Uma jornada que nunca termina!

 Acaba com você, recomeça com outra pessoa. E assim segue a vida!

Nessa semana que passou eu meio que me senti um grande noob. Foi no finalzinho de 2009 que eu comprei o meu PlayStation 3 com o dinheiro suado do 13 salário daquele ano, mas foi apenas na semana passada que a PSN passou a me servir para mais do que apenas baixar demos e esperar quedas na rede da empresa para ganhar coisas de graça (hehe…). O culpado disso? Sim, ele tem nome, chama-se Journey, um jogo que não chega a ser a melhor coisa que eu já joguei desde que me entendo por gamer, mas que sem sombra de dúvida está entre as melhores e vai além por se algo tão único.

Enquanto a TV, os jornais, enquanto uma legião inteira de hipócritas grita aos quatro cantos do mundo que vídeogame só gera violência e juventude alienada, surge um jogo que dispensa ação, armas pesadas, magia. Ele abre mão disso tudo e muito mais e não só para entreter, fazer 20 minutos passarem como mágica. Journey tem uma mensagem para cada um de nós, que vai fundo lá no peito, arranca umas lágrimas, traz lembranças e deixa um recado, talvez uma lição valiosa para toda vida.

Que mensagem Journey passou a você? Para mim a princípio nenhuma, a primeira vez que joguei eu acabei fazendo o mesmo que estava fazendo quando o hype com os trailers promocionais começou. Eu me foquei mais em me encantar com os cenários e acabei esquecendo todo o resto, mas eu tenho fortes razões pra isso. Afinal a primeira passagem no deserto me lembrou logo de cara aquela cena do Drake caindo do avião em Uncharted 3. Nem faz tanto tempo assim, mas ainda parece que foi ontem que me vi obrigado a parar por uns 05 minutos para apreciar aquele imenso deserto que até parecia tentar sair da, até então, telinha de 18 polegadas e ganhar a realidade.

Enquanto o Drake coçava a cabeça (e pensava consigo mesmo: OH CRAP!) eu deslizava o dedo pelo analógico direito procurando detalhes naquele horizonte amarelado, naqueles passos que formavam desenhos na areia. Pra mim a Naughty Dog criou uma verdadeira pintura com essa cena e hoje, não muito tempo depois, é Journey que me faz voltar para reviver isso. O trabalho gráfico pode até não estar à altura dessa comparação, mas o nível de detalhes é tanto se não maior.

Tão grande que um jogo linear como esse parece ter cenários infinitamente exploráveis toda vez que você tenta voar sem tempo suficiente pra avistar tudo o que existe no fundo das paisagens. Um mundo cheio de nada te convidando a se perder para sempre, um universo totalmente fora do seu alcance, completamente hostil, desumano só de pensar, mas mesmo assim lindo e porque não dizer curioso. O bastante para me fazer desejar estar ali para olhar aquilo tudo mais de perto.

Foi mais ou menos assim que eu terminei a minha primeira jornada. Sozinho, apertando START a cada novo cenário para não perder nenhum slideshow. Terminei achando mesmo que aquela jornada foi feita para uma pessoa apenas, mas enquanto a linda música que fecha esse jogo rolava eu realmente comecei a pensar que estava faltando algo. Tinha mais uma mensagem ali, eu só não sabia dizer o quê.

E a ficha só veio cair mesmo ao final dos créditos. Eu acompanhei tanto os trailers que me esqueci completamente de como funcionava essa jornada. Porque Journey é um game cooperativo desde o começo, você pode até começar sozinho, mas você jamais vai terminar do mesmo jeito. E lá se foram os nomes das pessoas com quem eu cruzei ao longo da jornada. Eu lembro que alguns tentaram contato, aqueles sinais que mais pareciam notas musicais e que só aquelas criaturas encapuzadas entendiam, mas eu não me lembro de ter dado bola. Já outros partiram na frente e quando eu menos percebi o caminho já estava aberto sem que eu tivesse feito nada.

O que eram eles? NPC’s vagando pelos cenários? Sem respostas o bastante para escrever esse texto eu fui dormir e acordei cedo no sábado seguinte pronto para jogar tudo de novo. Aliás Journey foi feito pra isso, cada vez que você recomeça ele você tem mais vontade de olhar tudo com mais calma e por incrível que pareça sempre tem algo mais que você por algum motivo não conseguiu ver na viagem anterior. Até a própria soundtrack tem uma música que reflete demais essa sensação de constante recomeço, como uma saga, um arco que termina para abrir outro e assim por diante. O ciclo da vida, certo?

Nem demorou muito e mais um companheiro apareceu, e ao invés de tratá-lo como um personagem se alma qualquer perdido no cenário a gente resolveu andar junto. Percebi que ele deixava a maioria das tarefas comigo, mas em contrapartida ele (ou ela, já que o jogo não te revela com quem você está jogando) parecia saber tão bem o caminho que sempre que eu me perdia naquele lindo subterrâneo azul-marinho, ao mesmo tempo eu avistava de longe o sinal que ele me dava. Como se dissesse: vem cara, é por aqui!

E só então eu entendi melhor as coisas, na subida daquela montanha de gelo cruel por exemplo a sintonia já parecia perfeita. Um toque para entrar debaixo daqueles abrigos afim de não ser atacado por aquele monstro voador e outro para sair correndo em direção ao próximo. Tá certo que no fim das contas a gente acabou sendo pego antes de chegar na outra entrada da montanha, mas foi só uma vez, tanto que saímos ilesos e juntos. E o mesmo valeu quando aquela ventania forte não deixava nada passar, eu segui em frente, mas sempre com o sinal alto o bastante para ele saber onde eu estava.

Enfim, acho que a alma desse jogo é mesmo a cooperação. Quando eu joguei pela primeira vez inevitavelmente eu me lembrei de mim mesmo. Porque do mesmo modo como eu resolvi fazer tudo sozinho na minha primeira viagem, eu costumo fazer na minha vida de verdade. As amizades? Eu já perdi as contas de quantas pessoas eu conheci nessa caminhada e não consegui manter ao meu lado. Aquele velho ciclo de amigos que eu tinha quando moleque se desfez, e todos formaram novos círculos, novos contatos, novas experiências, mas eu preferi parar no tempo. A timidez pode ter contribuído muito para o resultado final, mas eu também levo muito dessa culpa por não ter vontade de mudar isso sozinho, de sair, encarar a vida e tentar mudar alguma coisa.

Nem mesmo as velhas parcerias eu me incomodei em resgatar. Mas lá no fundo, eu, você, todo mundo sabe que nessa vida nada se faz sozinho e apesar de já ter aprendido essa lição e estar tentando de alguma forma mudar, renovar tudo isso (um dos primeiros passos acho que foi entrar para esse blog) eu precisei jogar Journey para salientar essa questão.

O jogo que um dia eu considerei como um drama, tanto pelo cenário inóspito quanto pela canção fúnebre, na prática se mostrou uma obra que envolve frieza e beleza ao mesmo tempo e ainda consegue no meio disso deixar um toque de inocência aqui e ali. Se no começo eu olhava aquelas criaturas como se fossem duas crianças brincando no seu jardim particular, no fim eu enxerguei através de uma parceria com um completo estranho a importância de se ter alguém ao seu lado, seja nos momentos alegres, nas horas difíceis. Esse jogo pode ser fechado em pouco mais de 20 minutos, mas nesse meio tempo eu passei por cada uma dessas emoções, visual e musicalmente.

E antes que a última música tocasse mais uma vez eu já tinha entendido tudo, tanto que o soar do violino naquela voz solitária me arrancou algumas lembranças e até umas lágrimas. A minha vida ainda não chegou ao fim da linha, mas agora eu sei o quanto já perdi e tenho consciência de que ainda vou perder muito mais, mas assim é a vida e antes aproveitá-las ao máximo do que chorar por aquilo que não foi feito. “Eu nasci pra isso”: é como se chama a música que fecha o jogo, e não é a toa. Nascemos e ganhamos a oportunidade de viver tudo o que há pra ser vivido nessa vida, até o dia em que enfim partimos, deixando a nossa obra, seja ela qual for para trás.

Eu viajei pra bem longe em poucos minutos e quando voltei lá se iam de novo os créditos finais e vi mais nomes de viajantes do achei que tivesse verdadeiramente encontrado, mas tudo bem. Conhecendo-os ou não, nos ajudamos até o final, como muitas vezes fazemos na vida real. Fazendo o bem sem olhar a quem.

E é isso, pra quem é fã incondicional dessa arte chamada vídeogame, Journey é uma experiência obrigatória. Eu queria poder enxergar mais significados em tudo o que vi durante o jogo, mas o meu cérebro só meu permitiu chegar até aqui. Talvez hajam outros, muitos outros significados, mas isso varia de pessoa pra pessoa, depende muito de quem jogar. E enfim… a maior experiência da minha vida com os vídeogames foi essa. Não tenho duvidas disso, aquilo que um dia eu chamei de arte sem querer superou as minhas próprias expectativas.

De um jeito fantasioso essa arte fez mais do que somente imitar a vida, ela deixou uma mensagem profunda demais, o bastante para não se esquecer tão cedo.

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24 Comments

  1. Lindo texto Kon, bem profundo.
     
    esse é um jogo que quando eu vi o trailer já pensei "vai ser algo diferente, e de forma muito boa".
    e o seu texto fez eu perceber que estava errado, ele é muito mais do que eu pensei que seria, que ser bom é pouco.
     
    tambem me sinto meio assim "isolado", acho que todo mundo tem uma hora em que se sente assim, ou fica assim, mesmo com aqueles colegas do trabalho, ou  da escola, você tem aquela sensação de faltar "aquele amigo" em que você dividia tudo, e fazia tudo junto com a maior diversão e alegria.
     
    um dos passos de se crescer acaba sendo se isolar, cada vez mais isso e um pouco mais visivel, a geração que passa, as pessoas vivem mais com seus amigos virtuais (que acabam sendo melhores, por voce ter aquela ligação de gosto e tal) mas eles não preenchem aquele vazio, de que é estar na fente do videogame, sem tem com quem conversar sobre o quão bom aquilo ali é.

  2. Que foda, mais um jogo para minha lista de jogos de Play3 que irei jogar (e quando ter um Play 3 né rs).  Adorei o texto, aposto que você nunca pensou que um dia iria escrever algo assim né? Adorei a Apotheosis. O jogo aparenta ser ótimo, começando pela arte, cenários diferentes e uma música que me encantou, e agora, li um texto sobre um pensamento profundo desse jogo. Realmente, lindo.

    1.  @Amido Himawari Cara, eu também sou burro então. Não entendi a temática do jogo.Os trailers não me dizem muita coisa e isso é desde a época do lançamento dele. Tá certo isso, Kon? O game pode ser fechado em 20 minutos? o_o

      1.  @Leonardo Mello  @Amido Himawari Ninguém é burro por não ter sentido nada mais profundo depois de jogar Journey. Aqui eu só expuz o que senti, mas como eu disse no final da postagem eu terminei o jogo com a leve impressão de que ele tem mais de um significado. Isso pode e deve variar de pessoa pra pessoa, aliás acho que é esse o grande barato desse jogo, trazer mais de uma interpretação sobre o que vc vê nele!
         
        Sobre os 20 minutos, é aquela história. Sabe quando uma produtora anuncia que o seu próximo lançamento vai ter de 08 a 10 horas, mas que se o cara gamar no game e quiser fazer tudo o que há nele a jogatina pode pode bater umas 12 ou 13 horas fácil fácil? Pois bem, Journey é assim também.
         
        Apreciar os cenários é algo obrigatório, só que o jogo não te conduz o tempo inteiro pra que isso aconteça. Logo no início por exemplo eu avistava aquelas construções ao longe e não me contentava em só olhá-las de longe.
         
        Eu tive que atravessar aquela areia toda sem sair voando e sem pressa de chegar lá simplesmente porque eu queria ver tudo aquilo mais de perto, sem me importar em que hora aquilo perderia a graça e me faria dar continuidade à jogatina.
         
        A verdade mesmo é que bom proveito desse jogo só vai depender de quem jogá-lo. Eu mencionei que ele poderia ser fechado em pouco mais de 20 minutos, mas se tu for dar uma olhada no YouTube tem vídeo detonado com mais de meia hora.

  3. Gostei muito do seu texto, Kon. Até mesmo me identifiquei em algumas passagens, como a do isolamento e a da importância dos companheiros ( isso também tem um pouco de filosofia anime, mas, baseado nos vários textos que li, acredito que você é como eu e muitos aqui no Portallos: animes, jogos e outros exemplos da cultura nerd tiveram contribuição para a formação de sua personalidade e visão de mundo ).
     
    Journey é apenas para Playstation 3? Fiquei com vontade de conhecer o jogo, mas não tenho o console da Sony.

  4. Que lindo! T_T
    Nem imaginava que o texto era seu Kon, pensei que fosse do outro cara que tem aqui, o Araphawake/Rafael?
    Mau vejo a hora de jogar.
     

        1.  @GuiPMenezes  Cara,não é por que você compra um plastation 3 que você deve se denominar um "sonysta".Esses termos foram criados por fanboys.Eu tenho um PS3 e jamais me declararei um "sonysta",pois sei que a empresa está cagando e andando pra mim,afinal,ela só quer o meu dinheiro.Isso se aplica também a qualquer outra empresa.
           Se tiver condições,compre um PS3,pois você não tem nada a perder.Afinal,não somos sonystas ou caixistas,mas sim gamers.

        2.  @Red9ro Por que entre jogar com os meus amigos e jogar exclusivos sozinho eu escolhi jogar com meus amigos. De todas as pessoas que eu conheço, uma tem PS3, todos os outros tem XBox

  5. É mesmo muito curioso como esse game tem a capacidade de tocar a alma.Pra quem pensa em jogar faça como eu não leia muito a respeito pra não estragar a experiencia.
    Só posso dizer que naquele "grande momento" eu percebi tudo e,assim como diante de uma comedia não dá pra segurar o rizo, diante de algo tão simples e bonito não deu pra segurar as lagrimas fiquei com o game semanas na cabeça.

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