Quantum Break encerrado! Foram incríveis 16 horas de gameplay para conseguir ver tudo que eu precisava ver nessa jornada de Jack Joyce para impedir que o tempo simplesmente pare! Para mim foi uma experiência singular e original. E depois de tudo, sinto uma confusão ao definir Quantum Break como um game que narrativamente parece um seriado ou se seria um seriado que imita um game. Há dois mundos totalmente conectados aqui, dois tipos diferentes de mídia de entretenimento e linguagem e que juntos criam uma mistura singular de entretenimento.
Para tal resolvi fazer um review diferente, já que esta é uma ocasião diferente do habitual. Serão dois reviews para Quantum Break! Um falando sobre o game e suas mecânicas, sem dar spoilers da história que a Remedy criou. Abordando assim os aspectos que tornam Quantum Break um game diferente de tudo que já foi feito. Já o segundo review irá abordar os elementos do seriado dentro do game, comentando mais sobre a parte narrativa e o que a torna tão interessante indo além das barreiras de um game, e para tal essa parte terá todos os spoilers possíveis sobre o jogo e a discussão sobre o final do game!
E esta apresentação, tal como um looping temporal, estará presente nas duas publicações!
Impressões do Game!
Pensando em Quantum Break apenas com um jogo de videogame é possível encontrar alguns problemas em sua estrutura. A proposta da Remedy, entretanto, é inovadora e ousada, o que faz alguns do pontos a serem criticados aqui neste review serem irrelevantes em detrimento do produto como um todo. Porém é justo abordar o que pode não agradar no título e mesmo assim chegar a conclusão de que o mesmo vale e muito a pena ser experimentado!
A verdade é que histórias de viagem no tempo fascinam as pessoas, e Quantum Break acerta muita coisa dentro dos clichês, além de evitar muitos dos erros comuns em contos de viagens no tempo. Tanto que você mata algumas charadas antes do tempo em que elas devem acontecer, e mesmo assim a experiência narrativa não é comprometida. E a regra de ouro aqui: o passado jamais deve ser alterado! Ou melhor, é impossível alterar o passado! O que aconteceu aconteceu e você nada pode fazer para mudar isso.
Talvez o maior problema de Quantum Break seja a falta de foco: é um game ou uma série interativa? Mesmo que a reposta seja óbvia, isso abre problemas estruturais no gameplay do jogo. É um game de ação e tiro em terceira pessoa? Ou ele segue um formato mais linear de narrativa, lembrando um pouco os games do gênero point & click, focando em interação e narrativa? Digo que o game faz ambos e nem sempre em um ritmo ideal e sincronizado.
Na primeira prévia publicada por aqui citei como havia achado o ritmo muito melhor que o de Alan Wake (outro título do mesmo estúdio), e curioso que até hoje nunca o terminei, justamente pela falta de ritmo que tive com o game na geração passada. Hoje talvez eu tenha mais paciência, e talvez eu venha a tentar jogá-lo novamente, especialmente graças a retrocompatibilidade que o Xbox One está proporcionando ao título e também porque Alan Wake vem junto com Quantum Break (nesta fase inicial do lançamento do game). Enfim, retornando a Quantum Break: sim, mantenho o ponto onde digo que em termos de ritmo, tanto narrativos quando de ação, digo que a Remedy acertou mais aqui do que no pouco que já vi em Alan Wake.
— Batalhas
Em Quantum Break a parte da ação e da progressão dos tiroteios e batalhas pode ser considerado como satisfatórias. E entendo que talvez este não seja um belo elogio. Talvez os jogadores estivessem esperando algo como fantástico ou incrível, sendo que estes adjetivos só podem ser usados nas primeiras horas do game, quando tudo é novidade. Entretanto, mais próximo ao fim você acaba desejando menos ação e mais narrativa e isso me parece um claro problema de projeto. Há um problema em manter a parte ativa do game interessante ate o fim, seja por meio de novas habilidade ou novos inimigos, o que infelizmente não acontece.
O grande mal das batalhas é que depois do ato três é tudo realmente bem parecido. O protagonista já tem todas as boas habilidades (podendo apenas melhorá-las agora) e as estratégias em todos os inimigos, até mesmo aqueles em que podem manipular o tempo junto com o jogador, acabam sendo sempre iguais. A dificuldade não aumenta exponencialmente junto com a ameaça que deveria existir na trama.
Ao jogador não existe a preocupação de usar diferentes armas ou poupar munição, pois em todos os cenários de todas as batalhas há pilhas de armas e munição espalhadas por toda a parte. Não há muita diferença entre os confrontos iniciais, do meio e do final do game.
Quanto as armas, as metralhadoras soam quase todas iguais. As pistolas sempre tem munição infinita e causa seu dano se o jogador tiver paciência ou boa mira para headshots. Apenas as armas de maior dano, como a shotgun é que possuem uma alternativa interessante. Experimente fica com a carabina ao invés de uma espingarda. Eu gostei muito da carabina, que aparece no game já no segundo ato do jogo (mas ela não é frequente, então se você não a manter, acabará tendo que usar a espingarda por boa parte do game).
A Remedy até mostra esforço ao construir áreas e lugares diferentes para tais confrontos, mas ao fim, é tudo muito parecido. E como disse, não que os confrontos sejam ruins ou tediosos, o caso é que as batalhas de Quantum Break são satisfatórias e só. Em comparação com a história, em querer ver o roteiro avançando, o jogador passa a ligar menos para a parte de ação do game. Isso é ruim? Depende muito do seu ponto de vista.
— Acidentes e desastres
Além disso há algumas promessas enganosas feita pelo estúdio e que não se cumpriram a meu ver. Basta pensar que em uma das apresentações que o game teve em 2014 na Gamescom na Alemanha foi mostrado aquela incrível cena do acidente de uma grande embarcação contra uma ponte e toda a jogabilidade daquele momento. Se recorda disso? Reveja se puder, há alguns efeitos de partículas que acabaram saindo da versão final do game por sinal.
Bem esta cena está presente no game, mas sabe onde exatamente? No quarto ato do jogo, sendo que o mesmo tem cinco atos! Como assim o estúdio faz uma apresentação mostrando um dos momentos realizados após mais da metade do game? Porque pegar algo tão distante na campanha e sua história? Bem, justamente porque a promessa de um mundo em colapso por rupturas no tempo não é mostrado em termos de larga escala em mais da metade do game. Há acidentes e momentos de looping temporais? Sim, eles existem, mas são menores que os desastres da ponte e em uma escala muito menor. Dá para dizer que o momento do desastre da ponte é um dos grandes ápices da jogabilidade de Quantum Break e uma de suas melhores partes. E não deveria ter sido usado como uma apresentação pré-lançamento do game há dois anos atrás. E o jogo deveria ter muito mais cenas e atos como esse ao longo da campanha e meio que não há. Existe um outro momento similar no segundo ato do game e no último ato ele apenas brinca com isso, sem causar nenhum outro grande desastre.
O jogo é fechado em um mundinho muito apertado, ficando restrito a áreas mais fechadas, como prédios e locais abandonados. Em nenhum momento o game abre para uma perspectiva ampla, deixando os desastres ocorrerem e o mundo entrar em caos para o jogador jogar nesse momento. Até mesmo o tão alardeado fim do tempo, que é e não é mostrado, poderia ter uma cena ali na qual o jogador pudesse ter uma perspectiva maior do tempo se quebrando e suas consequências… e o game não faz isso.
Dá para sentir que a Remedy passou muito tempo planejando e pensando em Quantum Break e muita das ideias que eles gostariam de ter não puderam ser realizadas. Quer dizer, isso é uma presunção minha. Se o jogo fosse mais catastrófico e permitisse puzzles de manipulação temporal, tal como muitos indies games o fazem, mesclando narrativa e ação de combate, acho que o impacto do jogo seria muito maior. O jogo até arrisca alguns lampejos onde manipular o tempo permite saltar em plataformas ou abrir passagens, mas são tão pequenos estes momentos e nem sequer exigem muito esforço cerebral por parte do jogador. Talvez a ausência de puzzles seja por medo de travar o jogo, o que certamente também acabaria sendo um problema.
O caso é que Quantum Break acaba deixando a desejar em um de seus primeiros elementos apresentado aos jogadores, que era trabalhar com desastres e ver como as rupturas temporais seria apresentadas nestes momentos. Eu queria muito mais disso dentro do game, até mesmo uma maior liberdade para explorar tais consequências em uma área urbana.
— Colecionáveis
Um dos grandes esforços do game é fazer o jogador explorar e aprender mais sobre o universo proposto através dos muitos colecionáveis e todo o material extra (como os diários de personagens) que expande detalhes da historia espalhados por toda campanha de Quantum Break. Eu me divertir e me entretive caçando tais colecionáveis. O único mal é a preguiça em ler alguns deles.
Diferente dos colecionáveis de Rise of the Tomb Raider, por exemplo, em Quantum Break eles não funcionam como um áudio log (exceto aqueles que são pequenos rádios espalhados pelo game, que são poucos e não foram legendados na localização alias, mas estão dublados). O jogador realmente precisa ler páginas e mais páginas de documentos. E isso quebra um pouco o ritmo do jogo e também nem todos são importantes ou fáceis de ler. Alguns documentos são emails de personagens e a leitura deles é de baixo para cima, porque os personagens respondem uns aos outros nestes documentos. Não há praticidade.
E se você me perguntar se vale a pena ler todos, digo que não. Porém há alguns incríveis, como o diário da Beth que o jogador encontra em um dos melhores atos finais do game e que explica tudo que você precisa saber sobre ela. Obviamente não posso ir mais a fundo para não dar spoilers aqui. E há outros documentos mais próximos ao fim do jogo mostram detalhes importantes sobre outros personagens.
O grande problema dos colecionáveis é que eles são muitos e nem sempre fica claro como alcançá-los e o jogo não divide com 100% de precisão momentos onde o jogador apenas procura itens e momentos onde precisa lutar contra inimigos. O fato de barris inflamáveis brilharem na mesma cor que documentos na visão temporal atrapalham bastante essa busca pelos colecionáveis em algumas áreas. A Remedy deveria ter programados estas duas coisas em cores diferentes dentro da habilidade de visão especial de Jack.
Como uma história, estes colecionáveis são excelentes, mas mecanicamente para o game estes itens podem atrapalhar e quebrar o ritmo de alguns momentos. Felizmente o jogador pode ler todos os principais e importantes na linha do tempo do jogo no mundo principal do game, sendo que a linha funciona como uma espécie de mapa, permitindo rejogar atos concluídos, mudar bifurcações e rever episódios da série.
— Decisões
Outro aspecto muito alardeado para Quantum Break diz a respeito as Bifurcações, momentos em que o jogador decide como a história irá avançar no próximo ato e quais são os impactos que isso trará ao game em si. Aqui a Remedy foi engenhosa, mas não muito astuta. Uma ideia bacana, porém executada de forma a não atingir seu potencial.
Sim, as suas decisões pesam na história de Quantum Break. Personagens secundários morrem dependendo do que você decidir nas quatro bifurcações existentes na linha do tempo do game. Só que existe um porém: eu inicialmente achei que uma decisão tomada na Bifurcação 1 causasse, por exemplo, uma ruptura na linha do tempo, me dando acesso a dois caminhos e cada um desses dois caminhos pudesse me levar até a Bifurcação 2 e com isso quatro novos destinos pudessem acontecer. Afinal Bifurcação 1A poderia me levar a Bifurcação 2AB ou 2AC ou Bifurcação 1B me levaria para 1BB ou 1 BC. Entende onde quero dizer? Ao final da primeira decisão, cada linha me daria mais duas linhas num futuro para escolher, expandindo as possibilidades até o final de todas as Bifurcações. Infelizmente a Remedy simplificou demais isso.
A Bifurcação 1 impacta somente os eventos do ato 2. Após isso vem a Bifurcação 2, que impacta somente o ato 3 do game. A cada final de um ato o ciclo de eventos, por mais que você decida algumas coisa, se realinha na história para ser apenas uma única coisa. Uma morte que existe no ato 2 impacta o game dali para frente, mas não a ponto de fazer as bifurcações futuras mudarem. O tempo dá um jeito de acertar os paradoxos. Inteligente para as regras das viagens no tempo, mas em termos de gameplay isso acaba ficando prejudicado.
Dou um exemplo do início do game. A minha primeira decisão é ser linha dura ou ser diplomata frente as pessoas que foram presas durante o incidente do ato 1. Se eu for linha dura, uma personagem morre, e se eu for diplomata, ela vive. No ato 2 o jogador passa pelo lugar onde essa bifurcação acontece. Se escolhi ser diplomata, acabo salvando a personagem (Amy). Se sou linha dura, ela morre e salvo outra pessoa no lugar. O jogo equilibra então a narrativa. Independente de quem eu salvo, o gameplay de salvar “alguém” acontece de qualquer jeito e tudo dali para frente acontece de forma similar, seja com a garota que salvei, seja com o outro personagem. Não muda a essência e situações do gameplay. Alguns diálogos são diferentes, mas o jogo em si acontece da mesma forma.
Isso é ruim porque a Remedy mata o fator de replay do game. Não importa a minha decisão, como um game, tudo acontece igual. Não terei habilidades diferentes, áreas diferentes ou inimigos diferentes, sendo que é justamente isso que eu torcia para que cada bifurcação fizesse, afinal é um game de apenas 5 atos. Não é grande (a narrativa estica o game para 12/16 horas de campanha, mas isso não significa todas estas horas de puro gameplay de qualidade impecável). A sorte de Quantum Break é a sua deliciosa trama.
Quer uma prova que decisões não possuem o peso que deveriam? Basta saber que o game não tem dois finais. Não há um final secreto. Independente do que você decida e de quem morre, ao fim do game, tudo termina do mesmo jeito, independente da sua linha do tempo. Para mim isso foi um balde de água fria. O terminei no final de semana passado na esperança para descobrir se haveria um final secreto ou alternativo… e não há!
— Replay
E aqui cabe uma outra reflexão. A Remedy, por toda a sua experiência com Alan Wake e vendo as tendências de mercado de games desta e da geração anterior, ainda acredita que um game não precise de um modo extra ou modo multiplayer para dar longevidade ao título? Como assim!?
Foi assustador ver relatos de jogadores em grupos do Facebook finalizando Quantum Break no dia do lançamento oficial do game, na semana passada, e depois descobrindo que não há mais nada para se fazer no game, exceto discutir na internet a respeito de sua excelente história. É um game que parece ótimo para uma alugada de fim de semana (se locadores ainda existissem) e pronto! Há algo errado nisso a meu ver. A experiência de um jogo deve ser única, divertida e original, mas quanto tempo ela deve durar? Estes é um dos grandes debates do mercado de games.
Veja por exemplo, a Remedy criou um modo de combate interessante para Quantum Break, com personagem que manipulam o tempo, e limitado apenas ao protagonista. Por que não pensar em aplicar isso em um modo multiplayer? Poderia funcionar. Não digo que seria popular, mas justificaria a manter o game instalado no Xbox One por mais um tempo, brincando em outros modos.
Ou indo para um modo mais racional, por que não um modo cooperativo do tipo horda? Abra os cenários do jogo para dois jogadores, manda um modo infinito de inimigos e deixa os jogadores se divertindo, tentando ver por quanto tempo conseguem ficarem vivos, quem pontua mais, e leaderboards para incentivar a comunidade online. Eu jogaria fácil um modo assim.
É estranho pensar que tenho aqui um game que ainda não bateu um mês de lançamento e já não tenho nada mais para fazer nele. Exceto jogar tudo de novo. Sem qualquer peso de uma nova e diferente experiência. Ruim isso, não?
— Seriado
A parte do seriado live action de Quantum Break quero discutir no outro texto que está sendo publicado em paralelo a este, porém como o outro artigo haverá spoilers da história, e isso vai afastar alguns que ainda não jogaram o game, o que posso dizer aqui é que essa ferramenta narrativa funciona e acaba sendo um dos grandes trunfos do título.
Você joga querendo chegar ao final do ato, justamente para ver mais da série. Da mesma forma que enquanto está vendo a série, quer terminá-la logo para ver no que aquilo vai refletir no game em seu ato seguinte. É uma boa fórmula para instigar o jogador.
Os personagens são interessantes o suficiente para lhe prender e os pontos de vista são importantes para entender alguns dos aspectos gerais da história de Quantum Break e também de seu final e possível gancho. Se você é daqueles que pergunta por aí se pode pular os episódios da série porque quer apenas jogar Quantum Break, devo dizer que existem grandes chances de você não ter entendido direito a proposta do jogo. Game e série são conectados, uma experiência depende da outra. Ao menos a verdadeira experiência proposta pelos desenvolvedores.
— Como game…
Dá para dizer que Quantum Break falha em alguns aspectos importantes, porém o que segura sua experiência singular e original é sua trama, a história que a Remedy quer contar aos jogadores. Esse é o ponto de ouro do game. Mecanicamente ele tem vários problemas, que não o tornam um game ruim, mas também não cumpre aquilo que se esperava.
Se você é um jogador que chegou aqui pela história, pelos conceitos de viagens do tempo e pela enorme pilha de detalhes extras que o game te apresenta, Quantum Break é a sua casa. Se você for daqueles jogadores que não ligam para história, não prestam atenção e quer apenas chegar metendo o pé na porta e atirando para todo o lado, é bem provável que se decepcione um pouco com a curva de progressão desse elemento no game. Agora como um misto de ambos os formatos, Quantum Break acaba se saindo como um game memorável. Daqueles que você precisa experimentar para tirar suas próprias conclusões. Ao menos, na minha opinião, é algo diferente de tudo que já anda sendo produzido no mundo dos games.
E eu adoraria ter mais jogos nesse formato!