças feitas, ele quer apenas justiça aos soldados que cumpriram seu dever com os Estados Unidos e o governo só deu um tapinha nas costas destes. Dá uma certa complexidade ao antagonista, ao longo do filme você fica com a impressão de que o vilão não é quem pinta como vilão. Fala-se até mesmo em terrorismo, antes mesmo do mundo viver aquele climão pós 11 de setembro, onde tudo era culpa do Islamismo. O inimigo é interno. A cena dos soldados renegados versus soldados na invasão de Alcatraz é muito foda, e ao mesmo tempo consegue ser triste. É muito bom ver esse tipo de contraste cinza nos filmes, hoje em dia tem muita coisa que é puramente preto e branco.

Do outro lado temos Sean Connery e Nicolas Cage, como os mocinhos do filme. Connery parece que já se aposentou da sua carreira nos cinemas, né? Há anos que não o vejo num filme grande. Acho que o último filme dele que assisti foi A Liga Extraordinária (The League of Extraordinary Gentlemen), de 2003, que tem seus altos e baixos (porém sempre quis uma sequência). Mas o ator está ótimo em A Rocha. Engraçado, engenhoso e astuto. Não me recordava o quão excelente o ator era. Ficou perfeito seu papel como esse agente britânico preso a uma eternidade pelos americanos, sem registro, sendo que ele o único que conseguiu no passado fugir de Alcatraz. É um ótimo personagem para o filme. Já Cage faz aquele tipo que sempre fez em suas atuações, meio bonachão, engraçado e com aquela pose de sempre em seus filmes, mas o personagem dele é meio atrapalhado no filme, afinal ele é só um rato de laboratório especializado em armas químicas e biológicas. Cage sempre faz o papel de fodão dentro da sua área, então seu personagem é o cara nesse questio. Até aí tudo normal. Na hora da ação e do combate na ilha é que ele fica meio atrapalhado, já que não é o ambiente natural do seu personagem no filme. Connery certamente rouba as cenas, mas a parceria com Cage é muito bacana.

A Rocha tem excelentes momentos, como a cena de perseguição em San Francisco, onde o personagem de Connery mostra que é realmente maroto ao fugir do FBI dentro do hotel onde ele estava preso, esperando a elaboração de um plano para invadir Alcatraz. A perseguição nas ruas, com ele deixam um rastro de colisões para atrasar a polícia é massa demais. Os efeitos especiais simples, sem zoom ou câmera lenta a la Matrix, ou carros voando pela cabeça de atores ou esse tipo de exagero. Ação mais verossímil, ainda que improvável de acontecer na vida real.

Já em Alcatraz as cenas também seguem bem dinâmicas e diversificadas. A cena que já mencionei acima no banheiro do presídio, contra os soldados renegados e os soldados que invadiram a prisão é tensão e dá aquela reflexão necessária. Depois Connery e Cage correm pelos “encanamentos” de Alcatraz e rola até uma cena meio Indiana Jones, pois o cenário lembra um pouco aquelas minas das aventuras do Indy, com carrinhos e trilhos e enormes buracos onde nem se vê fundo. Quando a dupla de mocinho chegam nos primeiros mísseis a se desarmar, a cena de tiroteio acaba lembrando aqueles absurdos a la Rambo. Bandido gritando, mandando bala pra todo lado, e no fim acaba morrendo de forma horrenda. A piadinha do Cage após a cena, “é normal a perna dele se mexer assim?” ao ver o cadáver, e pedindo ao Connery “faça alguma coisa, isso está me perturbando” e a resposta “você quer que eu faço o quê? mate-o de novo?” é impagável.

Minha única crítica com A Rocha é que mais ao fim ele se perde um pouco na ação exagerada, que acaba se tornando cansativa. Aí eu lembro que é coisa do Michael Bay, né? Então faz sentido ser assim. O Cage acaba tento tempo de tela por demais, tentando achar os últimos mísseis, os bandidos continuam atirando como se fossem cegos e o clímax do filme acaba se arrastando um pouco mais, enquanto o Connery acaba desaparecendo um pouco e reaparecendo convenientemente quando Cage precisa de uma força. Mas nada disso estraga a diversão desse clássico.

A Rocha é um filmão. Diverte bastante e mostra esse clima das produções dos anos 90. Personagens com forte estereótipos, cenas de ação e efeitos especiais mais pé no chão (dado as limitações da época) e uma história bem amarrada e que deixa a gente entretido do começo ao fim. Para quem não se recorda, e anda curtindo toda esse clima de Alcatraz, vale a pena rever. A Rocha tem no catálogo do Netflix, então dá pra assistir sem censura, sem comerciais, legendado ou dublado. Duração 2h16 de filme.

Fica a dica!

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