Life is Strange 2 | Ep. 1 Roads – Família em primeiro lugar! (Impressões)
Lançado em 27 de setembro, o primeiro episódio de Life is Strange 2 marca o início de um novo arco de história com novos personagens criados pelo mesmo time do primeiro jogo, pelas mãos do estúdio original, a Dontnod Entertainment. E apesar desse retorno, que é diferente do que aconteceu no spin-off Before the Storm (desenvolvido pela Deck Nine), o que temos aqui não é exatamente uma sequência direta da história do primeiro jogo. Trata-se de um novo drama, com apenas o bônus de se passar no mesmo universo e na mesma linha cronológica após os eventos do primeiro Life is Strange. Tudo muda, tudo é novo, mas a vida continua sendo estranha, não?
Vale apontar que não dá exatamente para julgar a totalidade de Life is Strange 2 apenas por este episódio inicial. É possível fazer uma avaliação da ideia e da proposta, mas a avaliação final será apenas quando os cinco episódios planejados tiverem, por fim, sido lançados. A minha intenção neste texto é dizer se já dá para se empolgar ou se é melhor esperar um pouco mais antes de se aventurar neste novo capítulo da franquia.
Até fazendo uma volta ao passado, o primeiro Life is Strange só me pegou pra valer mesmo no final do segundo episódio, quando minhas escolhas fizeram uma enorme diferença de vida e morte em relação a uma das personagens do game. Foi ali que o jogo me fisgou. Não dá para dizer que Life is Strange 2 tenha feito o mesmo logo neste primeiro episódio. Até porque agora já estou mais habituado com esse universo e até mesmo com a proposta narrativa de jogos em as decisões moldam os caminhos da trama. Não vai ser fácil me surpreender e me impressionar novamente como a Dontond conseguiu no primeiro jogo.
A mesma sutileza
O que dá para dizer tendo como base o primeiro episódio de Life is Strange 2 é que o estúdio aborda temas e questões familiares com a mesma destreza e sagacidade que também o fez no jogo anterior. Não os exatos mesmos temas, mas há os dilemas morais que, até mesmo para um adulto, não há como dizer que uma decisão é 100% correta. Entretanto as motivações também parecem menores aqui, ainda que talvez o jogo apenas não tenha entregado de bandeja as proporções que isso possa ocasionar nos próximos capítulos.
No primeiro game havia toda uma questão da protagonista Max ter previsto um futuro onde sua cidade seria destruída por um tornado em alguns dias, enquanto Max tinha que lidar como todo um drama envolvendo sua melhor amiga, Chloe, que vivia todo um outro drama envolvendo uma amiga desaparecida e um padrasto que causava muitas dúvidas de caráter ao jogador. Nesse meio tempo, Max descobre a habilidade de rebobinar o tempo e começa a tentar mudar coisas ruins da rotina em torno das pessoas ao seu redor. Vidas foram salvas, mas para todo ato há uma consequência. O jogo brincava muito com a ideia do Efeito Borboleta ao mudar o passado em pequenas coisas. E o final do primeiro jogo isso é colocado a teste para o jogador. Não há escolhas boas, tudo levaria a uma tragédia, de uma forma ou de outra. E por tudo isso é que o primeiro game é tão incrível.
Life is Strange 2 não tem essa pretensão inicial de fim dos tempos. Aqui o jogador assume o controle de Sean Diaz, que tem sua vida virada de cabeça para baixo quando uma tragédia familiar obriga ele a fugir de sua cidade junto com seu pequeno irmão Daniel. Procurados pela polícia, os irmãos buscam uma saída, um meio de sobreviver, enquanto a culpa pelos eventos recaem sobre Sean.
Seguinte. Para aos curiosos e sedentos por mais informações, posso contar o ponto de virada da trama. Isso ocorre bem ao final do ato inicial do jogo. Se você não quiser saber, pule este parágrafo. É um spoiler, e é menor do que talvez pareça. Então vamos lá. — A ideia do plot de Life is Strange 2 é gerado em uma situação em quê Daniel acaba, acidentalmente, mexendo com seu vizinho adolescente, que acaba querendo bater no inocente garoto de 9 anos. Sean intervém e acaba batendo no vizinho, que cai no chão e bate com a cabeça em uma pedra. Nisso um policial, que estava de passagem, surge e aponta uma arma para os garotos Diaz. É a vez do pai dos meninos intervir, e no meio de um despreparo do policial, o pai dos meninos é baleado. Daniel entra em choque e ativa um estranho poder. Tudo ao redor da casa dos meninos é devastado. O policial, o vizinho e o pai estão mortos. Sean entra em desesperado, pega Daniel, que está desacordado, e foge dali. O mundo cai sobre as costas de Sean. Seu pai morreu, sua casa se foi, seu irmão tem um estranho poder. Só lhe resta fugir, sabe se lá para onde. Os meninos não tem mais família, Sean acredita que, se pegos, serão separados, com ele indo para um reformatório juvenil. Este é o mote inicial do game.
O tema central aqui é sobre dois irmãos em fuga, sem destino, sem um plano, deixando toda sua vida para trás. O jogador assume o papel do irmão mais velho, precisando cuidar e tomar conta do menor, que tem apenas 9 anos. Existe a culpa e a tragédia que dão a carga dramática, ainda que não seja o papel do jogador acalmar os sentimentos de Sean. Você apenas precisa seguir com eles até o próprio personagem, por meio de outros eventos, começar a se revolver emocionalmente.
Há um dilema sobre a moralidade. Seu atos refletem naquilo que Daniel pensa de você. Possivelmente em como ele vai reagir futuramente a adversidades que irão aparecer. O irmão mais velho exerce uma influência sobre o menor. Então há questões morais, como ver os meninos andando há dias sem comer. Você rouba ou não rouba comida? Mendiga para pessoas na estrada ou não mendiga? Pede que seu irmão menor o faça porque as chances de sucesso são maiores ou encontra outra jeito?
Talvez para alguns estes problemas não sejam grandes dilemas. Eu, como pai de uma criança de 6 anos, me senti angustiado. Até onde vão meus valores e minha moralidade, ou os valores que quero passar ao meu filho, na contra partida de não deixá-lo passar fome ou tristeza após ter passado por um trauma? É esse o ponto que Life is Strange 2 quer cutucar. E o faz com bastante êxito.
Dá para dizer que é até mais realista e maduro do que os dilemas do primeiro Life is Strange, a qual o jogador estava ali para tentar impedir um furacão ou encontrar uma garota desaparecida. Por mais que não fosse mundano alguns temas, especialmente um envolvendo suicídio adolescente, a trama central do primeiro game era bastante hollywoodiano. Aqui não, o jogo tem uma pisada bem mais realista. Mais adulto do que se pode esperar.
Sem segundas chances
Uma mecânica totalmente presente no primeiro Life is Strange era a habilidade de rebobinar o tempo e tomar novas decisões. O que era muito cômodo caso o jogador decidisse algo que não resultasse naquilo a qual imaginou que seria. Life is Strange 2 não tem nada disso. E pra ser justo, Before the Storm já havia provado que isso, de não ter o poder de rebobinar, não estraga a fórmula da série. Lá também deu certo não ter.
O ponto é que gostaria que Life is Strange 2 tivesse alguma coisa extra em termos de mecânicas, sabe? The Awesome Adventures of Captain Spirit, lançado em junho desse ano, tinha essa brincadeira com o poder da imaginação. Era diferente, era curioso. Aqui não há nada assim. O que há são múltiplas opções de diálogos em alguns momentos, em que Sean está conversando com outras pessoas. Não é mais aquele cenário de uma resposta ou outra. Há mais de duas opções, mas mesmo assim não é tão legal ou interessante. Sean pode interagir com Daniel em momentos bem específicos, em que o garoto está posicionado em um momento que vai gerar um cenário de interação, mas novamente, não é tão legal quanto uma super habilidade especial ou a apresentação de uma perspectiva diferente de mundo como Captain Spirit faz.
Tenho pra mim o palpite de que o que vai acontecer a partir do segundo episódio é do jogador poder assumir os controles sobre Daniel, ou exercer algum comando que ative seu poder sobrenatural. Quer dizer, faz sentido, não? Essa é uma característica do jogo original. Enfim, achar ou não achar não fará diferença aqui. O ponto é que eu entendo quem jogar e sentir falta desse elemento dentro das mecânicas (e não apenas dentro da história). Sei que eu senti.
O que me despertou a atenção foi no elemento que diz respeito ao dinheiro. Existe momentos da história em que posso tentar conseguir mais dinheiro ou não, mas sempre envolvendo questões de moralidade. Isso tem um reflexo mais adiante, especialmente na minha decisão de comprar algo ou ter que roubar. É uma mecânica interessante, mas que é tratada bem superficialmente neste primeiro episódio. Sinceramente espero que o jogo consiga explorar melhor isso nos próximos capítulos. De qualquer forma, não deu para sentir a real falta de dinheiro desta vez, porém é interessante que essa mecânica faça o jogador a pensar em tomar más decisões.
No mais, os elementos são mais ou menos o que se espera desse gênero mais narrativo. O jogador anda por um cenário, interage com quase tudo, criando novos diálogos e informações que podem ser usadas depois em outros diálogos. Algumas coisas ativam cenas e existem alguns poucos colecionáveis, por meio de apetrechos que podem ser colocados na mochila de Sean, o que é legal, mas não é nada demais. Há também alguns momentos de interação com o ambiente em que Sean desenha o cenário em seu caderno. É meio automático, mas achei interessante e uma alternativa legal para o que Max fazia no primeiro game com as fotografias de sua Polaroid.
Considerações finais
Sendo este apenas o primeiro episódio, não há porque me estender muito. Life is Strange 2, episódio 1: Roads, consegue entregar sua proposta e ideia. Uma história um pouco mais adulta do que o do primeiro game. Eu comprei tal ideia, ainda que imagino o fato de que algumas pessoas podem não se impressionar por conta da ausência de uma calamidade de maiores proporções, tal como existia no jogo anterior. Tire também a capacidade de rebobinar o tempo, ou qualquer habilidade correlativa, e dá para perceber que o jogo perde elementos que tornavam o primeiro título da franquia realmente especial.
Porém há que se elogiar a ousadia dos desenvolvedores de criar algo totalmente novo. Nova locação, novos personagens, uma nova história. Existem alguns easter eggs em relação a sua decisão final para com Arcadia Bay já neste primeiro episódio, o que é bem legal e pontua o momento em quê esta história está acontecendo. Porém, aqui o que se encontra é uma nova proposta. Nada de Max, nada de Chloe, nada de Arcadia Bay. Não que não signifique que alguém ou mais elementos do primeiro jogo não possam surgir em outros episódios. E sinceramente eu espero que apareçam.
Importante dizer também que o jogo se encontra totalmente localizado para o português, algo que lá quando Life is Strange foi lançado em episódios individuais ainda não acontecia. Só quando os cinco episódios foram concluídos é que uma atualização trouxe a localização PT-BR. Life is Strange 2 já está em nosso idioma desde o início. Quanto a trilha sonora, continua tão boa quanto o do jogo original, mas neste primeiro episódio não achei elas tão impactantes assim. São apenas boas canções. E poucas por sinal. Senti falta de algo mais marcante ou emotivo.
Penso assim… se você é fã do primeiro Life is Strange, se curtiu Before the Storme, Life is Strange 2 não tem erro. É altamente recomendado. Mesmo com uma nova história, um novo elenco. Já para aqueles que não jogaram os jogos anteriores esta é uma boa chance de começar por aqui. Não faz mal não ter jogado. Mas é preciso ficar alerta quanto ao gênero. Trata-se de um estilo mais narrativo, sem muita ação. Um gênero que pra mim é mais interessnate do que o point & click puzzles que existem até hoje, normalmente no PC. É um jogo que decisões precisam ser tomadas e nem todas são fáceis ou corretas. Fora que há uma pegada de um conto mais jovem, ainda que um adulto consiga se sentir imerso em sua trama e nos dilemas dos meninos protagonistas.
Quanto ao ritmo, não gostei muito da gordurinha que existe no ato introdutório do jogo, enquanto Sean está em sua casa se preparando para um evento com os amigos. Esse é um momento bem parado do game, com uma exploração mais engessada, mesmo que haja muita coisa para interagir. Mas passado isso, quando acontece o ponto de virada inicial do título, o jogo muda totalmente sua dinâmica e fica mais acelerado. Você quer seguir a história e não apenas ficar passeando em busca de objetivos menores. Há uma melhora considerável. Especialmente em um evento onde tudo volta a dar errado em um posto de gasolina. Tensão e suspense faz parte da série, e é legal que isso já ocorra logo no primeiro episódio.
No mais, é um primeiro episódio relativamente curto. Dá para concluir em duas ou três horas, dependendo do quanto se quer explorar em alguns ambientes. Gostei de já iniciar a aventura, mas certamente dá uma certa ansiedade ter que esperar o próximo episódio, que no momento ainda não tem uma data exata para sair. Já estou aguardando!