Há jogos que mandam muito bem relação as impressões iniciais recebidas pelo jogador. Meio que superam expectativas assim. Impact Winter é um destes games pra mim. Isso ocorre por meio do fato de que existem tantos games de sobrevivência nesta geração que é difícil se impressionar com grande parte daquilo que é atualmente lançado. E Impact Winter conseguiu me dar algo diferente.
Talvez não uma experiência inovadora, mas exatamente o contrário. É um título que olha mais para como os jogos eram no passado do que como eles são atualmente. Explico: existem muitos jogos de sobrevivência que se utilizam de recursos procedurais para oferecer ao jogador um gameplay diferente a cada novo início. Morrer com frequência é um elemento comum ao gênero. Impact Winter não isso. Faz tudo ao contrário.
A proposta é sobreviver por 30 dias do relógio interno do jogo, algo como 1 hora a cada 1 minuto do tempo real. Assim um dia do jogo dura cerca de 24 minutos. Significa que 30 dias do jogo equivale a 12 horas de gameplay/campanha.
A constância de morrer com regularidade também não faz parte da proposta do jogo. Tanto que se ocorrer do jogador morrer sua morte não é permanente. Se por ventura isso vier a acontecer o jogo carrega um save point anterior a morte ocasionada. Não sendo obrigatório recomeçar tudo novamente.
Claro que não significa que coisas não sejam perdidas de forma permanente no game. Há missões e eventos que não ficam ativas por todo o tempo da campanha, enquanto há quatro companheiros que o jogador precisa ajudar a sobreviver, pois estes podem morrer e não mais retornarem.
Frio apocalíptico
Em Impact Winter o mundo sofreu um colapso completo ao ser alvo de um enorme asteroide que se chocou contra o nosso planeta. Apesar da humanidade não ter sido extinta por completo a perda de vidas foi significativa. Ao fim poucos sobreviveram, e agora enfrentam um agressivo inverno permanente.
O jogo narra a história de um grupo de cinco sobreviventes que se isolaram dentro de uma velha igreja. A trama começa quando um estranho robô é encontrado pelo grupo. Um dos sobreviventes consegue conserta-lo. Ao fazer isso houve-se a mensagem dizendo que em 30 dias o resgate chegará.
Quem virá resgatá-los? O que é esse estranho robô? Estas respostas apenas serão respondidas ao final do jogo, quando se atingir a meta de 30 dias. Todo o contexto do universo retratado no game só é bem explicado quando se encerra sua aventura. E é um bom final na minha opinião. Dá até um gostinho de desejar outro game posterior aos eventos do final do título.
Sobreviva em grupo
O jogador tem controle apenas sobre um dos sobreviventes, aquele que se chama Jacob. Aos demais, dá se a capacidade de comandar pequenas atribuições e tarefas. Estes sobreviventes do grupo de Jacob também são responsáveis, cada um, por determinar um caminho de missão de história, deixando o jogador com quatro campanhas para se lidar simultaneamente dentro do tempo estipulado para o resgate.
Mas não se desespere se não conseguir lidar com todas ao mesmo tempo. O normal é fazer um pouco de cada, pois estas missões de história liberam novos recursos, novas ferramentas e mecânicas de jogo para o jogador explorar mais longe o mundo do game. É meio difícil se focar apenas em uma e ignorar as demais.
São quatro aventuras. Uma que envolve aprender novas receitas e fórmulas médicas para que a saúde e alimentação do grupo. Uma para ensinar Jacob a criar armadilhas e caçar animais de médio e grande porte, chegando até mesmo a lhe deixar cara a cara com um urso selvagem. Outra vai lhe ensinar a proteger melhor a igreja que serve como abrigo, como mantê-la quente ou com um sistema que irá recolher água potável da chuva, além de defendê-la contra intrusos. A última histórica envolve criar recursos tecnológicos que aprimoram o robô que lhe acompanha ao longo da aventura, aprimorando seu radar, sua mochila entre outros recursos úteis para explorar o mundo do game.
Em meio a esse jogo de cintura com as missões de história, o jogador encontrará outras missões secundárias explorando o mundo do game. São missões que não agrega muito valor, mas oferecem provisões que são necessárias para lhe deixar Jacob e seu grupo alimentados, hidratados e aquecidos do inverno apocalíptico.
Saia para explorar
Quanto ao mundo do jogo, este é um de seus pontos mais interessantes. Trata-se de um game de mundo aberto, então há a liberdade para o jogador explorar de forma não linear o mundo externo. Vá para onde quiser, em qualquer direção desejada.
Nem tudo é acessível para se explorar no início. O jogador pode congelar lá fora, pode morrer de fome ou sede se não encontrar provisões. Pode sangrar até morrer se for atacado e não tiver curativos. Há fendas, locais fechados e cercas e picos que o jogador deve aprender, por meio de missões de história, habilidades para conseguir atravessar.
Mas é esse equilíbrio entre acessibilidade e limitação do mundo aberto que dá ao jogador um sentimento de progressão quando se está explorando seu mundo. É realmente satisfatório quando se encontra um novo prédio para se vasculhar, estando realmente longe da igreja.
Ao explorar o mundo externo, indo atrás de missões principais, o jogo lhe indica a direção a seguir, mas nem sempre o caminho em linha reta é o mais curto, pois existem bloqueios e fendas que dividem a região ao redor da igreja.
Colete provisões e cuide de seus companheiros
No geral Impact Winter consiste em dominar esse ambiente e estas regras. O jogador deve vasculhar o mundo atrás de provisões e ferramentas que cumprem as metas das missões, enquanto fica atento aos seus indicadores de fome, saúde, frio e afins. Além ter de levar parte de tudo que se encontra para a Igreja, pois seus companheiros possuem os mesmos indicadores para sobreviverem.
Havendo provisões, seus companheiros normalmente não morrem de fome ou sede, mas é preciso atenção, pois há momentos em que é preciso dividir e distribuir estes recursos dentro da igreja para garantir que seus companheiros estão de fato se alimentando e se hidratando.
Mais urgente do que as provisões, é a fogueira dentro da igreja. O frio acaba sendo o maior inimigo do game, pois provisões até que se consegue de forma bem tranquila ao longo da campanha, com raros momentos de sufoco. Já conseguir lenha e coisas para queimar no fogo muitas vezes ficam no limite do estoque. Foi algo que me deixou preocupado varias vezes. Principalmente em um momento perto do meio ao fim do game quando o frio se intensifica e a fogueira começa a se extinguir mais rapidamente.
Ao se colocar combustível e lenha na fogueira o jogo lhe avisa por quanto tempo ela deve queimar. Estando 100% alimentada, o jogo indica quanto tempo ela ficará acessa, normalmente entre 18 a 22 minutos até se apagar por completo. Apagando os companheiros não morrem de imediato, mas o indicador de saúde começar a cair perigosamente. E só o jogador pode alimentar a fogueira. Mesmo que haja lenha no estoque, seus companheiros não adicionam mais combustível ao fogo. Isso lhe faz sempre ter que retornar à igreja de tempos em tempos.
Ameaças comuns
O mundo de Impact Winter oferece muitas áreas para se vasculhar. Edifícios são o mais comum, mas há também cavernas e enormes buracos de impacto de asteroides. Áreas onde o indicador de gelo é agressivo e o jogador congela rapidamente se ficar nestes pontos por muito tempo.
Não há muitas ameaças ao mundo exterior. Lobos são o mais comum. E mesmo assim eles são apenas um perigo se o jogador se aproximar demais deles. Apesar de precisar usar com muita frequência, o jogador pode encontrar armas de fogo e arco e flechas para se defender destas ameaças da fauna do game. Mas carregar estes equipamentos ocupam um senhor espaço em seu inventário.
Sobreviventes não oferecem ameaças, apesar de que a igreja é sempre invadida quando o jogador não está lá. Nisso provisões são roubadas e companheiros são feridos. Mas ao explorar o mundo externo, o jogador vai encontrar sobreviventes pedindo ajuda, nunca para lhe atacar. Ao menos isso nunca me aconteceu.
Impact Winter tem um sistema de crafting (construir coisas), mas isso é um mecanismo que o jogador apenas delega aos seus companheiros dentro da Igreja, Fazendo com que eles construam melhorias para o abrigo, assim como receitas e armas que o jogador deve usar para avançar na história. Coletar itens para construir e cumprir estas metas de melhorias é um dos maiores desafios do jogo.
Pontos negativos
Falei bastante sobre as mecânicas e regras gerais de Impact Winter. Fiz isso porque acho que é exatamente a proposta e como tudo ao seu redor tem uma boa consistência que torna o game tão interessante e divertido de se jogar.
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Sem localização em português
Não significa que o título não é isento de problemas. Há diversos deles e nem tudo me agrada. E é preciso apontar alguns, como a falta de localização em nosso idioma. O jogo esta todo em inglês e é uma barreira para quem não tem domínio do idioma.
Dá para jogar sem entender, a interface tem certa intuição universal de jogos de videogame, mas certamente não entender nomes de itens ou regras das mecânicas de construção de ferramentas pode atrapalhar alguns jogadores.
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Mapa ruim
A parte de localização do mapa do game também é bem incômoda. O jogador não pode marcar pontos e locais de interesse, assim como vira e mexe me vi perdendo tempo em fendas e locais sem acesso simplesmente porque a localização no mundo do game pode ser bem confusa. Mesmo quando a missão principal lhe indica uma direção.
Eu entendo a proposta da sensação de se sentir perdido em um mar de neve por toda a parte, mas repetir a experiência por trilhas já exploradas não é tão legal quando se está correndo contra o tempo. Um melhor mapa, que fosse atualizado conforme o avançar da exploração, ajudaria muito a experiência de explorar todo o mundo do jogo.
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Pequenos bugs
Também topei com alguns bugs inesperados enquanto jogava a campanha principal. Locais que perdiam seus itens quando se saia e voltava ao game, e itens tidos como comuns que desapareciam do mundo do jogo.
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Itens que não se tornam outros itens
Há também alguns recursos mal planejados, como um sistema onde o jogador precisa encontrar garrafas de água vazias para usar no depósito de água da igreja. Até aí tudo bem, mas garrafas de água cheia não se transformam em garrafas vazias quando se consomem a água delas. Não me parece uma escolha de desenvolvimento inteligente isso.
Nesse sentido passei por um aperto horrível para encontrar uma lata vazia no mundo do game para criar uma espécie de radar. Sendo que meu inventário estava repleto de latas cheias de comida, que ao serem consumidas não se revertiam em latas vazias. Impact Winter não sabe reciclar seus itens, tornando-os reutilizeis para novos fins.
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Ausência de um New Game+
Um outro ponto que lamentei não existir é um New Game+ para pode jogar uma nova campanha com habilidades e classes que o jogador destrava enquanto joga a campanha pela primeira vez.
Estas classes são utilizadas para criar comandos para seus companheiros da igreja. Fazer eles cuidarem melhor da fogueira, vasculharem o mundo externo atrás de combustíveis e provisões, proteger melhor a igreja e construir coisas mais rápidas. Isso abre de forma bem lenta na progressão do jogo, tornando as últimas horas da campanha muito mais ágeis do que seu início. Eles se tornam mais independentes ao fim.
Queria muito um New Game+ justamente com esse recurso de torná-los mais independentes e úteis desde o começo. Para me dar mais liberdade para explorar mais longe de seu mundo, sem me preocupar demais com eles. Voltar cada vez menos a Igreja e sobreviver por mais tempo no mundo externo.
Ao terminar o game, só me restou começá-lo tudo novamente. Do zero completo. E seu mundo não é procedural. Tudo retorna exatamente como se espera, o que é bom, mas como o mapa não aponta nada para o jogador, muitos locais é preciso encontrar tudo de novo. O valor de replay existe apenas para refazer tudo de novo, e se forçar em missões de histórias que não deu tempo ao final da campanha.
Porque sim, o jogo termina tendo completado todas as histórias do sobrevivente ou não. Mesmo que somente Jacob sobreviva.
Considerações finais
Impact Winter é um ótimo jogo. Tem boas ideias e tem uma proposta que prende o jogador que gosta de explorar mundos de forma livre. Seu sistema de sobrevivência não é agressivo como outros títulos do gênero, que possuem o ímpeto de matar o jogador para dar valor de replay e longevidade a eles.
Porém nem tudo são flores. Sua interface não é das mais fáceis de se entender, a ausência de localização só piora isso. Há bugs e mecânicas que sofrem com a falta de um pequeno refinamento. A desconstrução de itens ou a reciclagens deles seria muito bem vindo, assim como a chance de marcar pontos no mapa.
Gostaria muito de poder jogar o título em uma nova campanha, transportando coisas úteis que são destravados no primeiro gameplay. Ou até mesmo um modo sem um tempo cravado no relógio para o resgate. Isso é sentido e pesa para baixo o valor de replay do game.
O que me agradou no título foi como ele dá alguns passos para atrás nesse gênero de sobrevivência. Apostando em uma experiência mais linear e menos maçante na repetição de morte e retorno. Há conteúdo e diversos recursos e mecânicas que combinam com o estilo e proposta.
Ao fim, o desafio não é sobreviver por 30 dias, mas descobrir o quanto o jogador consegue explorar e desbravar nesse mundo. Além de manter todos seus companheiros vivos até o final do prazo. Não é um jogo punitivo, mas sabe dar senso de urgência e importância ao seus atos. Vale a pena.