Jogos de estratégia em tempo real – RTS – nem sempre são meu forte, entretanto Bad North conseguiu despertar o meu interesse. Acredito que a razão para tal seja justamente sua proposta de ser um RTS mais simples, agregado à ideia de um design minimalista, que o torna artisticamente muito bonito.
A ideia de Bad North é que o jogador defende pequenas ilhas contra hordas e mais hordas de barcos vikings. Para isso é necessário gerenciar pequenos pelotões de soldados que estão ali, apenas defendendo seus lares. De ilha em ilha, é possível reunir mais destes comandantes, que vão se juntando para se fortaleceram contra os temíveis vikings, que nunca se dão por satisfeito e estão sempre em maior vantagem numérica.
O jogo é uma produção da Plausible Concept, pequeno estúdio independente localizado na Suécia, enquanto sua distribuição global ficou à carga da Raw Fury. Bad North já está disponível para Nintendo Switch, Xbox One e PlayStation 4. Os desenvolvedores prometem que até o final de 2018 o game deve também chegar ao PC, enquanto se espera que no próximo ano seja lançado também para Android e iOS, o que é legal, porque o jogo tem um jeito de que funcionaria muito bem nestas plataformas mobile.
RTS acessível à novatos
Acredito que esta tenha sido esta a minha primeira impressão após jogar algumas fases de Bad North. Trata-se de um jogo de estratégia simples, com regras claras que fazem até mesmo os mais inexperientes no gênero se sentirem confortáveis. Claro que com o passar de seu progresso as coisas tendem a ficar mais complexas.
Cada estágio é uma pequena ilha, com suas encostas e morros. O jogo oferece uma boa verticalidade, permitindo assim que os jogadores possam defender suas bases em pontos de morros e subidas, afunilando a passagem dos inimigos. As bases são pequenas casas em alguns lugares da ilha, sendo que elas podem ficar mais próximo as bordas ou no topo de uma encosta. Os inimigos invadem as ilhas para queimar estas casas. Se conseguirem é vitória para eles.
Bad North é um roguelike, por sinal. Significa que a disposição das ilhas e suas construções mudam a cada aventura caso ocorra Game Over. Ou seja, torna-se impossível ao jogador decorar as ilhas, os ataques dos inimigos e as estratégias usadas previamente. Até mesmo a disposição das moedas que permitem subir de nível ao completar cada uma das ilhas e os itens extras que algumas localidades dão ao jogador podem mudar de partida a partida.
Quanto aos protagonistas, estes são divididos em comandantes e seus pelotões. O jogador pode ter quatro deles ativos conforme a campanha progride, porém mais comandantes podem ser recrutados, deixando-os assim em uma espécie de reserva, ainda que… hum… o jogo não favoreça muito isso (mas eu explico isso mais à frente deste texto). A morte de um comandante é permanente, assim como todo o progresso de seu pelotão. Se tiver um extre, você pode usá-lo, se não tiver, o jogo continuar com apenas três pelotões, tornando-o bem mais difícil. Com dois ou apenas um pelotão, conforme seu progresso no game, torna-se impossível continuar e o Game Over é absolutamente certo.
Dentre os pelotões o jogador tem a disposição três classes de soldados. Infantaria, que portam escudos e espadas; Arqueiros, que possuem flechas e atacam à distância; e Lanceiros, que como o nome sugere são aqueles que portam lanças. Normalmente estas classes tem pontos fortes e fracos contra certos tipos de inimigos. Funciona quase em um sistema de pedra, papel e tesoura, com algumas exceções que não torna essa regra absoluta.
A Infantaria é boa, por exemplo, com quase todas as classes de inimigos, exceto contra uma espécie de vinking mais corpulento, maior do que os demais inimigos. Já os Lanceiros são ótimos para encurralar inimigos, mas são péssimos contra arqueiros inimigos. Os Lanceiros também se dão bem contra os vikings maiores que detonam a Infantaria, então meio que torna-se quase que obrigatório que o jogador tenha um deles sempre. Os Arqueiros também fazem um estrago nos inimigos se bem utilizados, mas são fracos, pois morrem para outros arqueiros, para a infantaria inimiga, para os pesadões e sempre que entram em batalha de corpo a corpo, sendo ótimos para defesa antes dos barcos aportarem na ilha.
Este é meio que a dinâmica de Bad North. O jogador micro gerencia estes quatro pelotões, de três classes distintas. Criando estratégias em tempo real e conforme vai surgindo a necessidade. Os inimigos surgem de qualquer direção em torno de 360 graus ao redor das ilhas. Mas não escalam encostas, precisando sempre descer no litoral delas.
No início vem apenas um ou dois barcos por vez, mas conforme o game progride, isso muda e vai ficando mais difícil, obrigando o jogador a se virar com dois ou até três focos de invasão vinda de lugares diferentes. Uma boa estratégia avançada, quando tais momentos começam a acontecer, é parar de emboscar os inimigos na praia e recuar para posições onde seja possível afunilar o percurso deles, ainda que para isso você sacrifica um das casas da ilha.
Após a primeira hora jogando Bad North fica bem fácil pegar todas estas regras e a lidar com os comandos típicos de um RTS. O jogo tem uma progressão fácil de entender, e é satisfatória a forma como ele apresenta suas regras. Os controles obedecem muito bem e é muito bom que o jogo desacelera consideravelmente quando se aperta um dos bumpers do controle para selecionar o pelotão e onde posicioná-los.
Morte e progressão
Morrer e fracassar na campanha de Bad North faz parte de sua experiência. Até porque o game não é necessariamente longo. Na primeira vez que o joguei atingi 59% de sua progresso, enfrentando em torno de 25 ilhas. Pesquisando depois vi que o game termina com algo em torno de 40 ilhas.
E digo em torno porque isso pode variar dependendo de como o jogador avança pela campanha. Há um mapa e diferentes percursos, além de caminhos alternativos. Nem sempre é possível ir para todas as ilhas da campanha, pois o game divide esse avanço em turnos e a cada turno as ilhas que ficaram para traz são eliminadas do mapa, assim como aquelas próximas ao jogador, restando assim apenas avançar.
Isso coloca mais estratégia ao game, é claro, pois em certos momentos o jogador precisa decidir qual caminho tomar entre dois que podem lhe dar algo, seja um item de batalha, ou um novo comandante de pelotão para ser usado ou ficar na reserva. O game alias tem uma conquista que consiste em conseguir recrutar todos os comandantes do game e vencer o jogo sem perder nenhum. Uma tarefa nada fácil, já vou logo afirmando.
Os ambientes ao longo da aventura tende a mudar. As primeiras ilhas são bem verdes, enquanto conforme o jogo avançar é normal encontrar ilhas de outono, inverno, à noite e até mesmo em meio a fortes chuvas. Pena que seja apenas algo puramente estético. Uma ilha com fortes ventos de chuva não tornam os arqueiros menos eficientes, por exemplo. Ao menos não notei. Porém a mudança do visual é bem vindo para dar um sentimento de progressão à a ventura. Dá a sensação de estar saindo de um ponto e avançando em uma jornada.
Morrer é outro ponto comum e recorrente de Bad North. E, conforme explicado mais acima, a morte é permanente. Se um comandante morrer já era. Todo o progresso que você investiu nele é perdido também. Ao perder todos os comandantes o jogo acaba e é preciso recomeçar tudo novamente.
E aqui vem a primeira crítica à Bad North. Sendo um roguelike seria normal esperar algum tipo de progressão permanente conforme novas experiências vão sendo adquiridas ao longo de partidas passadas, porém não há nada disso aqui. O jogador sempre vai recomeçar tudo novamente do zero. Claro que você está mais experiência, mais confortável com as regras do game e com suas próprias estratégias, porém nada mais é transportado entre um Game Over e outro.
Isso é ruim porque tira a sensação de que o jogador está indo para algum lugar. Que o pouco progresso foi recompensado. Fora que reiniciar Bad North é meio cansativo de se fazer em sequencia. O jogo fica realmente bom quando se adquire três ou quatro pelotões, mas há toda uma curva inicial com dois pelotões e o progresso de nível que precisa fazer neles antes de conseguir o terceiro e o quarto comandante. Poderia ao menos ter algumas opções de reinício otimizado, pulando esse começo lento que o game tem. São 15 ou 20 minutos que acabam sendo meio cansativos. Afinal o jogador quer o desafio das fases avançadas, a qual normalmente são as que lhe matam.
Outro ponto ruim é que qualquer erro é uma condenação de Game Over. Perder um comandante perto após a metade da campanha é complicado. Você pode ter outro na reserva, mas é possível que ele não dure muito contra os inimigos, que já estão mais fortes do que aqueles iniciais. Os comandantes na reserva não podem subir de nível enquanto o jogador não os utilizar. E não faz sentido utilizá-los a menos que o seu time original fique meio desfalcado.
A progressão de comandantes se dá por meio de moedas, que são dadas mediante a conclusão de cada estágio e das bases que permaneceram sem serem destruídas. E tais moedas já são poucas por estágio. Mal dão para seus quatro comandantes ativos, imagine então ter que dividi-las com os reservas? Assim, perder um comandante acima da metade da aventura é quase uma sentença de Game Over. Especialmente se for uma classe, como os Lanceiros, e todo o resto da fase for contra os pesadões que apenas eles conseguem vencer se muita perda.
Talvez esse problema pudesse ser sanado se o jogo tivesse algumas opções de armadilhas ou barricadas, que tornasse mais fácil manter os pelotões protegidos mesmo que um deles caiam nos estágios avançados. O que Bad North tem são habilidades passivas que o jogador pode ativar em certos momentos, como uma bomba ou uma marreta de poder, mas ainda assim elas não podem ser usadas com muita frequência.
Estes itens, aliás, também são limitados. Eu só vi quatro ou cinco itens ao todo ao longo da aventura. Sendo que após um tempo o jogador passa a ganhar eles novamente. Se há algo em torno de nove comandantes ao todo na campanha, admito que gostaria que houvesse ao menos nove itens diferentes para equipar em cada um deles.
Considerações Finais
Bad North inegavelmente tem seu charme. Sua direção de arte é um de seu ponto forte, juntamente com o conceito minimalista que também acaba sendo aplicado as mecânicas que o tornam um jogo de estratégia em tempo real acessível a jogadores inexperientes no gênero. Atrativo até mesmo àqueles que não são tão fãs assim de um RTS.
Talvez ele tenha alguns problemas em torno de seus elementos roguelike e sua progressão seja mais punitiva e frustrante do que devesse, mas ainda assim é possível contornar alguns destes males. Uma boa dica caso você não queira perder um de seus comandantes de correr o risco de tudo ruir e dar Game Over é desligar o game antes do final da fase (que é quando ocorre o save automático). Aí basta carregar o jogo novamente e refazer a fase, sem precisar assim reiniciar toda a campanha.
Claro que para quem o achar muito fácil, Bad North possui um Modo Difícil, que torna os inimigos mais frequentes e resistente. Não é um modo para fracos, isso é certo.
Existem algumas coisas que o jogo poderia fazer melhor. Não acharia um modo multiplayer para coisa jogadores, seja invadindo ou defendente. Talvez até mesmo um modo cooperativo para dois jogadores. Poderia funcionar. Na parte das mecânicas, seria bem vindo um pouco mais de itens ou uma maior árvore de habilidades. Entendo que os desenvolvedores queriam a simplificada ligada à atmosfera minimalista, entretanto isso acaba prejudicando um pouco a dinâmica do jogo, que pode cansar alguns jogadores após algumas horas.
Agora um elogio que já deveria ter feito, e já ia me esquecendo, diz respeito a câmera do game que é sensacional. Dá para girar toda a ilha, aumentar ou ampliar o campo de visão. As casas onde os pelotões podem pisar são bem fáceis de enxergar. Esse é um elemento importante em um jogo de estratégia que funciona em um campo de tabuleiro. Ter a visão de tudo e poder ter a intuição do que fazer a seguir. Nisso Bad North manda muito bem.
Ao fim sei que o título não é um jogo que vai agradar a todos. Jogos de estratégias são um gênero que tem seus aficionados e uma barreira de entrada normalmente grande. Bad North tem como missão ajudar a quebrar essa barreira. Em parte acho que ele consegue, mas tropeça nos momentos em que o jogador já está se sentido mais confortável e com desejo de ver mais. Eu gostei, mas queria que tivesse mais a ser visto, a ser desafiado, sem me frustrar a cada Game Over.
Galeria
Extra | 29 minutos das primeiras ilhas