A inspiração para criar a base de Bombslinger é óbvia: Bomberman, game do estúdio Hudson Soft, desde 2001 adquirido pela Konami. Um clássico que surgiu em 1983 e que até hoje continua ganhando de tempos em tempos novas versões. Talvez seja praticamente impossível que você nunca tenha ouvido falar de Bomberman. Não me prove o contrário, por favor.
Trata de um estilo de jogo mesclando estratégia com uma espécie de puzzle-maze. Este era um termo comum para diversos jogos criados nos anos 80. Basicamente eram labirintos de uma tela (essa limitação evoluiu anos depois). É diferente do side scrolling, onde o cenário progride, quase sempre horizontalmente, sem quebras de transição. Pac Man também é um bom exemplo de um clássico de puzzle-maze.
Seja Bomberman, seja Bombslinger, o objetivo principal do jogador é progredir por meio de um labirinto. Visualizado pelo jogador por uma câmera isométrica. Usando bombas para quebrar barreiras que bloqueiam o avanço. Inimigos estão pelo caminho e precisam ser derrotados, pois o jogador sequer pode encostar nestes.
Há também power-ups que potencializam tanto o número de bombas que o jogador pode colocar no cenário, quanto o potencial de seu raio de explosão. Entre outras habilidades especiais, como chutar bombas, pular bloqueios, bombas de poder extremo etc. Ambos os jogos possuem pontos como estes em comum.
Talvez hajam outras semelhanças, mas é olhando para as diferenças que Bombslinger acaba se tornando mais atraente.
Vingança explosiva
A história de Bombslinger, apesar de simplória, é eficiente para dar o tom da aventura e roupagem do game. O protagonista é um cara que no passado pertencia a uma gangue de bandidos do velho oeste e que ao se aposentar se tornou um fazendeiro. Sua velha gangue um dia bota fogo em sua fazendo e acaba assassinando sua esposa. Assim o fazendeiro, que no passado era conhecido como Bombslinger volta à ativa. Querendo o sangue de toda sua antiga gangue, para assim vingar a morte da esposa.
Como disse, simples podem efetivo. É desculpa mais do que suficiente para que o jogador controle um cowboy que tem ótimas habilidades com explosivos, nesse caso, bombas.
O objetivo do título é que o jogador progrida por quatro ambientes, onde cada um funciona como um emaranhado de salas e labirintos. Até encontrar a sala que dá para o chefe do mundo. Vencido, hora de ir para o próximo ambiente.
O grande revés aqui é o sistema procedural, que coloca Bombslinger na categoria de jogos roguelike. Todo começo é diferente. Todos os labirintos são procedurais. Todos os itens são aleatórios. E todos os inimigos, ainda que os mundos tenham alguns exclusivos, se misturam entre as diversas telas do jogo. Tudo é ao acaso.
Significa que morrer, antes de chegar ao final do game é mais comum do que alguém possa imaginar. Também significa que morrer é Game Over. O jogador tem que começar o jogo todo novamente. A morte é permanente aqui, exceto quando se encontra um raro item que lhe permite ressuscitar uma única vez. Mas é um item de baú raro.
Melhor a cada derrota
Por ser um roguelike, isso também quer dizer que a cada Game Over, o jogador vai começar mais experiente e dependente de como for a rodada perdida, com melhores opções para iniciar um novo game.
Não há um sistema de progressão por nível, mas há um sistema de missões que funcionam como conquistas. Ao serem realizadas, as mesmas destravam itens. E estes podem ser equipados no loadout antes do jogo começar. Inicialmente é possível usar dois itens especiais, mas conforme missões são completadas, o slot de item para se equipar pode se expandir para até cinco.
Dentre os itens há corações extras, o que é útil em um game de morte permanente. Há possibilidade de iniciar com bombas extras ou poder de explosão maior. Também acho muito útil começa com um status de velocidade maior, perfeito para andar ligeirinho pelo labirinto.
Alguns destes itens aprimoram alguns dos status fixos do personagem. Sorte, por exemplo. Expandir a sorte significa ter melhores chances de conseguir itens mais raros em baús. Aumentar o Espírito ou sua recuperação faz melhorar a forma como o jogador usa itens especiais e secundários durante o gameplay.
Enfim, esse é outro ponto, que somado ao formato aleatório como os labirintos são criados é que torna cada novo começo em Bombslinger único e impressionantemente divertido. Testar combinações e ir equipando novos itens encontrados ao longo do game deixam as mecânicas com o protagonista diferente em cada rodada.
Nem tudo se resolve com bombas
Dessa história com o loadout inicial, para equipar itens, e dos próprios itens que o jogador pode conseguir temporariamente enquanto está em uma partida, há os que permitem atacar os inimigos de uma forma diferente do que apenas encurralá-los com bombas.
Estamos no Velho Oeste, então seria estranho não ter armas de fogo. Então obviamente há! Os inimigos mesmo não utilizam bombas. Há aqueles que atiram com espingardas ou revolveres. Os que jogam coquetéis molotov que podem ser arremessados por cima das barreiras. E também os xamãs que podem invocar trovões.
Muitos inimigos conseguem atacar a distância. Alguns explodem suas bombas a distância. Isso para não mencionar os animais, como cabras e javalis que chutam suas bombas para longe. Ou lobos que pulam arbustos e bombas em direção ao jogador. Há também um caçador safado que coloca armadilhas de urso por onde ele passa.
Com um misto tão diferente de personagens, dar ao jogador apenas o uso de bombas poderia limitar a experiência de combate. Então o jogador também tem algumas artimanhas muito boas. Quando encontradas em baús, e durante cada uma das rodadas.
Cambalhotas para desviar de tiros, armas para atacar de longe, bombas que seguem o inimigo, ou a habilidade de chutá-las até eles. Estão são algumas das muitas outras opções que existem no jogo. Gostei em particular da habilidade atirar molotovs horizontalmente ou verticalmente por todo o cenário e também dos trovões em três alvos.
O balanceamento destas habilidades, para não serem apelonas demais, é que todos gastam sua barra de espírito. Que já é muito baixa, mas que há itens que podem aumentá-la ou fazer que estas habilidades usem menos pontos dessa barra. Essa barra de espírito pode se regenerar com o tempo ou então com a coleta de chamas azuis deixadas por inimigos derrotados.
Bons labirintos
Algo que me agradou bastante em Bombslinger foi o design dos labirintos apresentado em seus quatro ambientes. Somado a uma bela pixel art, diga-se de passagem.
O interessante é que os labirintos não seguem somente a fórmula clássica de Bomberman, apenas em uma tela e totalmente quadrados. Aqui estes cenários assumem diversas formas, como podem ser vistas nas imagens que ilustram essa postagem.
Em muitos casos há bloqueios intransponíveis dentro do labirinto, representados por porções de terras ou pequenas lagoas. E em outros casos há pontos ou caminhos que fogem do sistema convencional de toda esquina ter quatro direção. Pontes, por exemplo, são posicionadas em cima de lagos. Servem como corta caminhos, mas há também inimigos que transitam por elas.
O design destes cenários também não obedecem a transição tela a tela. Em muitos o jogador precisa subir ou descer pela área. Para ver quais outros inimigos precisam ser eliminados ou baús para serem coletados. E essa transição representa uma sala dentro do labirinto, onde cada mundo tem diversas posicionadas proceduralmente. Cabendo ao jogador encontrar a sala até o chefão.
Ótimas batalhas de chefes
Chefes também são outro ponto a se elogiar. Há sete ao todo, encontrados também de forma aleatória ao final de cada um dos três ambientes iniciais. No último, um cenário que representa uma área de montanhas congeladas, o chefe final é sempre o mesmo.
O primeiro chefe também tende a ser quase sempre o mesmo, uma cabra com a cabeça em chamas. Apesar de que teve algumas vezes em que isso não ocorreu, mas é bem menos frequente. Sendo assim os outros cinco chefes restantes acabam sempre se revezando entre os mundo 2 e 3 do game. Em uma rodada até o fim não é possível derrotar todos.
São boas batalhas. Cada um dos chefes tem ataques e se movem de forma diferente. Alguns quebram as regras de como se mover pelo labirinto. Outros precisam se atacados em momentos específicos. E todos tem uma barra de saúde, o que significa que são vários ataques bem sucedidos até enfim derrotá-los.
É muito comum morrer nestes confrontos. Pois são inimigos pensados para causar dano à saúde do jogador, aqui representado por clássicos corações. O jogo começa sempre com dois corações, mas conforme novos itens para se equipar se destravam ou o nível do jogador sobe durante a partida, novos podem ser adicionados.
Nesse ponto volta a lógica do que o jogador deve fazer. Melhorar seu ataque, sua barra de energia para especiais ou mais corações para aguentar melhor danos causados por inimigos bom em lhe acertar ou chefes que possuem um amplo raio de ataque.
Vale ou não vale?
Bombslinger de cara me impressionou e cumpriu expectativas que tinha para o jogo. Não é a primeira vez que testo um indie game que tem influência de Bomberman. No passado, tive alguns títulos assim testados que não me impressionaram. Alguns até se provarem bem ruins, a ponto de sequer mereceram impressões aqui no site. Bombslinger fugiu, felizmente, desse infortúnio.
Não comentei, mas é válido confirmar: existe um modo multiplayer. E aí funciona de forma mais tradicional. Até quatro jogadores localmente explodindo um labirinto para se encontrarem e eliminarem uns aos outros. Vitória para o último que ficar em pé. Power-ups da campanha são encontrados explodindo obstáculo-los. Tal qual o clássico Bomberman.
-
Tropeço na longevidade
Claro, que isso não o isenta de alguns problemas ou críticas. A principal é que trata-se de um jogo muito curto. Tanto que existe uma conquista para encerrá-lo em menos de 45 minutos. Algo que consigui executar na segunda vez que fechei o game.
Há uma diversidade boa de inimigos, de chefes, mas não de ambientes e labirintos. Cada mundo tem algo em torno de 8 a 10 salas. Mas não é preciso visitar todas. Apenas encontrar o caminho que leva até a porta do chefe do mundo. Claro que conforme mais rápido se progride, menos baús são encontrados e menos nível o jogador consegue atingir. Porém dependendo da sorte é possível chegar ao fim com os poucos itens equipados e encontrados em um gameplay acelerado.
Na minha opinião o game deveria ter, no mínimo, mais três ou quatro mundos. Antes do final do jogo. Se não nesse modo tradicional, ao menos em um Nem Game+ após vencê-lo pela primeira vez. Ou até mesmo uma modalidade infinita, gerando proceduralmente os ambientes e labirintos a cada tela vencida.
Porém, sendo justo, é um jogo independente de 24 reais (sem estar em promoção). Vale seu preço e seu conteúdo. Se tivesse mais coisas, certamente custaria mais. Ainda que acredite que talvez valesse a pena ser mais caro e ter mais opções por conta disso.
-
Finalizando
Uma coisa é certa, mesmo curtinho, as primeiras partidas são planejadas para impedir que o jogador feche o game logo de cara. Morrer nas primeiras rodadas é normal. Chegou ao ponto de me fazer ficar preocupado de que não conseguiria progredir pelo game. Até conhecer melhor os itens e opções que poderia equipar antes da rodada e de sorte de outros itens aleatórios encontrados durante o jogo.
Vale por é um jogo com um preço honesto. Que não promete mais do que pode cumprir. Apresenta uma reinvenção de um clássico, pontuado à sua própria ideia. Não é uma cópia. Não é frustrante e mesmo uma vez terminado, ainda dá vontade de jogar novamente. E cumpre a meta de ser um roguelike e parecer diferente a cada novo início.
É um título que se a Mode4, desenvolvedora responsável, conseguisse eventualmente lançar uma expansão com novos mundos, novos modos ou inimigos, ou quem sabe até mesmo uma sequência, com certeza gostaria de conferir esse material. Daria vontade de retornar a esse Velho Oeste de bombas e cabras com chifres em chamas!