Talvez tenha sido um aviso. Uma semana antes de ir ao cinema assistir O Bom Dinossauro resolvi mostrar o trailer da animação ao meu filho, de 3 anos. Perguntei a ele: “quer ir assistir esse filme no cinema?”, ele nem sequer pensou muito e já soltou “esse não”.
Mas eu fui ver mesmo assim, enquanto o pequeno Thales preferiu passar a tarde de sábado brincando na casa dos avós. A sessão estava lotada de crianças, algumas inquietas e falantes, outras cansadas e chorando e ao final do filme minha esposa me confirma o que eu suspeitava: “o Thales não teria aguentando ver todo o filme”.
Tudo bem, ele tem 3 anos e há muita coisa legal que uma criança de 3 anos não tem a paciência para ver do começo ao fim. Fora que nessa idade tudo depende do humor, do cansaço e da disposição da criança.
O caso é que O Bom Dinossauro nem de longe pode ser qualificado como uma inesquecível produção Pixar, e não ajuda muito o estúdio ter lançado a animação meses depois do público ainda ter Divertida Mente fresquinho na memória. Talvez se a animação tivesse sido lançada como programado originalmente, ao invés de ter sofrido um ano de atraso por problemas justamente de roteiro e qualidade que uma animação Pixar hoje em dia exige de seu público a história teria sido diferente.
Sim, porque nesse ponto você já deve ter lido por aí que O Bom Dinossauro teve vários problemas em sua produção. Precisou ser refeito, causou demissões na Pixar, foi adiado e precisou de mais um tempo com os grandes nomes da casa para colocar tudo nos trilhos novamente.
E não é que seja uma má animação, ele apenas não causa o impacto que os fãs Pixar esperam das produções do estúdio.
A meu ver o filme tem pequenas ideias mal exploradas, criando situações chaves e clichês, dentro de um plot linear e previsível e as vezes maçante. É fácil, por exemplo, comparar com Os Croods da Dreamworks, lançado em 2013. Os Croods tem mais ideias criativas do que O Bom Dinossauro, fora que a trama familiar da produção da Dreamworks é melhor em explorar vários lados de uma trama do que a visão unilateral de O Bom Dinossauro, ainda que mesmo assim Os Croods não seja perfeito, as vezes lembrando uma releitura de algo como Os Flintstones.
O Bom Dinossauro tem apenas uma única história, talvez duas se você considerar o lado do Spot, o pequeno humano do filme. É a história de um dinossauro medroso que se perde de sua família e precisa se encontrar e provar merecedor de uma tradição dentro a cúpula familiar. Não é exatamente algo inovador.
Nem mesmo a jornada de Arlo, o dinossauro protagonista da história, não é assim tão original ou impactante no aspecto geral. A aventura do filme tem bolhas de intensidade costuradas em momentos normais desse tipo de história, na qual muitas vezes são apenas cansativas. Você fica esperando o próximo bom momento do filme e isso não é uma bom sinal.
Ao final da sessão fiquei pensando em Procurando Nemo e o quão distante O Bom Dinossauro é em certos elementos. Na aventura aquática da Pixar o pai do Nemo sai em uma busca alucinada pelo filho e o enredo não para um minuto para você respirar. É Dory, uma peixe desmemoriada, são tubarões que não comem peixes, um antigo submarino, são minas de profundidade, cavernas abissais com um peixe estranho, são cardumes, tartarugas surfando em correntes marítimas, baleias e por aí vai. Há situações originais e inventivas acontecendo a todo o minuto. E ainda há tempo e espaço para explorar a história do Nemo, preso no aquário do dentista. Em resumo, o filme não te deixa esperando o próximo momento, ele é um trem em alta velocidade na qual você não para de prestar atenção um único segundo.
No caso de O Bom Dinossauro há muito pouco dessa empolgação. Arlo está em um mundo que nunca visitou, com um pequeno humano que é tão maluquinho e apaixonante quanto uma Dory, mas não sai muitos momentos geniais disso. Parece que a Pixar estava apenas preocupada em apresentar uma CGI de ambiente hiper realista e se esqueceu de todo o resto. Não adianta O Bom Dinossauro ter uma belíssima animação se a história não empolgar como se espera. É apenas uma animação impressionantemente linda. E só.
Nem me senti puxado a esse universo proposto pela Pixar. O meteoro errou a Terra e os dinossauros não foram extintos. Isso é mostrado em uma rápida cena no começo e depois uma tela preta corta para “alguns milhões de anos depois”. Admito que eu queria ter visto mais desse mundo proposto pelo estúdio. O corte é muito violento e muito pouco se vê dessa premissa. O que temos é uma família de dinossauros herbívoros cuidando de uma fazenda e dinossauros carnívoros que são… bem vou deixar para você descobrir, porque essa é uma das poucas surpresas agradáveis da trama… e poucos animais ou sociedades, onde nem mesmo há muito interação entre outros dinossauros ou outros animais, além de pequenos grupos aqui e ali.
Não há muito além dessa visão limitada de Arlo. Como o planeta evoluiu? Há muita flora e pouca fauna. Queria ter visto mais criaturas, mais de como o mundo mudou com a proposta inicial da trama. Arlo realmente encontra poucos personagens ao longo de sua jornada, especialmente se compararmos novamente com Procurando Nemo.
Mesmo com estes problemas, O Bom Dinossauro também possui algumas cenas brilhantes. Dignas da Pixar. Uma das primeiras cenas de Arlo e Spot onde ambos falam de suas famílias é de cortar o coração, especialmente porque ela é feita quase inteira com gestos e olhares, com poucas falas de Arlo (Spot é um humano, mas não fala). É um dos melhores momentos de todo o filme.
Quanto ao final do filme, vi críticas divididas entre o destino do Spot, algumas dizendo que a Pixar foi pelo clichê e tornou tudo muito previsível, outras apenas aceitando a situação. Admito que também fiquei dividido com o final do filme, que no geral achei que muito água com açúcar. Sem aquele humor característico da Pixar, que aqui tentou se levar a sério demais, um erro que ela mesmo já havia cometido em Valente. Pra mim o final foi fraco, muito mais para os padrões Pixar que acabamos exigindo.
É uma perda de tempo ir ao cinema conferir O Bom Dinossauro? Não é, mas fica o alerta e baixe as expectativas. Não vá esperando algo no nível de um Divertida Mente. Espere algo meio O Rei Leão mais fraquinho, sem Timão & Pumba (e isso faz uma diferença gigantesca) e sem momentos musicais que grudam em sua cabeça, e sim, O Bom Dinossauro tem várias referências deliciosas com O Rei Leão, que ainda é uma das melhores produções da Disney de todos os tempos (um pouco envelhecido para os dias de hoje talvez).
O Bom Dinossauro nem de longe é uma das piores produções Pixar, mas figura fácil como uma das menos criativas do estúdio. Infelizmente. O que salva é que mesmo ainda assim é uma produção Pixar, o que o coloca acima de muita das atuais animações produzidas para o cinema.
Ah e antes do filme tem a curta metragem Os Heróis de Sanjay. Talvez alguns curtam, mas sendo mais cruel e amargo do que gostaria, achei o curta um dos piores que a Pixar já produziu. Tudo bem ser baseado em uma história real, porém é um curta meio sem graça. Eu fiquei o tempo todo esperando o humor característico do curtas do estúdio e ele não veio. É apenas uma “bonitinha” história envolvendo crença e criatividade infantil, de um filho e seu pai. Não era isso que eu queria. Até porque não teria sido de todo mal rir um pouco antes de entrar no drama de O Bom Dinossauro.
A Pixar talvez precisa ser menos dramática e voltar ao seu humor característico de seus clássicos. Não é como se a comédia não pudesse ter seus momentos emotivos. Toy Story, Monstros SA e Procurando Nemo estão aí para mostrar isso. Repetir a carga dramática e emotiva de um WALL·E vem se provando bem mais difícil do que a Pixar imaginou… O Bom Dinossauro é um bom exemplo disso.
Visual e Ambientação
Spot, o humano!
Arlo, o dinossauro
Roteiro linear e previsível
Um mundo pouco explorado
Final que divide opiniões
Boas homenagens ao Rei Leão
O Bom Dinossauro é bonito e tem seus momentos marcantes, mas no geral é uma aventura linear. Sendo uma produção Pixar é normal que as expectativas fossem por um melhor roteiro.