Terminei recentemente a leitura de Leviatã Desperta. Primeiro livro de uma saga enorme que está sendo desenvolvido por James S. A. Corey. Talvez seja mais fácil reconhecer a obra pelo nome do seriado norte-americano, produzido pelo canal Syfy, chamado The Expanse. Série que aqui no Brasil está disponível no catálogo da Netflix.
O livro é o primeiro de sete já publicados lá fora. Com o oitavo previsto para sair nos Estados Unidos no final de 2018. E um nono já planejado para 2019. Leviatã Desperta chegou ao Brasil em junho do ano passado, pelas mãos da Editora Aleph, especialista em ficção científica em nosso mercado editorial.
Ah e um dado interessante, que vale como curiosidade: James S. A. Corey é um pseudônimo. Os verdadeiros autores dessa série de livros são dos escritores Daniel Abraham e Ty Franck, que trabalham e escrevem juntos para dar vida a saga. Cada um intercalando os capítulos da obra. Usando a perspectiva do personagem protagonista de cada capítulos. “Como é?“. Calma que já vou explicar isso com detalhes, já que é um dos pontos altos da obra.
Mas antes preciso desabafar e dizer: Leviatã Desperta é um livro grande. Assustadoramente grande para ser sincero. Interrompi sua leitura muitas vezes. Acho que foram três ou quatros janelas intercalando períodos de leitura dele com outras obras. São aproximadamente 660 páginas de história. Bastante coisa.
Não que o tamanho seja um problema. Houve um ponto real da leitura em que achei que o livro acabaria não me entregando um bom final, especialmente depois de um evento que ocorre na metade da obra. Felizmente o final fez o que deveria fazer: me deixou animado e com coragem para encarar, quando for lançado, o próximo livro da saga, que tem cerca de 50 páginas a mais em relação a este aqui.
Do que se trata?
Este é um texto sem spoilers. É importante dizer isso, pois descobrir exatamente do que se trata Leviatã Desperta é exatamente um dos motes principais que leva o leitor a querer avançar pela trama. Então é claro que não vou lhe entregar isso. Mas posso instigar. Tal como a ponto inicial da história o faz.
É um livro de ficção científica espacial, isso dá para tirar logo de cara em suas primeiras páginas. Estamos em um futuro que não é aquele absurdo de um Star Wars, com dobras espaciais, milhões de extraterrestres e mundos infinitos para viajar. Leviatã Desperta é um pouco menos futurista nesse sentido. A humanidade já consegue viajar pelo espaço, mas ainda estamos rodando nosso próprio sistema solar.
Colonizamos a Lua e Marte. Coletamos água dos anéis de Saturno. E grandes estações espaciais, que ficam nestas rotas espaciais, são possíveis de existir. Ao ponto de pessoas nascerem, crescerem, se reproduzirem e morrerem ali. Há seres humanos nascendo nestas colônias espaciais. Humanos que possuem traços diferentes daqueles que vivem na Terra. São mais altos, possuem a estrutura dos ossos diferentes, assim como a resistência no espaço e afins. Os detalhes você pega lendo o livro.
A história narra o ponto de vista de dois personagens: James Holden e Josephus Miller. Simplificando os nomes: Holden e Miller. Holden é um oficial de um grande cargueiro espacial, nave que leva água dos anéis de Saturno para outros locais do sistema, como a Estação Ceres. Miller é um detetive de Ceres, mantendo a ordem e paz na estação, ou tenta ao menos. Cuida de pequenas revoltas populares e investiga casos mais graves, como homicídios.
Leviatã Desperta trabalha com estes dois como protagonistas. Cada um protagonizando sua própria trama, separada e intercalada por capítulos. Viu? Eu disse que explicaria isso.
Holden e Miller
Inicialmente o leitor da obra se vê dividido então em dois enredos. Miller vivendo sua vida de policial, um tanto infeliz, em Ceres, enquanto Holden se vê as voltas com um estranho e misterioso náufrago espacial. As tramas, inicialmente não se conectam. Propositalmente é claro.
É por isso que é muito difícil entender no começo o que a obra realmente quer do leitor. Qual é o plot principal? Para onde essa trama quer exatamente levar o leitor? Isso só vai realmente ficar claro lá pelo meio da obra. Não cabe a mim estragar essa surpresa nesse texto de indicação.
O prólogo e o epílogo do livro são os únicos pontos em que os capítulos não possuem os dizeres “Holden” e “Miller” abaixo de sua indicação numérica. Técnica perfeita para deixar claro ao leitor de quem é a perspectiva ali. O prólogo abre com uma personagem chamada Julie, enquanto que o epílogo… bem, não cabe a você descobrir por aqui. Desculpe!
Quem é Julie? Ótima pergunta. Esse é o questionamento inicial que o livro dá ao leitor. Fica claro que ela está em uma nave no espaço sofrendo algum tipo de ataque espacial. Piratas? Alienígenas? Piratas Alienígenas? Nada fica claro nesse ponto. Apenas que Julie é a sobrevivente da nave Scopuli. Ainda presa lá com alguma coisa terrível e assustadora. Esta é a nave e Julie a personagem que dará ponto de partida para algo que ninguém jamais esperaria. Seja o leitor, sejam os demais personagens da obra.
Quente e frio
Posso dizer que logo que percebi que o livro estava dividindo sua história em dois personagens e em duas tramas centrais achei isso sensacional. Diferente e divertido. Porém essa sensação meio que passa após alguns momentos e capítulos iniciais.
Isso se dá porque a trama envolvendo Holden no começo da obra é muito emergencial, muito mais surpreendente. A nave na qual ele trabalha é quem recebe o sinal de socorro da nave de Julie. Ele e um pequeno grupo de pessoas são enviados para a estranha nave. Mas nada disso é resolvido em um único capítulo.
Significa que a todo momento esse ponto inicial da história fica quebrando para a história de Miller, que ainda não tem nada a ver com o que está acontecendo com Holden. Miller está lidando com militantes de uma organização chamada APE, colocando ordem em uma estação espacial que ainda não tem qualquer relevância a trama. Apesar de não ser ruim esse lado inicial da história de Miller, pra mim ela demora a engatar e a ficar realmente interessante, enquanto a trama de Holden estava de me tirar o fôlego.
Felizmente essa abordagem do livro, que meio que dá temperaturas diferentes para a obra como um todo, não dura suas mais de seiscentas páginas. Logo a trama de Miller muda e fica tão interessante quanto a de Holden. Especialmente quando os elementos de detetives e paranoia começam a ficar mais evidenciado em torno de Miller.
Diria que um quarto do livro apenas tem esse problema de um lado da história estar melhor do que o outro. Assim que as coisas engatam, elas não mais saem de sintonia. E aí essa abordagem, dois contos, dois protagonistas, volta a ficar bacana.
Um livro que poderia ser dois
Colocado esse pequeno contexto sobre o que Leviatã Desperta é inicialmente, acho que outro ponto válido para se comentar é sobre seu tamanho. O quanto a história ensaia coisas, mas demora bastante tempo para chegar a certos lugares.
Leviatã Desperta é um livro que ao chegar em um clímax em sua metade, e sim há isso nele, me deixou encucado com o que viria à seguir. Hoje, sabendo que ele é uma série de livros (pois o comecei a ler sem ter me tocado disso), acredito que ele poderia facilmente ser dividido em dois livros.
Este evento, em sua metade, envolvendo uma estação espacial chamada Eros e uma fuga quase que impossível dela que é uma das coisas mais incríveis da obra. Eu li todo esse segmento de uma só vez. Prendendo a respiração e gritando mentalmente com os personagens. “Saiam daí, corram!”. Pensando justamente quem morreria e quem sobreviveria.
A conclusão desse ponto da trama pra mim seria um final quase que perfeito. Deixaria um gancho do tamanho da lua para o segundo livro, e livros seriados são assim mesmo.
O que vem a seguir na obra, após esse clímax de meio, tem aquela pontinha de arco inicial. Demora a se desenvolver, a dar um rumo. Não se desenvolve como, por exemplo, um terceiro ato de um filme. Ele caminha para um novo arco de contexto para depois puxar um terceiro ato final. Livros grandes tem disso às vezes. Não acho ruim, mas nem sempre fico empolgadão.
O que achei? (sem spoilers)
Leviatã Desperta é realmente um puta space opera, como diz a citação na capa por George R. R. Martin. É diferente da narrativa de um John Scalzi em livros como Guerra do Velho e Encurralados. Scalzi é um autor que vai direto no ponto, diferente do que acontece aqui na obra de James S. A. Corey. Aqui há propositalmente esse ensaio mais detalhista.
Não que achei ruim, mas – como disse lá no começo – foi um livro que pausei sua leitura em vários momentos da minha rotina. Fui ler outras obras antes de dar continuidade em cada uma destas pausas. Não que tenha estragado a experiência. Acho que foi até para melhor. Me deu mais tempo para saborear esse universo e seus personagens.
Finalizando (com mínimos spoilers)
Gosto quando o livro cria momentos de risco de vida e morte de personagens. Há momentos realmente tensos na trama. E o drama inicial de Holden é muito crível (e cruel). E antes que o leitor perceba, você compra totalmente o carisma por toda a tripulação que fica com Holden por todo o livro. Há o risco de morte em diversos momentos da obra. Acaba sendo um elemento importante para te deixar temeroso por alguns destes personagens.
Achei sensacional o ponto de virada perto do final do livro, quando me peguei me importando muito mais com Miller e dando razões a ele do que para Holden, que começa a obra como o protagonista a qual o leitor tem que gostar. Claro que essa é uma perspectiva muito mais pessoal, vai de cada um que for ler a obra. Pra mim foi assim.
Miller é um personagem que começa de um jeito e evolui muitíssimo bem no decorrer da história. Há questionamentos legítimos para alguns de seus atos que abrem excelentes discussões entre aqueles que leram a obra. Isso é muito legal, ainda que esperado de um personagem com essa veia de detetive desgarrado.
Não dei muita trela para o pano de fundo da história, que envolvem uma guerra entre Terra e Marte. Fiquei com aquela sensação de que esse plot é inserido na trama como plano para sequência. “Saiba que isso está acontecendo, mas não vamos explorar isso aqui”. Algo assim, sabe? Mas gostei do perigo que ronda o livro e que o leitor só vai entender o que é muito mais à frente da leitura. Isso foi fantástico.
Vale a pena ler?
Sem dúvida alguma. É um livro excelente para fãs de ficção científicas. É bacana no contexto de humanos vivendo no espaço sideral, da rotina dentro de naves espaciais, de batalhas no espaço e até mesmo da distância que percorrem entre ponto A e ponto B. É muito legal como a obra brinca a todo tempo com força de aceleração que aumenta a pressão gravitacional das pessoas dentro da nave. Isso não é algo que me lembro de outras obras de ficção trabalhar como é trabalhado aqui.
A trama é divertida e os personagens são muito bem trabalhados. O leitor ganha fácil a simpatia por todos eles, ainda que Miller seja o último da fila. A enigmática ameaça, o bicho papão que ninguém sabe o que é, como é, o que quer, é um quebra cabeça muito bem planejado para a trama. E deixa o leitor no suspense e arrepiado quanto mais se descobre a seu respeito.
O ponto negativo, se é que dá para chamar disso, é que não é uma obra de um livro apenas. A trama chega a alguma conclusão aqui, mas claramente existem pontos deixados para serem trabalhados nos próximos livros. É um livro em que seu universo não se resolve aqui. Sua trama há de se expandir e o leitor tem a vontade de querer continuar acompanhando. É um senhor livrão, mas nem um pouco cansativo se lido com uma boa dosagem e moderação.
E sendo justo, nem há porque ter pressa. Está nos planos da Aleph lançar o segundo livro, possivelmente ainda em 2018. Porém lá fora tem sido publicado um por ano. Tempo o suficiente para ler o tijolão e ainda ficar empolgado para o próximo!
Onde comprar?
Melhor loja atualmente para adquirir livro no Brasil é, sem dúvida alguma, a Amazon. Lá tem a versão com o livro físico e com o e-book (que tem um preço mais convidativo). Vale a pena conferir o preço lá na loja. Fica aqui a indicação.