Kingdom New Lands é um desses indie games que você senta para jogar 15 minutos e de repente passaram (!!) 3 horas ininterruptas. É sério. O impacto da experiência do game na primeira vez em que ele é colocado para rodar é realmente hipnótico, não tem como simplesmente parar de jogá-lo.
Por isso já o aviso de antemão: se resolver adquirir esse game após estas impressões, recomendo que separe pelo menos duas horas de calma e tranquilidade para testá-lo pela primeira vez, e não vá logo de cara olhar no You Tube para ver como fazer certas coisas ou descobrir de que servem outras coisas. Kingdom New Lands é um destes games que recompensam o jogador pela curiosidade, no prazer de descobrir algo que o game não lhe entrega mastigadinho.
Esse elemento é tão importante no game que para estas impressões irei tentar ao máximo explicar o game sem entregar spoilers sobre algumas de suas mecânicas ou surpresas. Realmente acredito que essa primeira experiência seja importante para apreciar o game de forma correta. Sendo que se alguém lhe contar e explicar mais do que o necessário isso pode tirar parte da graça da experiência do jogo.
Mas assim, claro que não vou deixar ninguém na mão também. Testou, jogou, curtiu e agora quer se especializar nas mecânicas e em tudo que o game tem a oferecer? Vale muito a pena dar uma espiada neste excelente guia (em inglês) criado por um usuário da Steam, com basicamente tudo que o game tem de básico, de complexo e até mesmo alguns de seus segredos (esteja avisado então a respeito de grandes spoilers).
Enfim, continuando, Kingdom New Lands, desenvolvido pelo estúdio Raw Fury Games, na verdade é uma versão definitiva e completa de Kingdom, lançado originalmente para PC em outubro do ano passado. New Lands chegou agora no começo de agosto para PC – quem tinha Kingdom recebeu o upgrade gratuitamente – e o título também fez a sua estreia no Xbox One. Gosto aliás do preço amigável do game, 29 reais na Xbox Store e 28 reais na Steam.
Acredito que não valha mais a pena ficar comparando a antiga versão de 2015 com o recém lançado New Lands. A antiga versão não está mais sendo comercializada, então ela ficou para trás. Basta saber que New Lands expandiu consideravelmente todo o sistema do game, trazendo como o nome diz, novas terras (ambientes) e uma tonelada de novos recursos que a velha versão não possuía.
O poder da coroa (não a perca!)
Kingdom New Lands é um jogo de gerenciamento e estratégia. O jogador começa com um rei, ou rainha, em um cavalo, sem reino. O jogo não explica muito, dá a entender que talvez seu personagem esteja fugindo de algum lugar, de alguma ameaça e agora precisa estabelecer um novo reino. Bem detalhes não importam nesse ponto, pois faz parte do mistério do game, que vai se revelando aos poucos certos aspectos, conforme o jogador consegue ir progredindo. De uma certa forma o game vai te contar um pouco, mas de uma forma indireta, deixando parte da interpretação para o próprio jogador.
Trata-se também de um game procedural, ou seja, cada New Game diversos elementos mudam. É um protagonista diferente, itens e construções se posicionam de forma diferente, inimigos podem mudar o local de onde surgem e até mesmo a estação e clima podem ser diferentes. Cada novo recomeço dá a sensação de que a sua estratégia precisa ser adaptada a forma como as coisas são disponibilizadas neste ambiente procedural. As vezes isso pode lhe ajudar e as vezes isso dificulta bastante as coisas.
Tendo isso em mente, cá está o jogador, com um cavalo e algumas moedas. Estabeleça um reino, o jogo lhe explica muito bem como, e aí você precisa de apenas duas coisas em um primeiro momento: expandir seu reino e sobreviver as noites de ataques de criaturas de trevas que saem de um portal a noite e que precisam correr de volta para o mesmo quando a luz do sol surge.
Há então essa pressão psicológica no jogador. O game tem ciclo de dias e noites. A cada noite em seu reino as criaturas surgem mais e mais poderosas e em maior quantidade, então todos os dias você precisa fortalecer mais e mais seu reino. É uma situação de cabo de guerra. A noite lutando contra as trevas, de dia reparando a destruição e se fortificando ainda mais.
A princípio é tudo bem tranquilo, os primeiros dias são de boa. Você sobrevive, porém a cada ciclo de 10 dias as coisas vão ficando cada vez mais e mais intensas. Novas criaturas surgem, incluindo algumas inesperadamente ameaçadoras.
Kingdom New Lands pode ter dois objetivos: sobreviva até onde puder, sendo que no Xbox One há uma conquista de sobreviver por 100 dias (eu apenas consegui 30 dias) ou fuja para outra ilha, daí vem o nome do novo subtítulo do game. Para fugir, além de gerenciar seu reino, é preciso investir na construção de uma embarcação, que leva tempo e recursos preciosos para ficar pronto. E quando o barco ficar pronto, cabe ao jogador ainda levá-lo para o porto, sendo que a qualquer momento isso pode acabar de uma forma terrivelmente errada!
Fugir então finaliza o game? Não! Seu rei (ou rainha) apenas chegam em uma nova terra, com alguns de seus súditos e o ciclo recomeça novamente. Estabeleça um reino, defenda-o e se prepare pois talvez em algum momento você precisará fugir dali. Ao todo há cinco ilhas. Cada ilha tem suas peculiaridades, não é apenas algo procedural, como cada recomeço do game. Elas possuem singularidades, ou seja, a segunda ilha nunca vai aparecer proceduralmente como a primeira ilha em um recomeço aleatório do game. Cada ilha trás novos recursos, novos itens e novas ameaças.
Não querendo entrar mais a fundo das mecânicas, mas preciso apenas explicar o básico. Como ganhar dinheiro? Mate animais contratando arqueiros, plante alimentos contratando fazendeiros, ou contrate um caixeiro viajante para lhe dar moedas diariamente – DICA: para isso não destrua a sua casa ao expandir seu reino. No começo do game, matar animais e depender do caixeiro são mais do que suficiente, porém conforme o game avança, os jardineiros são de extrema importância. Não os despreze por isso e os proteja o máximo que puder!
Com dinheiro, o jogo permite expandir o reino. Contrate mais arqueiros para defesa e mais artesãos, pois estes criam muralhas, casas, e estruturas que melhoram seu reino. Artesãos são também importantíssimos caso você pretenda fugir do reino, pois eles constroem e empurram o barco para o porto. Sem eles, seu reino não progride.
Além disso, como alertei lá no começo, Kingdom New Lands reserva algumas surpresas e mistérios. Há estátuas, animais diferentes, inimigos surpresas e alguns mistérios para explorar pelo game. Até onde algo pode ser expandido, para que servem algumas estruturas? O quão difícil as coisas vão sendo conforme os dias progridem? Até mesmo as estações climáticas interferem nas mecânicas do game. Existem surpresas e novas descobertas a cada momento e é algo recompensador descobrir isso aqui.
Um simples detalhe: basta uma única criatura se aproximar do jogador e tomar sua coroa para um Game Over na sua cara! Se um arqueiro não o pegar antes do Game Over aparecer na tela, sendo que são milissegundos para isso, já era! Não há segundas chances em New Lands! O jogador precisa recomeçar tudo novamente!
Vale ou não vale?
Kingdom New Lands é um delicioso game, mas talvez não seja para qualquer um. Há um forte elemento de frustração aqui, pois não é um jogo muito fácil. Perde-se basicamente as primeiras horas do game aprendendo a respeito de suas mecânicas e criando estratégias eficientes. E é um game de estratégia, então não há muito ação. Seus arqueiros combatem as criaturas sozinhos, enquanto você torce a distância para que as fortificações não sejam rompidas.
Descobrir as coisas no game é um dos grandes pontos positivos do mesmo, entretanto não consigo deixar de pensar que nem tudo é tão intuitivo quanto os desenvolvedores pensaram. Após algumas horas de game, deixei para trás isso para ir olhar no link que mencionei lá no começo desse texto, para aprender algumas coisas e pegar algumas dicas para poder conseguir progredir no game. Faz falta uma espécie de codex, que possa ser destravado conforme se progride no jogo, do tipo que me dê dicas e segredos sobre suas mecânicas.
Outra crítica que deve ser feita diz respeito a certas mecânicas de controle dos súditos do reino. Não posso mandar por exemplo os artesãos para longe das zonas de ataque das criaturas. Não posso nem mesmo pedir para todo mundo do reino subir na embarcação ao deixar uma ilha. Houve momentos em que senti as restrições da estrutura do game, não me deixando comandar tão livre assim meus súditos. O game talvez simplifique isso mais do que o necessário.
Outro exemplo: arqueiros em torres? Não posso mandá-los descer, mesmo que o ataque esteja acontecendo no outro lado do castelo! Aquele arqueiro na retaguarda não desce da torre onde não há ameaças, para que possa ajudar seus amigos no outro lado do castelo. O mesmo vale para os soldados de armaduras. Posso ter quatro deles, mas são dois de cada lado do castelo. Não consigo microgerenciar eles para ficar de um único lado ou atacar com tudo quando os inimigos virem a noite. Acho que nesse aspecto o game simplificou demais suas mecânicas.
Claro que são pequenos defeitos que não comprometem muito o todo. Pois mesmo assim o jogador consegue dar um jeito de se virar frente as restrições impostas. Isso não torna o game quebrado ou ruim. São apenas melhorias que poderiam, e deveriam, ser aplicadas para melhor performance do título.
Indo além, gosto da direção de arte do game. Não me canso de dizer aqui o quanto sou fã de jogos com pixelart, e Kingdom New Lands apresentam um trabalho de pixelart incrível. Repare no reflexo dos personagens e do reino no rio, nos efeitos de luz e sombra conforme os ciclo de dias vão acontecendo, até mesmo as estações climáticas são fenomenais, com efeitos de árvores secas, névoa, chuva e neve! É um jogo incrivelmente bonito.
Faço elogios também a trilha sonora. Como é um game que as vezes pode ser meio parado, com o jogador esperando o dia acabar ou os recursos renderem frutos, apenas parar e ficar apreciando o reino em desenvolvimento já é relaxante, enquanto a trilha sonora consegue criar uma imersão ideal para isso.
Como disse lá no começo, é um game com um preço honesto e que tem um esmero e um cuidado muito bom. Funciona mecanicamente, é bonito em sua direção de arte, além de apresentar uma proposta toda original e criativa. Não tive a oportunidade de jogar sua primeira versão, mas Kingdom New Lands soa como um game completo e conciso. Certamente vale apreciá-lo se você curte este estilo de jogo. E se não gostar, talvez valha a pena testá-lo, pois talvez descubra o quão ele divertido e quão acessível é a novos jogadores não habituados com o estilo.