Quando se fala de Assassin’s Creed há uma pilha de coisas que se faz necessário ponderar e que todo mundo adora repetir. Um dos pontos mais óbvios e batidos pela internet é sobre o fato da série ter se tornado anual e dado a impressão de que isso a tornou “mais do mesmo“. Já outro ponto é que independente das críticas a série continua vendendo o suficiente para não precisar ter um tempo ou fôlego para se reinventar ou descansar, e aí você pode pensar em como Prince of Persia sofreu desse mal e desapareceu do mundo dos videogames – ainda que muitos digam que Assassin’s Creed seja uma espécie de sucessor espiritual de Prince of Persia, o que pra mim é apenas meia verdade.
Agora quando se fala de Assassin’s Creed Syndicate, e passado um mês de seu lançamento, sabe o que é curioso? Que não haja barulho de críticas negativas ou gente falando mal do game. Lembra como Assassin’s Creed Unity foi malhado ano passado? Isso é uma indicação de que algo deu certo no título deste ano. E o que será que foi exatamente?
Tive a oportunidade de começar e jogar o game por algumas horas neste final de semana e ao final da jogatina percebi que não teria muito do que reclamar nestas primeiras impressões. Isso porque o game começa muito bem. Tem uma atmosfera ótima e os personagens desta vez são carismáticos.
Aprendendo com erros!
Vale aqui abrir um parênteses e lembrar ao leitor do site que apesar de ser um fã da franquia, eu ainda estou estacionado lá na saga do Ezio em Assassin’s Creed Revelations. Não que eu não tenha jogado um pouco dos games lançados nestes últimos anos. De fato eu experimentei basicamente todos, incluindo a saga da América (exceto Assassin’s Creed Rogue), passando por Unity (do ano passado) e até mesmo brincando um pouco com Assassin’s Creed Chronicles China. Mas uma coisa é experimentar e outra é se dedicar. O último que realmente me dediquei e terminei foi Brotherhood, sendo que Revelations eu parei porque migrei de geração, e ainda tenho esperanças de continuar quando – e se – o título for disponibilizado na retrocompatibilidade do Xbox One. Há rumores por aí que a Ubisoft pode vir a lançar uma coletânea de todos os games da franquia lançados na geração passada para os atuais consoles. Eu realmente espero que ela faça isso. Particularmente eu seria um dos que compraria, justamente para terminar e colocar em dia de uma vez por todos estes arcos e sagas.
Eu havia decidido ano passado começar Assassin’s Creed Unity, deixando os anteriores para algum futuro incerto, e não consegui. E hoje, após jogar o começo de Syndicate, percebo com maior clareza que há realmente algo errado com o game de 2014. Há uma falta de empatia com seu protagonista. O game começa ruim, teve todo os problemas de bugs que zoavam a experiência e imersão e a proposta de multiplayer cooperativo dele realmente não me agradou muito. Agora, neste game de 2015 a gente percebe que a Ubisoft tomou todas as notas dos problemas e evitou repeti-los no novo game. Assassin’s Creed Syndicate não repete, aparentemente, nenhum dos erros que Unity teve ano passado. E isso é bem interessante, já que as más línguas disseram que a franquia agora só se degradaria de Unity para frente. Bem, isso felizmente não se tornou verdade.
A curva de aprendizado de Syndicate é muito rápido. Nada de flashbacks de infância, de treinamento, de um personagem que cai do nada no meio da guerra Templários vs Assassinos. O jogo já parte do princípio que os protagonistas, porque agora são dois – Jacob e Evie, já estão integrados a ordem dos Assassinos e que já sabem o que fazer. Nada de pegar na mão do jogador e ficar exaustivamente querendo ensinar o Be-A-Bá tudo novamente. Eu realmente me senti confortável com isso.
As pontes e conexões com toda a série!
Quem nunca jogou Assassin’s Creed vai ficar perdido? Na jogabilidade certamente que não. Na história dos protagonistas também não. No âmbito geral da saga e da conexão que o game pode fazer com tudo que já foi criado? Sim e não. Menciono isso porque como eu nem terminei a saga do Ezio, há muito sobre a série que eu ainda não sei o que rolou ou como a Ubisoft trabalhou com seus conceitos nestes últimos anos.
Eu me lembro que tentei aprender isso ano passado em Unity e apanhei horrores e não aprendi nada. Aqui em Syndicate o game começa mostrando uma linha do futuro, da era moderna, onde Assassinos continuam tentando derrubar os Templários. Admito que fiquei confuso nessa parte, porque o game não explica quem diabos são estes personagens e porque eles me parecem tão conhecidos (Rebeca participou da história do Demond). O bom é que o game tem uma parte de enciclopédia, que encaixa os pontos na qual o jogador novato ou que retornou somente agora, precisa entender. A enciclopédia não vai ficar narrando tudo que aconteceu, mas fará os apontamentos necessários para você entender porque a série mudou tanto nos últimos anos. Encaixa até mesmo os buracos e falhas que a série poderia vir a ter.
Lembra que nos primeiros Assassin’s Creed a pessoa que vivenciava as memórias do passado precisava ser da linhagem de sangue? Depois disso tem o Assassin’s Creed Black Flag que tem aquela loucura do Animus, a tecnologia que permite revisitar o passado, sendo oferecido como uma atração tipo parque da Disney? Estes eventos e mudanças estão explicadas na enciclopédia do game. Alias há algumas notas que aparecem nas telas de carregamento do game que parecem tiradas do universo expandido, mas não estou certo se é isso mesmo, afinal a série hoje possui diversos livros e até quadrinhos. Não é de se admirar que o jogador casual não consiga necessariamente acompanhar tudo. Então está tudo ali, o porque não precisar mais de linhagem de sangue, o porque da utilização do Animus ser algo tão comum e tão menos doloroso do que era para o Desmond no primeiro game da série, porque ainda estamos falando de Templários etc.
No fim, ao menos a história de Assassin’s Creed Syndicate não me parece um grande vácuo sem propósito. Ela pode ser um pouco simples, porém faz sentido dentro de seu universo. No presente a ordem dos Assassinos está em Londres porque os Templários estão tentando encontrar novamente as peças do Éden, que é aquele artefato que faz a cola de todos os games da franquia e que… bem, digamos que é muito mais legal se você descobrir por si próprio o que isso realmente é (já que Assassin’s Creed II tem um dos finais mais legais de toda a série, ao menos ma minha opinião). E para isso, os Assassinos estão usando sua própria versão do Animus, o que também está explicado na enciclopédia porque que ambos os lados agora possuem essa tecnologia, para que o jogador (você) volte ao passado, para um momento onde estas peças historicamente apareceram, dando pistas assim de onde as encontrar no presente.
Meio que não se trata mais de descobrir a verdade ou o grande segredo de tudo. Bem, talvez algo assim esteja presente mais a frente na história, ainda descobrirei, mas a impressão é que Assassin’s Creed Syndicate é apenas mais um dia na longa guerra interminável travada entre Assassino e Templários e não que isso seja necessariamente ruim. Eu imagino que da forma como a Ubisoft está finalmente construindo a história do presente moderno da série, eventualmente, quando ela sentir que as coisas precisam avançar, teremos um Assassin’s Creed justamente com estes personagens e em tempos atuais.
Poderia ser o final da franquia ou o momento onde a série vá ficar mais louca ainda e se tornar outra coisa – podia virar algo tipo Beyond Good & Evil, seria insano. No momento não acho que isso necessariamente vá acontecer tão cedo, mas é bom ver essa porta aberta, para se algum dia for necessário. Então é por isso que estamos na Londres da Era Vitoriana. Para mais um dia, para mais uma batalha contra os Templários. Apenas isso e esta não é uma desculpa ruim, graças conjunto da obra: Londres Vitoriana é uma época bacana para se visitar e como disso lá no começo, a dupla de protagonistas são divertidos e carismáticos. E fazia tempo que não encontrava isso nos games recentes da série!
Um mesmo Assassin’s Creed, mas com seu próprio jeito!
Que já jogou um Assassin’s Creed já jogou todos? Isso é meio que verdade. E aqui cabe o seguinte raciocínio: se você curte a série, não é a sequência de elementos que se repetem em todos os games que vai lhe incomodar, porém se você não curte, é preciso analisar minuciosamente o que você não gosta e ver se a série já não interveio nesse ponto e o melhorou.
Olhando para o primeiro game da franquia, passando pelo Brotherhood (talvez o que melhor de todos os Assassin’s Creed, já que expandiu insanamente os recursos de jogo), e vendo a direção que se levou para a saga da América e depois estamos de volta ao modelo europeu, eu diria que a série já passou por muita coisa boa e ruim. E uma das coisas que mais se mexeu foi na mobilidade do protagonista. Como tornar o passeio pelo mundo de Assassin’s Creed melhor e mais divertido? Eu não sei dizer exatamente quando foi que acharam uma boa ideia que houvesse um comando para indicar que o personagem deve subir e um comando que indique quando ele deve descer. Tenho a impressão de que o jogo deveria saber fazer isso sem que o jogador precisasse indicar. Shadow of Mordor faz isso muito bem, não? Mas talvez ele não tenha a arquitetura complexa que Assassin’s Creed tem.
Quer dizer, nem sempre é apenas “pra cima” ou “pra baixo”, ou o quão pra cima ou quão para baixo queremos ir. A única coisa entretanto que me agrada em Syndicate é que os personagens estão descaradamente mais ágeis. Há saltos ou escaladas que eu facilmente veria o Homem-Aranha tomando esses impulsos e talvez alguns se incomodem com isso, porém pra mim é um alívio ver que essa agilidade do personagem já existe desde o começo do jogo e que escalar não é mais uma árdua tarefa ou uma que tome tempo além do que deveria tomar. Após tantos games, subir, descer, escalar e explorar não precisar ser necessariamente um desafio, e sim apenas uma trilha entre algo a ser feito ou executado. A mobilidade está melhor, com uma física ligeiramente exagerada justamente para que ela fique melhor. Isso é bom, não?
Outro ponto que sempre recebeu duras críticas aos games da série são os combates. Sempre travados, desinteressantes e na maior parte do tempo eram apenas chatos. Eu continuo achando que Assassin’s Creed poderia fazer isso muito melhor, entretanto parece que o sistema em Syndicate está – novamente uma palavra que permeia quase todos os aspectos desse jogo – mais ágil. Os inimigos iniciais são derrubados mais rapidamente, a animação das porradas é mais fluida, com closes e cortes diferentes as vezes, e nada daqueles combates engessados que existiam no passado da franquia. Já vi relatos que mais para frente do game surgem inimigos de maior agilidade e força e que apenas esmurrar o botão de ataque não resolve, mas é bom dizer que desde o começo do game já está liberado o contra-ataque e o de quebrar a defesa do inimigo, o que já abre um pouco o leque de possibilidades em combate.
Alias falando em coisas liberadas, como os protagonistas da série já são da Ordem dos Assassinos desde o começo, você basicamente já tem o kit set completo de um assassino. Sabe lutar, escalar, atirar facas, usar bombas etc. A pistola também vem rapidamente no começo do game e… ufa, a mira não é mais aquela porcaria que era quando eu jogava com o Ezio. A função dela em combate é ótima e bem fluida, posso usar sem me atrapalhar. Mas não é apenas isso que quero comentar. Eu achei bacana que o game agora apresenta uma árvore de habilidade para que o jogador progrida e aprenda coisas que vão deixar o game mais dinâmico e – olha a palavra de novo – ágil.
Melhorar a visão de águia, permitindo enxergar inimigos próximos através das paredes? Pode! Coletar mais recursos de baús? Pode! Assassinar furtivamente e automaticamente saquear o cadáver? Claro que dá! Não sei se isso surgiu nesse Assassin’s Creed ou se vem de algum dos que não me aprofundei muito, mas aqui essa árvore aparece muito rápido no game e após as primeiras horas, basicamente quase toda a segunda linha acabei completando. Não é difícil conseguir os pontos e ir aumentando o repertório de facilitadores que o game te dá, isso porque estou no começo e imagino que o game seja grande o suficiente para justificar porque tudo isso já vem cedo na campanha.
O que mais posso comentar aqui? Ah, sabe um recurso visual que gostei de ver retornando a série? A conversa que o assassino tem com o alvo assassinado no final de uma sequência. Eu achava isso muito legal nos primeiros games da série e meio que foi sendo desprezado nos mais recentes. Ao menos nos diálogos dos primeiros alvos de Syndicate a conversa entre o assassino e o alvo foram interessantes e relevantes. Porém será que isso não se dá porque os personagens aqui se apresentam serem mais interessantes e carismáticos? É possível.
Também é divertido o clima mais moderno que a série está tomando. Já temos eletricidade, temos carroças a cavalos, há trens cortando a cidade. Há um clima antigo e moderno misturado, quase como se fosse uma era steampunk. É legal esse conceito. A primeira missão da Evie acaba com um momento bem nesse clima de tecnologia macabra e em uma explosão e sequência de adrenalina que lembra muito a forma como o reboot de Tomb Raider faz hoje em dia, com Evie correndo em uma sequência de destruição e também se esgueirando por brechas nas paredes com lances de câmera que melhoram a imersão da cena. É a Ubisoft tornando Assassin’s Creed um pouco mais cinemático e imersivo e melhor do que apenas um sandbox aberto onde não parece ter direção de cena.
Falando em Evie quão maneiro é ter uma protagonista feminina em um título principal da franquia. Tudo bem que esta não é a primeira personagem feminina da série, já que tivemos mulheres no comando da história em Assassin’s Creed Liberation e Assassin’s Creed Chronicles China. Porém achei muito legal que seja aqui, em uma título principal e importante da saga, que haja essa opção de ver a história sobre a ótica de uma forte personagem feminina e que bom que ela seja tão diferente de Jacob, que é seu irmão. As personalidades são distintas e as motivações de cada um também. Jacob é brincalhão, o palhaço, porém também o pavio curto que prefere socar a ser furtivo. Evie é mais centrada e focada, por isso as habilidades furtivas combinam melhor com ela. Gostei desse dois mundos, dois pesos, porém unidos e ligados em um laço de sangue que a Ubisoft colocou em Syndicate. Não são um casal, são irmãos, há um peso maior nessa química, que evita certos clichês bobocas. Torço para os próximos games da série continuem apostando nessa diversidade de personagens. Achei ótimo essa opção de trocar de personagem a qualquer momento do game, ainda que na hora da história principal, ou algumas delas, talvez haja a obrigatoriedade de jogar com um ou outro personagem exato. Certamente eu gostaria de ver mais disso nos futuros games da série.
Uma boa impressão logo de cara faz a diferença?
Eu sei que é cedo ainda para me aprofundar muito o quanto a série melhorou ou nas partes na quais ela continua a mesma coisa. Porém achei interessante que este é realmente o primeiro Assassin’s Creed em muito tempo em que não aparenta ter coisas ruins para se reclamar inicialmente. Você pode continuar reclamando que é mais do mesmo, porém repito que se ele não fosse assim talvez deixasse de ser Assassin’s Creed. O mais importante é que dá para sentir que a jogabilidade vem se refinando e que as críticas do game anterior foram analisadas e reformuladas para a versão de 2015. Isso meio que é algo importante.
No fim acho que Assassin’s Creed é 50% carisma de personagem e trama (e por isso acompanhamos tão animados Ezio/Desmond por três enormes games) e 50% mecânica de jogabilidade somado ao cenário histórico que o game apresenta. É interessante notar que não é só visualmente que a série tenha exponencialmente crescido, mas também em sua arquitetura irregular, com mais e mais detalhes nas cidades, para subir, se pendurar, escalar e interagir. Pense em quão simples era o primeiro e segundo game da série nesse sentido.
As vezes há essa sensação de que a franquia inchou demais. Colocou coisa demais em sua jogabilidade e esqueceu de ir refinando tudo o que colocou. Sinto que Syndicate se preocupou um pouco mais com isso do que Unity, por exemplo, se preocupou ano passado. Vale dar como exemplo próprio sistema de cobertura e furtividade, que é acionado com o botão A e com isso o personagem automaticamente fica furtivo, andando sem ser notado, se escondendo próximos a objetos, sem travar ou engasgar em algum lugar porque você queria que o personagem fizesse algo e ele não o fez.
No fim Assassin’s Creed Syndicate continua sendo um Assassin’s Creed, e vai de cada um achar que isso é algo bom ou algo ruim. Eu sinceramente já fico feliz de que desta vez a Ubisoft tomou cuidado para finalmente criar personagens interessantes, uma proposta mais focada no single player, deixando novamente de lado a questão multiplayer – que nunca dá meio certo mesmo – e ainda correndo atrás de uma experiência aperfeiçoada de combate e mobilidade, ainda que hoje já existam games que parecem saber fazer estas coisas de outra forma e que já deveriam estar influenciando Assassin’s Creed. O caso é que a Ubisoft ainda não tinha acertado a franquia para a nova geração de consoles e agora finalmente parece ter obtido êxito. Isso vai lhe permitir repensar no que o Assassin’s Creed de 2016 precisará ser para superar Syndicate e isso é um ponto muito positivo para a franquia!
Continuarei jogando Assassin’s Creed Syndicate e falando mais sobre ele aqui o site pelas próximas semanas, nos diários de jogo e impressões de games! E a discussão poderá ser mais aprofundada então! Aguarde!