Knights of Pen and Paper +1 Deluxier Edition | Role os dados! (Impressões)

Desenvolvido pela brasileira Behold Studios, Knights of Pen and Paper é um jogo que saiu originalmente para Android e iOS, lá no já distante ano de 2012. Alguns meses depois, em 2013, o título debutou no PC. Cinco anos depois, em uma versão contendo todos os conteúdos adicionais previamente lançados, Knights of Pen and Paper +1 Deluxier Edition alcançou novas plataformas: o PlayStation 4, o Xbox One e o Nintendo Switch.

É importante descrever essa linha do tempo acerca do título para entender melhor certos aspectos de seu visual e da própria jogabilidade. Ainda que muita coisa tenha sido, sim, aprimorada e refinada ao longo dos anos, também adaptado a esta nova versão em HD do game. Mas volto a explicar melhor isso mais à frente destas impressões.

Behold e muitas parceiras

Há também que se dizer que esta é um IP que tem passado por muitas empresas e estúdios, ainda que seja a Behold Studios que tem cuidado com carinho de sua criação ao longo de todos estes anos. Este primeiro título foi desenvolvido pela Behold em parceria, originalmente, com a Paradox Interactive, Interessada no modelo mobile do game, com microtransações e tal. Esta chegou a comprar os direitos da série da Behold, que hoje mantém apenas a licença de uso de criação sobre a série Pen and Paper.

Tanto é que, em 2015, enquanto a Behold estava ocupada com o desenvolvimento e lançamento de Chroma Squad, Knights of Pen and Paper 2 foi lançado pela Paradox tendo sido desenvolvido por um outro estúdio, a Kyy Games. Nesse cenário a Behold apenas prestou consultoria ao título. Uma sequência, ao que me parece, bem fiel à fórmula do game original.

A Behold voltaria a trabalhar com a franquia novamente após isso, e então surgiu em 2017 um terceiro título, a qual recebera o nome de Galaxy of Pen and Paper. Este sim com grandes mudanças à fórmula da série. Foi neste momento em que a Behold adquiriu a licença com a Paradox para trabalhar com a franquia, pois a mesma não estava mais interessada na parceria comercial com este terceiro título. E então Galaxy of Pen and Paper foi desenvolvido e distribuído pela própria Behold Studios.

E então chegamos em 2018. A Behold Studios apostando na franquia reuniu novas parceiras comerciais para trazer os três títulos da série à novas plataformas. A francesa Seaven Studio é quem cuidou do port de Knights of Pen and Paper +1 Deluxier Edition, enquanto também está trabalhando nos ports de Knights of Pen and Paper 2 e Galaxy of Pen and Paper para serem lançados dentro dos próximos meses, previsão de que Knights 2 ainda em 2018 e Galaxy no primeiro trimestre de 2019. Quanto à distribuição global, foi fechado parceria com a Plug In Digital.

Achei interessante dar esse contexto sobre a franquia como um todo, antes de fazer essa viagem ao jogo original. É meio que uma prova de como Pen of Paper é uma IP a qual a Behold Studios tem muito zelo e dedicação. É uma história legal de ser registrada, enquanto é oportuno repassar tudo isso com a estreia da franquia em novas plataformas, atraindo assim um novo público que talvez não esteja contextualizado com toda essa saga do estúdio.

Sente-se à mesa

Knights of Pen and Paper tem como proposta simular, de forma bem simplificada, a experiência de uma partida de RPG de Mesa. Aquela com um Mestre que apresenta uma aventura a qual outros jogadores, cada um sua própria ficha de personagem, irão participar de forma interativa. O game brinca com essa atmosfera enquanto funciona dentro da fórmula dos videogames como um RPG de combate por turnos.

Essa fusão de dois mundos distintos do RPG criam um efeito singular ao game. Uma identidade própria, que funciona muito bem em vários aspectos. O resultado é um game divertido e acessível, no sentido de descomplicar muito de ambos os mundos. É simples para um RPG de Mesa, e é fácil de entender para um RPG de videogame.

Claro que isso cria seus revés. Conforme disse mais acima, é uma simulação bem simplista do que muitas vezes é uma partida de um RPG de Mesa. Não há alguns revés do verdadeiro RPG de Mesa. Muita coisa é automatizada, como o rolar dos dados, a forma como a história é conduzida acaba sendo de uma maneira bem linear, sem espaço para que o jogador se expresse e sugira coisas que o próprio Mestre teria que criar caminhos alternativos. É tudo bem redondinho, sem espaço para explorar tal proposta que o próprio jogo faz.

Nesse sentido, Knights Pen of Paper também tem em seu DNA o desenvolvimento como um título originalmente para plataformas móveis. O resultado disso é que o jogador não pode explorar seu mundo livremente, como um RPG de console tradicionalmente iria permitir. Nada de andar por cenários tridimensionais em busca de baús ou inimigos. Tudo dentro do game é muito estático, dividindo sua ambientação em telas, onde opções, menus e textos são as ferramentas interativas. Não há a ação de literalmente “andar por aí”.

Eu me peguei várias vezes deitado no sofá, em tardes de sábado ou em madrugadas de preguiça, jogando o título apenas com uma mão no controle, alternando entre o D-Pad e o único botão de ação que confirma a seleção desejada dentro dos menus do jogo. Para um game mobile essa simplificação de ações e comandos é perfeita. Nos consoles, ou até mesmo no PC, acaba dando a sensação de que talvez houvesse potencial para dar mais camadas de complexidade para a jogabilidade. Não que isso comprometa o game, mas eventualmente é perceptível tal aspecto.

Acaba sendo um game legal para se tirar o estresse do dia a dia. Aquela situação em que você não quer jogar nada complexo demais, barulhento ou agitado demais ou que vá lhe desgastar mentalmente. Knights of Pen and Paper, ao menos pra mim, funcionou muito bem como um game para relaxar.

Vantagens da +1 Deluxier Edition

Indo direto ao ponto, acredito que esta seja a (melhor) versão definitiva para aqueles interessados em conhecer a franquia. Ela vem completa, com novos conteúdos preparados para tal edição, além de trazer outra expansão que já havia previamente sido lançada à parte no passado (Haunted Fall).

São novas masmorras, novos locais, novas armadilhas, monstros e chefes. A campanha sofreu uma expansão com mais missões secundárias. Há uma classe que só estava disponível no DLC mencionado acima, enquanto também se criou um local para gerenciar as classes e novos personagens para serem utilizados no game, a Taverna.

Outro detalhe legal de mencionar é uma área chamada Fazendinha Feliz, onde o jogador pode apenas batalhar com espantalhos e assim farmar ouro e experiência para os personagens. Esse local não existia originalmente, pois quando o game surgiu para plataformas móveis, a ideia era de que os jogadores poderiam comprar moedas do jogo com dinheiro real, para assim aprimorar seus equipamentos e itens sem precisar ficar batalhando aleatoriamente até conseguir moedas para tal. Felizmente a versão de consoles não possui qualquer resquício de microtransações, e a Fazendinha está lá, como uma opção para aqueles que quiserem acelerar um pouco a progressão inicial do jogo (que é um pouco lenta).

Admito que cheguei a usá-la algumas vezes, com o objetivo de equiparar o nível de novos personagens que foram adicionados ao meu grupo e também por moedas para comprar determinados itens ou gastar com o ferreiro, aprimorando assim alguns equipamentos. O jogo não é muito bom em recompensar o jogador com moedas o suficiente para gastá-las sem muito planejamento, então é preciso ter atenção à isso.

Viajar entre locações consome dinheiro, não muito, mas consome. O Ferreiro também é um comedor de moedas, já que há uma rolagem de dados sempre que vai se tentar melhorar o equipamento, e o percentual no início do jogo é apenas de 40% de sucesso (muito baixo). Se bem que, para ser justo, conforme o game avança vai se tornando possível aumentar esse percentual (cheguei ao final da campanha com 75% de sucesso, subindo o nível do Ferreiro e usando itens que aumentam estas chances).

O que não se consome moedas, dentro das mecânicas, são a progressão de nível dos personagens e a melhora de suas habilidades. Para isso basta participar de missões e batalhar bastante. Ou seja, basta jogá-lo.

E esta versão Deluxier vem justamente no sentido de fazer o jogador se sentir confortável para continuar jogando-o ininterruptamente. Sem se sentir bloqueado porque algo não está lhe deixando avançar. Porém pede-se também que se faça muita missão secundária, afim justamente de subir de nível, ganhar moedas e ficar mais forte para as missões mais avançadas da campanha. Se não se focar um pouco em tarefas secundárias, eventualmente o jogador irá se sentir bloqueado.

A última missão principal, onde me deparei com um boss de nível 65, só consegui vencê-lo ao chegar perto do nível 40 com meus personagens. E ainda assim adicione alguns fatores de sorte nos dados para percorrer sua masmorra e muitos itens de ressuscitar um personagem caído restaurando seu HP no máximo.

Enfim, o jogo trabalha para contornar alguns de seus aspectos originais que não eram lá muito agradáveis, tal como muitos jogos mobile possuem mesmo tais debilidades, e há bastante sucesso em não deixar que o ritmo para uma versão de console seja contaminado de uma forma que o prejudique. Menos mal.

Variáveis que transformam o game

Um dos pontos que mais gostei e me divertiu em Knights of Pen and Paper diz respeito a criação dos personagens e suas classes. O jogo dá uma liberdade muito grande nesse sentido, talvez o maior de seus mérito. Cada personagem, a vovó, o motoboy, o extraterrestre, o nerd, entre outros tipinhos incomuns, assim como alguns personagens que representam a equipe da Behold que desenvolveu o game original, são algumas das possibilidades de fichas de personagens, cada um com um atributo especial de participação, como sempre tirar +1 nos dados, receber mais experiência, ter descontos na compra de itens, ter mais magia ou outro atributo de combate etc.

E aí o jogador deve misturar estas figuras com as classes de personagens, tornando-os mais estranhos. Dou como exemplo o extraterrestre clérigo que criei para meu grupo. Uma classe de suporte, que restaura vida dos personagens, enquanto causa dano extra em inimigos assombrados. A vovó se tornou a classe bruxa, o nerd deixei na classe de guerreiro, um personagem chamado woofie (que lembra algo como o Chewbacca de Star Wars) se tornou da classe necromancer e assim por diante. Tem muitas combinações visuais, e práticas, que tornam grande o leque de possibilidades e risadas proporcionadas por esse sistema.

Já as classes funcionam basicamente iguais; com uma habilidade passiva, que normalmente atribui algum bônus de status ao seu personagem; enquanto possui três tipos de ataques especiais. Aquele tipo de ataque que gasta mana (uma espécie de barra de magia). Não é possível mudar os ataques especiais ou habilidade de cada classe. Elas são fixas. Não existe outras alternativas conforme seu personagem sobe de nível. Isso me chateou um pouco, pois esperava que progredindo no game, minhas classes aprenderiam novas habilidades e que eu poderia trocar pelas habilidades fixas. Não dá.

É claro que isso também é uma forma de incentivar que o jogador sempre troque os personagens da mesa. Adicionando novos tipos e novas classes. E cada novo personagem tem uma taxa de algumas centenas de moedas (250 salvo equívoco) para ser adquirido. Não dá então, para começar o jogo e criar um monte deles. Fora que muitas das classes são liberadas cumprindo missões especiais ao longo da campanha. Uma dica? Libere o Clérico, Necromancer e Bardo. São as classes mais legais para suporte.

Rotacionando os personagens, e suas classes, isso cria novas estratégias de combates dentro das missões do game. E mesmo que o nível dos novos personagens se inicie no 1, os personagens mais fortes conseguem segurar o combate enquanto os mais novos vão escalando seus níveis.

E na sequência de elementos que diversificam o jogo há as possibilidades de categorias de missões. Jogar Knights of Pen and Paper apenas pela pura progressão da história não é uma boa ideia. A trama do jogo nem é lá tão interessante assim, ainda que tenha seus momentos inesperados (mas são bem pontuais, dois ou três no máximo). O jogo ganha ritmo quando o jogador percebe as possibilidades, do que fazer, para onde ir e qual missão quer cumprir.

Eu demorei um pouco a perceber que não tinha que seguir exatamente um trajeto linear para avançar pelo game. Perder um pouco o foco faz parte da aventura. O jogo tem missões de história, de caça, de coleta, de resgate e afins. Tudo bem que tudo, ao fim, consiste em batalhas contra inimigos, porém há um esforço para até mesmo essa dinâmica não fique se repetindo mais do que o necessário (ainda que nem sempre o jogo consiga se desvencilhar desse problema). As boas camadas de diálogos ajudam muito esse aspecto, por sinal.

Há batalhas inesperadas, com eventos em que o Mestre da Mesa cria para torna-las diferentes. Um bom exemplo, é este momento em que os personagens estão fazendo algo e topam com outro grupo de RPG jogando o game e descobrem que são os desenvolvedores do jogo em si (olha a quarta parede aí). E aí sua missão é interrompida para um combate contra os criadores do game (afim de destravar suas fichas de personagens). O jogo tem várias destas pequenas pitadas de humor que adicionam tempero aos combates e progressão da aventura.

Também é de se elogiar que o mundo de Knights of Pen and Paper dá uma grande liberdade para o jogador explorar locais de forma mais livre, catando missões secundários aqui e ali, sem a obrigação de encerrar tudo que precisa ser feito em uma área e só então seguir para a próxima. Isso certamente quebra o ritmo de combates contra inimigos fixos de cada região, em que estes sim se repetem bastante.

E tudo no game tem essa atmosfera de que você, o jogador, está montando a sua própria partida/aventura. Os inimigos em muitos combates podem ser selecionados os tipos, assim como a vantagem numérica. Há também toda uma parte estética onde a mesa, itens dela, e cenários ao redor de onde os personagens estão jogando podem ser alterados, e atributos bônus são concedidos. Até mesmo o Mestre da Mesa pode ser alterado, dentro eles uma skin do Mestre dos Magos e do Mestre Splinter (de As Tartarugas Ninjas).

São detalhes que constroem com maestria essa brincadeira de personagens sentados a uma mesa jogando uma partida de RPG de Mesa. Até mesmo a visão dos combates, com os personagens sempre sentados e os inimigos ao fundo, como que imaginados, virados para frente da tela, criam esse ambiente não convencional de um RPG de videogame. Um belo acerto dos desenvolvedores.

Considerações finais

Totalmente localizado para português, Knights of Pen and Paper tem muito do nosso humor brasileiro. Piadas nerds e referências que para com a nossa cultura é genial, como a presença até mesmo do Saci todo Huehue (e que sabe falar inglês). É uma destas produções que temos que ter orgulho de terem sido produzidas aqui, com o nosso jeitinho e humor.

Eu me diverti com o título muito mais do que achei que iria. Foi um tanto inesperado, admito. O jogo começa de uma forma bem lenta e demora a engatar, sendo inicialmente muito sustentado justamente por seu humor bem apurado. Foi quando novas classes, novas regiões e novas estratégias de combate se tornaram essenciais que o título me conquistou.

Existe uma certa falta da exploração convencional de uma aventura de RPG de videogame para tirar um pouco do efeito estático e parado que o jogo possui, mas isso também quebraria sua própria premissa, não faria sentido ser o contrário. Em contrapartida foi uma surpresa me deparar com o sistema de masmorras dentro de alguns locais, onde o jogador precisa decidir o caminho a seguir, sem saber o que existe adiante. Só lamentei não ter tantas destas masmorras quanto talvez devesse ter.

Existem também boas batalhas contra inimigos fortes. Não que estes combates tenham grandes reviravoltas, mas são inimigos resistentes, em que o jogador precisa de estratégia para vencê-los. Não basta ficar batendo. O título preza muito o aprendizado de saber jogar com as classes de suporte, seja para manter o time vivo, seja para atribuir status negativos nos inimigos.

E existe conteúdo, bastante. Há um mérito em seu valor de replay, especialmente nesta versão para consoles. Muitas missões secundários e áreas inteiras que nada tem a ver com a progressão principal do game. E mesmo que tudo tenha sido realizado, ainda existe a possibilidade do jogador recomeçar tudo de novo em um New Game+ mantendo toda a progressão de nível dos personagens da primeira campanha. Isso é ótimo para resetar as missões realizadas e fazê-las novamente com outras classes, testando e aprendendo a usar todos os estilo de batalhas.

Knights of Pen and Paper +1 Deluxier Edition talvez possua algumas engrenagens que o tempo esteja dando sinais de que estão ficando desgastadas, entretanto segue sendo uma proposta interessante, diferente e acessível. Puristas de RPGs nos videogames talvez não fiquem tão animados assim com o título, mas certamente há todo um segmento que curte a simplicidade a qual o título apresenta dentro de seu gênero. Recomendo conhece-lo.

Galeria

Bela combinação de dois mundos do RPG (Games e Mesa)
Perspectiva de visão frontal é uma boa sacada
Ótimo leque de personagens e classes diferentes
RPG simplificado (acessível) com um lado estratégico
Versão recheada de extras e conteúdo
Boa adaptação de um título que nasceu no mobile
Há uma curva inicial que demora a engatar

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