TMNT Mutants in Manhattan | As Tartarugas da Platinum Games! (Impressões)
Tem uma coisa que me incomoda no formato na qual os reviews são feitos hoje em dia, que quase sempre seguem uma linha de raciocínio: os game são oito ou oitenta. Ou seja, o game é muito bom e vale a pena comprá-lo ou o game é mediano e a recomendação acaba sendo para que o jogador passe longe do game.
Acaba criando aquele efeito blockbuster: jogue apenas aquilo que seja muito bom. Fora que isso acaba ficando ainda mais forte aqui no Brasil, onde os jogos são extremamente caros e por isso os jogadores investem muito pouco em títulos alternativos ou medianos.
Isso me fez lembrar dos meus tempos de Super Nintendo e Nintendo 64, uma época aqui no Brasil onde os jogadores não tinham tantos games, mas em contrapartida jogavam quase de tudo. E como isso era possível? Se você pensou nas locadoras de games, acertou.
É estranho ver como essa cultura mudou, onde os jogadores hoje em dia precisam ter certos títulos e não mais alugá-los por alguns finais de semana (antigamente isso era o suficiente depende de alguns games). As locadoras morreram há muitos anos atrás e nunca mais voltaram. Ao menos no interior do Brasil. Não duvido que em grandes capitais ainda existam algumas sobreviventes dessa era de ouro dos videogames. Lá fora nem imagino como deve funcionar na totalidade, apesar de que sei que existem muitas lojas de games que, não só vendem títulos novos e lacrados, como também apostam muito no segmento de usados, o que foi uma das polêmicas causadas nesse começo de geração por conta daquele início conturbado em torno de como o Xbox One funcionaria (e que a Microsoft se acertou antes mesmo do console ser lançado no final de 2013).
Me pergunto se hoje, aqui no Brasil, não vivemos uma geração na qual as locadoras poderiam retornar. A pirataria (principal pivô da morte das locadoras) deu uma boa recuada desde que os consoles estão mais problemáticos para serem desbloqueados e continuarem funcionando online. Fora que à exceção dos indies, o mercado de games originais tem tido um aumento agressivo de preço nos últimos anos, ficando tão caro quanto eles eram no início da geração PlayStation 2 e Gamecube. Isso é preocupante, pode ter certeza.
E sabe outra coisa que funcionaria muito bem nos games atuais? Locação digital. Poder adquirir um game por uma semana, e depois sua licença expiraria. Não muito diferente do sistema de locação de filmes digitais ou certos serviços via streaming, por exemplo.
Enfim, porque toda essa volta e papo a respeito desse assunto aqui no review de Teenage Mutant Ninja Turtles Mutants in Manhattan? Porque se estivesse escrevendo esse texto em 1995 seria muito fácil dizer que esse é um daqueles games que “vale uma alugada de final de semana”, porém, estando em 2016, não posso dizer tal coisa, pois onde diabos você vai conseguir alugá-lo?
Tradicionalismo obrigatório
Não tem como fingir que os reviews de lançamento de TMNT Mutants in Manhattan não malharam o game, pois malharam. Os críticos realmente caíram matando em cima do mais recente game de uma franquia marcada na memória de muitos jogadores veteranos. Que atire uma pedra quem nunca jogou algum game das Tartarugas Ninja em toda a sua vida de jogador. E os clássicos para arcade? E Turtles in Time? Pois é. São games assim que marcaram tanto que sempre vão torna uma tarefa quase impossível superá-los. Não que a Platinum Games não tenha tentado.
O principal erro de Mutants in Manhattan é perceptível antes mesmo do game sequer começar: não há multiplayer cooperativo local! Ou seja, nada de sentar com um, dois ou três amigos em um mesmo sofá para jogar o game. Há multiplayer para quatro jogadores sim, mas somente para quatro pessoas online, separados pelo oceano da infinitude que é a internet.
Isso pra mim foi um banho de água fria, nesse frio inverno de 2016. Sentei todo pimpão no sofá, para jogar com o filhão, mostrar para ele que maneiro é um game das Tartarugas Ninja, dei um controle em sua mão e fui para multiplayer na tela inicial do jogo e… oh não, não há multiplayer local? Tive que desligar o jogo na hora e fui atrás de outro game para brincar com ele. Que triste isso!
E não tem nem essa de tentar entender a lógica da Platinum Games, ou que o formato do game não caberia coop local. Não importa. Algumas regras são lapidadas em pedra: games das Tartarugas Ninja obrigatoriamente precisam de um modo cooperativo local. Não importa nem se fosse um modo extra e à parte da campanha principal, mas essa característica tão clássica precisaria estar ali. Sinceramente esperava que a Platinum Games soubesse disso.
Uma fórmula conhecida
Passado esse momento de incompreensão, o que me levou alguns dias para aceitar, tentei novamente dar uma chance ao título. Desta vez sozinho, sem o filho ao lado. Cartas na mesa? Este não é um game convencional das Tartarugas Ninja. A Platinum deixou a experiência do game bem semelhante ao que ela fez, de uma maneira bem positiva, em Transformers Devastation, porém até refinando e aprimorando algumas ideias utilizadas lá.
É um game de exploração tridimensional, que consistem em 9 estágios, sendo que cada um é como um mundo aberto (de menores proporções), na qual o jogador pode ir para qualquer direção, cumprindo missões aleatórias, até dar o tempo de fase na qual o grande chefe do estágio irá aparecer para lhe enfrentar.
E vale mencionar que cada vez que se entra em um estágio vencido a experiência de jogá-lo novamente é diferente, pois as missões são aleatórias. Você pode até mesmo jogar um estágio inteiro e não vir algum tipo de missão. Não é um caso de ter três tipos de missões apenas e a ordem delas mudar a cada reinício. Existe uma boa diversidade, ainda que muitas consistam em surrar inimigos, desarmar ou proteger coisas.
Acaba sendo uma ideia legal e bem mais flexível do que a encontrei em Transformers Devastation, onde a linearidade e o formato das missões tornavam o game cansativo após um certo ponto. A Platinum pegou um ponto negativo e o aprimorou, ainda que não esteja totalmente perfeito.
E vamos ser justos: este não é um game do selo original do estúdio de Bayonetta e Vanquish. Trata-se de um daqueles títulos da Activision que vivem sobre seus direitos de produção de games. E não é coincidência de um novo título das Tartarugas Ninja lançado em paralelo ao filme que estreou recentemente nos cinemas (e que não consegui ir assistir aliás).
A Platinum ao menos foi sagaz de não tentar fazer um game baseado no filme. Mutants in Manhattan na verdade é baseado nos quadrinhos da série que fazem seu sucesso lá nos Estados Unidos, publicados pela Editora IDW e que, infelizmente, não possuem espaço para serem lançados no atual Brasil da crise (e olha que a Panini tentou tempos atrás).
Sendo assim, presumo, que seja um game de baixo orçamento, com um período curtíssimo de tempo desenvolvimento para que qualquer estúdio conseguisse fazer um título que se sobressai-se acima dos demais blockbusters da geração, ou até mesmo que conseguisse se equiparar as próprias IPs originais de um estúdio como a Platinum Games.
Pensando por essa ótica, Mutants in Manhattan até que acaba se saindo melhor do que se esperaria. Ele pega um modelo que deu certo, refina, aperfeiçoa e tenta fazer algo interessante e diferente com as Tartarugas Ninja. Tentando fugir da antiga fórmula consagrada da série das Tartarugas e trazendo para um formato mais característico com a própria Platinum, ainda que com isso começa alguns deslizes quase que imperdoáveis.
Antes deixar a Platinum cuidar de licenças assim, do que lembrar o quão ruim foi, por exemplo, os últimos games do Spider-Man sobre esse sistema de licenciamento de marcas da Activision, por exemplo.
Não existe pizza ruim!
Okey, existe sim (brócolis), mas vamos imaginar que no contexto em geral pizzas são deliciosas e ponto. Há algumas que vão passar do ponto, podem ficar meio queimadinhas, algumas onde o queijo está salgado demais, mas mesmo assim basta ver uma pizza que queremos devorá-la, independente de quão ruim ela possa ser.
Eu meio que passei por isso com TMNT Mutants in Manhanttan. O primeiros estágios me pareceram muito estranhos, diferentes demais, confusos e caóticos. Esse é um game que demora para que o jogador o assimile, ou na lógica das pizzas, o sistema digestivo vai apanhar um pouco para fazer a digestão, mas você vai comer independente do quão estranho seu gosto possa estar, afinal é pizza!
Pode parecer bizarro, mas achei que o game começa ruim, meio sem identidade e de repente, lá estava eu, empolgado com os momentos finais do título, adorando as últimas fases, muito mais bonitas, dinâmicas e diferentes das fases regulares do início do game.
Adorei a ideia presente em alguns estágios, como o que se passa no esgoto, e a água empurra o jogador, ou o que se passa no topo da cidade, em meio a uma tempestade que lhe empurra para fora dos edifícios a todo momento. Foi uma surpresa ver a ambientação impactando meus movimentos na jogabilidade. Até mesmo os estágios finais, dentro do TCRI (Techno Cosmic Research Institute) com todos os chefes do game em diversos andares (lembranças de Mega Man) ou o estágio final dentro de um elevador com hordas e mais hordas de inimigos acabam sendo ótimas fases e ótimos momentos dentro do jogo.
Talvez o lance seja que conforme o jogo avança o sistema de progressão dos personagens vai melhorando. Cada tartaruga pode carregar quatro ninjutsus (quatro habilidades especiais) dando ao jogador o poder de 16 especiais, já que é possível trocar de tartaruga instantaneamente. E no começo estes especiais são bem ruins, porém conforme o joga avança eles vão ficando maneiros, chegando ao ápice de um Michelangelo em holograma gigante socando todos os inimigos do estágio.
Nesse ponto o game está mais difícil e mais estratégico, sempre me forçando a trocar de tartaruga ao usar um especial, para que enquanto um estivesse recarregando e eu pudesse usar a habilidade da próxima. E há muitas habilidades maneiras, como canhões de laser, movimento combinados, grandes e espalhafatosos golpes que atingem muitos inimigos. Há ainda algumas habilidades que ativam uma câmera lenta ou outra que deixa a tartaruga invisível, fora as habilidades de suporte, como recarregar a energia de todas ou dar pizzas para cada um (que também são energia).
Esse talvez seja um dos melhores elementos do título: poder controlar as quatro tartarugas ao mesmo tempo, enquanto vai lidando com inúmeros inimigos, usando as habilidades de cada uma para sair vitorioso em cada missão. O game incentiva e muitas vezes essa troca de personagens pelo jogador. Em especial nos grandes chefes do game.
É o tipo de recurso de gameplay que a Platinum se dá muito bem, ainda que desta vez ela tenha deixado cair a peteca no que diz respeito aos combos individuais de cada tartaruga. No geral passei o game inteiro amassando os botões X e Y, sem precisar de engenhosas combinações. Ainda que tenha misturado isso com as habilidades especiais, o radar de procurar inimigos e a esquiva. Existe uma complexidade de comandos, mas o game não exige muita especialidade por conta de ter três tartarugas automáticas te auxiliando a todo momento.
Isso acontece porque as quatro tartarugas estão sempre presentes na tela do game. O jogador pode setar comandos para cada tartaruga, como por exemplo, deixando-as mais passivas e, por consequência, menos ativas. Caso contrário, ao longo de pelo menos os três primeiros estágios você praticamente os termina sem precisar eliminar os inimigos. O modo automático das três tartarugas mantidas pelas IA do game praticamente ganha tudo para ti. Um elemento tosco e ruim, com certeza, mas passar sozinho, sem esse auxílio também não é muito fácil (ou divertido). Existem missões onde a cooperação acaba sendo imprescindível e por isso a Platinum fez uma IA tão ativa e intrometida. Felizmente isso acontece apenas no comecinho do game, enquanto o jogador ainda está se acostumando a tudo. Mais a frente, com inimigos mais fortes, acaba sendo necessário a intervenção do jogador.
Enfim, o game meio que apresenta então esse mix de elementos e sentimentos contraditórios, mas que eventualmente, com a progressão do mesmo, vai dando o game uma identidade e ele vai tornando menos apático. É ruim dizer que um game começa ruim e vai melhorando aos poucos? Pelo contrário. Eu acho muito pior aquele game que começa bem e piora progressivamente. Ao menos Mutants in Manhattan faz o inverso.
Dois problemas nacionais
TMNT Mutants in Manhattan basicamente tem dois problemas quando em análise com o mercado brasileiro de games. Por algum motivo triste, a Activision não se preocupou em oferecer o game localizado em português. E é bizarro porque o francês, italiano, espanhol e alemão estão presentes no título. Seria assim tão problemático ter liberado o game com legendas em português?
Não que a história seja genial, Krang e o Destruidor querem novamente destruir o mundo e com isso arranjam aliados para distrair as tartarugas. Nada realmente incrível esse enredo, mas ainda assim há muitas inserções de diálogos dos personagens que são hilários e que se perdem para aqueles que nada manjam de inglês, mesmo que haja legendas em tal idioma. A piadinha de selfie nerd é ótima por sinal.
É o tipo de game que funcionaria muito bem em nosso mercado se tivessem se dado o trabalho de localizá-lo por aqui. E não é como se a Activision não fizesse isso com grandes games, afinal, Destiny e Call of Duty já chegam por aqui até mesmo dublados. Está na hora de pensar nisso com suas licenças menores. Se até indies já são localizados em português, não há porque não localizar tais títulos também.
O segundo problema diz respeito ao preço, o que irá puxar o assunto lá do começo deste review: 230 reais a versão de consoles e 130 reais a versão de PC. Parece muito, não? E é! Vale até mesmo revelar que lá fora, nos Estados Unidos, o game não recebeu nem mesmo o preço completo dos grandes lançamentos da geração. Ao invés de custar 60 dólares, Mutants in Manhattan custa 50 dólares. Parece pouco, mas é uma diferença coerente com o que o game tem a oferecer.
É bizarro ver um título como esse chegar aqui custando 230 reais no Xbox One e no PlayStation 4. Totalmente incompatível com a nossa realidade. A versão da Steam, custando 130 reais até que é válido, ainda que a turma do PC chore (com razão) de qualquer game que custe mais de 100 reais. Afinal, ainda que com todos altos e baixos, o game estranhamente é viciante e divertido, especialmente após as suas horas iniciais, onde tudo é muito estranho porque inicialmente não é isso que o jogador quer que o game seja. Passado a estranheza e a aceitação de que não é um game das Tartarugas Ninja convencional, tudo melhora consideravelmente com o título.
Vale ou não vale?
Olha aí o maldito oito ou oitenta lá do primeiro parágrafo! Vale ou não vale a pena jogar Teenage Mutant Ninja Turtles Mutant in Manhattan? Vale “jogar” sim, mas… precisa comprar o game para isso? Aí não, não tem como, ao menos não sobre a perspectiva do mercado nacional de games. Infelizmente.
É por isso o papo inicial de que os tempos são diferentes. Sobre um olhar no passado eu gostaria muito de dizer que esse é um game que vale ir no final de semana em uma locadora para alugá-lo. Ver essa nova proposta da Platinum Games e no quão pirados eles foram em querer quebrar as regras do mundo dos games das Tartarugas Ninja.
Talvez alugando, jogando e conferindo por conta própria você até curtisse o game. Sei que eu curti. Joguei até mais do que achei que jogaria. Bati 7 horas de gameplay para virar sua campanha e ainda fui conferir outras coisas, como jogar alguns estágios novamente e testar o multiplayer online (que funciona e sem lags, mas não é tão divertido quando jogar no sofá com amigos, pode ter certeza).
O game tem boas ideias, mas é cercado de más decisões que comprometem e muito a qualidade como um todo. Gostei das batalhas de chefes, das missões aleatórias para cada estágio, do bom humor do game, dos inúmeros recursos de jogabilidade e outras surpresas que o game apresenta, como chefes surpresas (um segundo chefe aparece quando se está vencendo muito rápido o chefe do estágio) e dos colecionáveis serem uma galeria de capas das revistas das Tartarugas da IDW. Porém senti falta dessa coop local, de um pouco de linearidade tão constante em games clássicos da série e até mesmo daquelas fases em trilhos, como as de prancha dos arcades antigos. Há uma fase que introduz o Krangdoid que é muito bacana de pilotar, mas ele aparece em apenas um único estágio.
Bacana dizer que tal como todos os títulos da Platinum Games, Mutants in Manhattan apresenta diversos níveis de dificuldade. Bati o game em normal e na boa? Fiquei com muita vontade de bater tudo de novo em modo Hard e Super Hard, ainda mais porque as tartarugas subiram de level, estão com mais habilidades e mais fortes. Jogar tudo de novo me soou como uma experiência ainda melhor para o título, pois o level delas se mantém. Tive esse mesmo desejo há muitos anos com Viewtiful Joe, quando essa galera ainda estava na Clover Studios. Achei curioso como Mutants in Manhattan me instigou a jogar o game várias vezes. E eu poderia fazer isso no multiplayer online, pois a progressão de personagens serve para ambos os modos.
Percebe como o game meio que deu um nó na minha cabeça? Tenho consciência de que o título tem problemas, não é aquilo que eu gostaria de fosse, e mesmo assim me diverti jogando-o e ainda quero continuar jogando o danado! Essa talvez seja o poder mágico presente nos caras da Platinum Games. Até quando é ruim, eu quero jogar mais um pouco.
Como termino, então, este review? A melhor maneira é dizer que Mutants in Manhattan não vale o preço cobrado. Infelizmente mesmo. Dói no coração não poder dizer o contrário. Porém se você estiver morando em algum lugar onde ainda exista locadora, ou se tem um amigo que assoa o nariz com notas de cem e não se importa com o valor do game e compra de tudo, vá e teste o game sem ter que comprá-lo. Caso contrário vale ficar de olho em promoções futuras: se algum dia ver este game custando 100 patacas, vai fundo, pode comprar porque mesmo com seus altos e baixos, as tartarugas ninja ainda são personagens legais pra caramba.
Mais imagens!
na parte do “Dois problemas nacionais” cita várias vezes como o game sendo da Activision, e não da Platinum. Antes disso tinha uma palavra trocada que fica sem sentido, mas não lembro mais qual. Abs.
Então, aqui cabe uma explicação. Cito a Activision porque ela é a detentora dos direitos da franquia TMNT, ela contratou a Platinum. E caberia a Activision a decisão de colocar no orçamento do game a localização do título. E essa divisão da Activision, que trabalhar com franquias de licenças de marcas, contrata estúdios famosos e normalmente não localiza estes games para o português, independente do estúdio que trabalhou no título. Por isso responsabilizei ela e não a Platinum. 😉