Batman Vs Superman – A Origem da Justiça | A perspectiva de Deuses & Monstros! (Crítica)

Demorei horrores para conseguir ir conferir Batman vs Superman nos cinemas. Só o pude ir neste final de semana, sobre o temor da chegada de Guerra Civil nos cinemas e aí não conseguir mais ir ver o filme da DC. E que alívio que pude ir, mesmo com tanta gente falando mal e criticando o filme desde a sua estreia em 24 de março.

Felizmente não tomei spoilers do filme nesse meio tempo. Vi piadinhas aqui e ali que, sem ter visto o filme não se contextualizaram na hora. Que alívio. Apenas sabia que estava sendo um filme que estava dividindo as pessoas, uns gostaram com ressalvas, outros odiaram. E agora eu entendo tais sentimentos conflitantes.

Já adianto que adorei o filme. Minha esposa, que não é leitora de quadrinhos, mas entende muito mais do que aparenta do universo destes personagens, também adorou. Claro que não serei cego ao ponto de dizer que o filme não tem problemas, mas é tão revigorante saber que ainda há espaço para novas fórmulas para filmes de super heróis nos cinema!

A seguir a minha crítica sobre o mesmo, com spoilers minúsculos e quase que insignificantes. Não vai estragar a experiência de ninguém que ainda não tenha visto, acredito. E infelizmente não vou conseguir abordar todos os pontos que gostaria aqui. O filme tem muita, mas muita coisa que gera discussão e debate. Vou me focar apenas em alguns pontos principais.

Marvel vs DC

Este é um conflito que existe desde muito antes do meu nascimento. Os leitores geralmente tem preferência por um universo de super heróis em detrimento do outro. Há aqueles que até leem e acompanham ambos, mas até mesmo para estas pessoas a predileção existe. No meu caso, sempre fui mais apaixonado pela DC do que pela Marvel.

Na Marvel sempre gostei muito do Homem-Aranha, porque ele realmente tem uma pegada totalmente diferente do resto do universo Marvel, ainda que a própria Marvel tenha tornado seus personagens mais interessantes nas últimas duas décadas. Mas no geral, a Marvel tem essa ideologia de pequenos homens que se tornam super-heróis. Qualquer um pode ser um super-heróis na Marvel, basta um acidente que lhe dê super poderes. Não generalizando e admitindo que há exceções. No caso o próprio Homem-Aranha é o maior exemplo disso, mas há outros.

O universo da DC pra mim sempre fui muito diferente disso. Claro, você tem o Batman, que representa o super-herói que não tem superpoderes (apenas muito dinheiro e um passado traumático), mas também é o universo onde existe grandes entidades, alienígenas ou mitológicas, tais como o Superman, Mulher Maravilha, Aquaman, Tropa dos Lanternas, Caçador de Marte, Shazam etc que são muito mais do que meros humanos normais, como você e eu. Claro que há vários personagens que também são homens mundanos, de acidentes com super poderes, como o Flash, mas há todo um sentimento diferente no mundo da DC. De super-heróis acima das piadinhas e do vilão da semana (ainda que tenha isso também). A DC tem essa coisa de ter superpoderes contém uma carga dramática dentro de si, um fardo de ser mais do que um ser humano normal. São Deuses andando entre os seres humanos, ainda que nem sempre puxe para esse aspecto.

Isso se reflete no universo cinematográfico. O filme do Homem de Aço já trazia um pouco disso, do drama, do peso, mas em um roteiro desconexo, confuso e até mesmo apressado, querendo mais, mas sem poder ainda trabalhar isso. Já em Batman vs Superman, as portas para as possibilidades se abrem e tudo é possível, basta que se preste atenção.

Eu realmente fiquei aliviado de encontrar um filme sombrio, pesado e especialmente barulhento. Que direção de som incrível! Bem diferente daquele circo de cores, piadas, galhofas e cambalhotas que a Marvel fez em Vingadoes Ultrom. E imagino o quão tentador deve ter sido pensar em seguir essa linha, sabendo que também daria seu resultado. Ainda que acidentalmente poderia acontecer exatamente o que aconteceu com o filme do Lanterna Verde, que hoje fica be, claro de notar o quão parecido ele é com a formulinha do universo Marvel nos cinemas.

A Origem da Justiça

A grande má interpretação, ainda que cada um tenha direito a sua, que andei lendo em algumas críticas e ouvindo em alguns podcasts, é pensar que Batman vs Superman é um filme como dos Vingadores, ou seja, que há uma direção de concluir um momento de uma história ou fase. Batman vs Superman é exatamente o inverso, ele não veio para concluir algo, mas para abrir as possibilidades. Para começar algo.

Há essa discussão de que teria que ter um filme de origem do Batman, um filme de origem da Mulher-Maravilha, um filme que contextualizasse as motivações desse Lex Luthor psicótico. Até mesmo quem diz que este filme deveria virar dois ou três filmes separados. Eu discordo fortemente disso tudo.

Nem sempre uma história tem que ser contada de forma linear. Nem sempre tudo precisa de contexto logo no início. Narrativas podem brincar com isso. Isso acaba sendo um problema na qual estamos mal acostumados. Temos preguiça de interpretar, de ver que há buracos que não precisam ser preenchidos logo de cara, de querermos tudo mastigadinho e resolvido. Aqui não, Batman vs Superman expande o universo da DC de uma forma que ele mais abre perguntas do que as responde. E para mim isso é excelente, contanto, é claro, que a Warner e a DC continuem fazendo novos filmes e preenchendo estas lacunas com o tempo.

Gosto das novas versões propostas aqui. Um Batman que já derrotado, que diz que combater vilões é como eliminar erva daninhas do quintal. Sempre há mais crescendo. Um Batman que mata, que não tem valores morais 100% confiáveis. Um Batman que já se amargurou, que tem ódio, ao mesmo tempo em que tem medo daquilo que não entende. Um Batman com um forte trauma, em uma jornada para descobri qual o sentido de 20 anos combatendo o crime. Já velho e com medo de até quando poderá continuar com isso. E esse é o link que o filme faz com a chegada do Superman.

O Superman sempre foi um dos maiores ícones da DC (além de ser uma personagem mais difíceis de se trabalhar com facetas e mudanças) e aqui há ótimas reflexões em torno desse personagem. Seria ele um Deus, ao nosso modo de ver as coisas? Há toda essa discussão, de medo e adoração em torno do ser que pode acabar com tudo, se algum dia ele ficar de saco cheio. Enquanto isso há o próprio Superman, ainda fazendo o bem porque é isso que seus pais lhe ensinaram, porém ainda desconexo de uma certa humanidade. Do ser que mesmo para pedir ajuda, chega voando e para acima de sua cabeça, com um ar de superioridade, não proposital, mas simplesmente porque ele não sabe ser humilde, não sabe o que é ter medo, não saber ser um… homem mundano.

O filme inteiro trabalha com esta exposição. O Superman é um Deus solitário, cuidando de um formigueiro, prezando o máximo de vidas que consegue, mas que sabendo que toda intervenção que ele faça nesse mundo, ainda assim há formigas que vão morrer soterradas dentro de seus buracos, que vão lhe morder e se incomodar com a presença de um ser que elas não entendem. A dualidade do Superman nesse filme é tudo aquilo que se esperava ter visto no primeiro filme.

A Mulher Maravilha é a incógnita do filme. Muito pouco sobre ela é explicado e o pouco que diz são pistas para seu filme solo. Ela já é centenária aqui. Sua personagem já atuou como heroína no passado, na qual ninguém mais se lembra porque foi a mais de 100 anos, e que desistiu. Os seres humanos não aprendem. Continuam atraindo desgraças, se corrompendo, se qualquer noção de autopreservação. E a Mulher Maravilha aqui não quer saber mais disso. Até um ponto em que ela muda de ideia. Por que? Esperança? Curiosidade? Potencial naqueles dois malucos que surgiram e que estão se esmurrando? O filme não dá a resposta de forma clara, apenas indiretas. Ainda há pontos que não podemos entender agora. Mas que é impossível não vibrar quando a Mulher Maravilha entre em cena e parte para briga. Certamente um dos melhores elementos do filme. Talvez por não termos essa personagem há tanto tempo exposto nas telonas.

O Batman quer matar o Superman? Sim, ele quer. E isso causa uma sensação estranha para muitas pessoas, mas o Batman é essa figura da raiva e do ódio, que vê a humanidade se chafurdar na lama todos os dias em Gotham. Que é corruptível. Ninguém é puro, ninguém é bonzinho, nem mesmo Deus! Na mente do Batman o Superman é esse ser que um dia ainda vai se virar contra os homens, que vai se encher de cuidar do formigueiro. E quando isso acontecer, o que será feito? Como se mata um Deus? É esta a jornada do personagem neste filme. E não é diferente nos quadrinhos, onde ele guarda um arquivo de como derrotar todos os heróis da DC caso um dia algum deles saiam do controle, incluindo o próprio Superman.

Sem dúvida é diferente da cruzada dele em O Cavaleiro das Trevas, na qual o filme se inspira e faz referencias. Esse clássico de Frank Miller é a última história do Batman. É a sua aventura final, o fim de sua carreira. No universo cinematográfico da DC, esta não é a aventura final do Batman, é apenas o começo de uma nova fase, da volta da esperança a um herói já massacrado, já maltratado por 20 anos caçando vilões e de não estar nem de perto de ter conseguido mudar Gotham. De Frank Miller apenas temos um Batman condizente com o mundo mais realista, que aceita baixas na guerra contra o crime, da mesma maneira que o Superman precisa lidar com as baixas colaterais por seus atos. Formigas… somos todos insignificantes nesse mundo de Deuses e Monstros.

Há muito que o filme não explica. Há muito que o filme deixa para que o espectador interprete e encaixe as coisas como bem quiser. O Superman solitário é um escroto sem humildade, que somente quando começar a se reunir com outros meta humanos é que se sentirá menos solitário, e por consequência será mais humilde? O filme não diz isso, mas é o que eu imagino que seja. A arrogância do Superman é um problema que existe na faceta de um dos super-heróis mais poderosos do mundo, tal qual o Batman também é arrogante em não confiar em ninguém. Duvide sempre da sua sombra, porque é assim que o personagem lida com seu trauma, é assim que ele continua sobrevivendo a um mundo de loucos.

O Lex Luthor é uma criança mimada que odeia a ideia de algo que ele não pode controlar? Que tem problemas paternos? Que faz o que faz porque tem uma visão deturpada do que é controle e poder? É difícil explicar porque o Lex Luthor é um cara perturbado e insano, com predisposições psicóticas que as vezes lembra um pouco de personagens como o Coringa. Mas precisa mesmo explicar? Quer dizer, caras ruins as vezes não fazem coisas ruins apenas porque são assim? A história do Lex Luthor ainda não foi totalmente revelada, porém não acho que ao contrário de quem criticou o personagem, ele precise de contexto aqui, novamente é a ideia de que tudo precisa vir mastigado, quando não precisa.

Dito isso, eu achei excelente a construção desse novo Lex Luthor, menos adulto, mais estrategista, porém menos racional. Ele se apresenta impotente nessa nova ordem mundial e enlouquece com a ideia de parecer uma mosca em meio a Deuses. Nos quadrinhos Lex Luthor também tem lá suas múltiplas representações ao longo de décadas, indo do empresário corrupto até mesmo a presidente dos Estados Unidos. Mas Lex também despiroca nos quadrinhos, e acredita que se vestir uma rouba robótica pode derrotar o Superman. O filme brinca com um Lex mais louco, sedento de poder e obsessivo pelo Superman, o que também está dentro de aspectos de suas várias fases nos quadrinhos.

Furos de roteiro?

Muitas das críticas se focaram em esmiuçar os furos de roteiro. De uma Mulher-Maravilha que ora sai vazada, ora resolve ajudar. De um Lex Luthor que com um argumento pífio distorce a lógica de uma inteligência artificial. De um Batman com premonições (ainda que a explicação disso seja crível com a ideia do Flash bagunçando a linha do tempo, como sempre faz nos quadrinhos).De um Superman que ainda não lida com as coisas direitos, sempre arrogante e um pouco cego ao seu redor. De uma Lois Lane que não fala “foi armação, caramba, presta atenção no que estou dizendo!” entre outras escorregadas bizarras de uma Lois Lane atrapalhada. Ou de um Apocalipse que nada tem a ver com suas origens nos quadrinhos (e não precisaria ser – o roteiro deixa em aberto a possibilidade dele não ser literalmente o único Apocalipse que existe no universo).

Sim, o filme tem argumentos problemáticos em vários momentos, mas ainda assim eu não estou olhando a técnica da costura, mas o plano geral da história. Há concessões que precisavam ser feitas, ou serem pífias para dar ritmo para a história acontecer. É como aquele clichê do vilão contar seu plano maligno ao herói, dando-o tempo para escapar ou do mocinho nunca atirar primeiro e resolver o conflito proposto pela história. Batman vs Superman faz muito disso, costura coisas estranhas, a serviço da experiência cinematográfica do pipocão, sem soar escrachar como Vingadores consegue ser em certos momentos.

E duas horas e meia já é um grande tempo para um filme. Quanto maior, mais arriscado ele é. Mas no geral aceito estes pequenos recordes em favor do ritmo. E o ritmo do filme é excelente. Fora que todos os furos e problemas que ele possa ter, há coisas aqui que não são propriamente furos, mas apenas pontas soltas de um universo em expansão.

Talvez outro problema seja a densidade de Batman vs Superman. O filme conversa diferente com públicos diferentes. Quem lê quadrinhos vê um prato cheio, pesca referências e entende as camadas de algumas situações que o filme apenas começa a construir para o futuro. Quem não lê, consegue entender o plot principal sem problemas, mas questiona aquilo que aparece sem contexto na telona. O que tinha de gente na sala de cinema explicando para outra pessoa as referências, ou perguntando coisas, foi algo que chegou a me incomodar. Ainda que gerar conversas e discussões para mim seja mais interessante do que apenas ver as pessoas mudas e caladas recebendo a comidinha na boca, sem qualquer esforço em um filme pipoca de super-herói.

Cabe um adendo importante aqui: não estou dizendo que quem não gostou do filme é porque não prestou atenção, gosta de coisas mastigadinhas ou é um bobão que não entende nada de DC. Não generalize, pois não estou generalizando. É direito de cada um gostar ou não gostar, tal como possuir argumentos para sustentar isso. Estou dizendo que existe uma parcela de pessoas que não combinam com esse tipo de narrativa, na mesma proporção de quem não gosta de comédias, de filmes de terror, de dramas e até mesmo de filmes de super-heróis. O que quero dizer aqui é que Batman vs Superman: A Origem da Justiça tem uma pegada diferente do que se espera de um filme de super-herói nos dias de hoje, e isso incomoda quem não gosta de sair da bolha, da normalidade estabelecida por outros filmes que vieram antes.

Expectativas de futuro

Tudo em Batman vs Superman: A Origem da Justiça se resume as expectativas para o futuro. Vou considerar que esse é o primeiro filme de construção de uma mitologia. O Homem de Aço foi, no mínimo, um prólogo.

É um filme que define tons, que define como a Warner/DC quer comunicar este universo aos espectadores e fãs destes personagens. Para mim a ideia de distanciamento do modelo colorido e divertido da Marvel é gritante aqui e isso é fantástico! Não que o modelo da Marvel seja ruim, apenas é outro e ponto.

Gostei de como esse universo da DC se apresentou nos cinemas. Mais sério, brincando com essa ideia de moralidade, de ética dos super seres. Aqui nem dá para chamá-los ainda de super-heróis. As discussões de poderes e política, da visão religiosa, das influências do inimaginável em um mundo mundano. Da insignificância do ser humano.

Existe toda uma influência mais realista, mais pessimista, da adoração, da desconfiança de um mundo a sombra de… mais uma vez… Deuses e Monstros!

Atmosfera mais sombra para o filme
Direção de som e feitos sonoros
Batman de Ben Affleck
Superman ainda em construção
Mulher Maravilha em ação
Lex Luthor psicótico
Pontas soltas para o univero DC nos cinemas

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