Lançado em outubro do ano passado, My Hero One’s Justice é uma investida interessante da Bandai Namco em um dos maiores sucessos atuais da Weekly Shōnen Jump. Boku no Hero Academia, ou também conhecida mundialmente como My Hero Academia, surgiu como mangá em 2014, obra de Kōhei Horikoshi.
A versão animada surgiu em 2016 e conta atualmente com três temporadas composta por 63 episódios, sendo que a quarta temporada já está em produção e deve estrear em algum momento de 2019. My Hero One’s Justice tem como base a série em animê (que é bem fiel ao mangá), englobando eventos do meio da segunda temporada até a metade da terceira. Decisão estranha, por sinal, mas comento sobre isso daqui a pouco.
Para quem não conhece muito bem o universo de My Hero Academia, recomendo a leitura de um destes dois posts – sobre a premissa da série ou sobre seus primeiros 50 capítulos – que escrevi aqui no site quando estava acompanhando seu mangá pela internet. Atualmente o título é lançado oficialmente no Brasil pela Editora JBC e desde então tenho acompanhando os volumes nacionais, porém os mesmos ainda não atingiram o ponto narrativo após os eventos já exibidos ao final da terceira temporada do animê.
Estudante, heróis e vilões em grandes batalhas de arena
My Hero One’s Justice, desenvolvido pelo estúdio Byking, é um jogo pertencente ao gênero de lutas em arenas tridimensionais. Não há um modo aventura ou campanha com elementos de exploração em mundo aberto, tal qual existem em casos de outros títulos baseados em séries da Jump, como Naruto e One Piece. Aqui é porrada em cima de porrada. Você contra outro jogador ou contra a CPU.
O que empolga inicialmente em My Hero One’s Justice é que um título tem uma boa quantidade de modos de jogo. Há o modo principal, de história, que revisita os eventos do animê, além de modos como missões, arcade, local e online. Dentre a cartilha de modos que jogos de lutas precisam ter, o título cumpre muito bem tal função.
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Modo História
No que diz respeito ao Modo História, preciso ressaltar que é um pouco estranho a decisão de começar tudo sem uma apropriada apresentação do universo e personagens da série. Quase como se devesse existir um jogo anterior, porém nunca lançado. Os eventos já assumem a premissa do arco da segunda temporada da série, envolvendo o treinamento do Midoriya com Gran Torino e o vilão Stain.
Tudo bem que é nesse momento que a série atinge um ápice e clímax que até então não se era esperado, mas isso ocorre porque há todo um caminho construido pelo autor da obra para esse evento. Colocar àqueles não familiarizados com esse universo para chegar de supetão ao arco, via videogame, não é tão impactante assim.
Isso para não mencionar que a escolha de cenas do animê, em quadros estáticos e quadros com movimentos usando os personagens com CGI da engine do jogo, como forma de narrar com quadros em textos dos eventos de todos os arcos, envolventes a partir deste ponto da série, não é nem um pouco interessante ou empolgante.
Até há algumas cenas totalmente de animação CGI que não envolvem textos e quadros estáticos, mas são raríssimas ao longo de horas e horas do recurso narrativo já ultrapassado. Talvez o orçamento do jogo não permitiu que tudo pudesse ter sido feito dessa forma, o que é até compreensível para uma investida inicial em uma série de videogame. Entretanto não deixa de ser um ponto que puxa para baixo o nível de entusiasmo que se tem ao acompanhar a história da série. Ao menos todos os textos foram narrados e dublados pelos dubladores originais da série no Japão. Todas as vozes consagradas estão ali. E o título possui localização em português em toda essa parte de história.
Quanto à dinâmica dos estágios e das batalhas do Modo História, posso dizer que não tenho do que reclamar. Achei tudo muito bem equilibrado e divertido. Não cansa, não enjoa. Não fica repetindo as mesmas lutas ou situações.
Nesse modo o jogador não assume apenas o papel do protagonista, Izuku Midoriya, mas também de boa parte do elenco presente no jogo. E em muitas fases, o jogador pode escolher duas ou três opções de personagens a qual quer assumir o controle como lutador ativo, deixando os outros dois como parceiros de suporte. Isso permite testar quase todos os personagens do jogo diretamente no modo história.
A única coisa que não me agradou totalmente foi o fato de que esse modo inicia pelo ponto de vista dos heróis, não explicando quase nada sobre as motivações dos vilões. Diferente do que ocorre na série, onde certos diálogos acontecem concomitantemente. Aqui é preciso terminar o modo história com os estudantes e heróis, para depois abrir a história dos vilões e jogar sobre a perspectiva deles de tudo que já foi vivenciado.
Isso é ruim para quem não está familiarizado com esse universo. Por exemplo, esse modo começa com o arco do Stain, mas o jogador novato só vai entender direito quem é Stain e suas motivações quando terminar o modo história dos heróis e for jogar com ele no modo vilões, que é quando o personagem tem suas falas e perspectivas melhor esclarecidas.
Fora que é meio chato ter que repassar novamente por toda a história já vista, ainda que sobre nova perspectiva. Afinal de contas, por mais que seja o outro lado do que já foi contado, o jogador já está ciente do desfecho dos arcos apresentados.
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Missões e Arcade
Já os outros modos menores, missões e arcade, oferecem uma experiência com mais ação e menos diálogos aos jogadores. São duas modalidades para se jogar sem se preocupar quem é quem. Basta sentar a porrada no adversário e continuar seguindo em frente.
O Modo Arcade funciona como esperado dentro de um jogo de luta. São seis batalhas diretas, a qual cada personagem possui seus adversários e diálogos relacionados. Vença todos em sequência e triunfe. Nada que exija maiores explicações.
Já o Modo Missões é um pouco mais interessante e complexo. Funciona como um modo de sobrevivência, ainda que com diversos outros elementos, como poder escolher caminhos, subir de nível a experiência dos personagens e também usar itens para continuar avançando. É um modo que consiste em um mapa com pontos de batalhas. O jogador deve vencer para chegar ao final desse mapa.
Só que aí tem as regrinhas especiais. Ao se iniciar em um destes mapas, o jogador escolhe três personagens e deve ficar com eles até o fim. Antes de cada batalha se escolhe quem é o lutador ativo e os demais ficam como suporte. Tomou dano na luta? Sua barra de saúde não restaura para a próxima. Então na próxima batalha ou você luta com energia a menos usando esse mesmo personagem ou troca, usa um dos suportes como ativo e coloca o que tomou dano como suporte.
E com isso as missões vão ficando cada vez mais difíceis, conforme se progride no mapa. Nessa contrapartida, para não tornar o modo impossível de ser vencido, há itens que restauram a energia dos personagens (mas eles não são conquistados com frequência), e também ao ser derrotado sua energia volta a ficar 100%. Não dá Game Over, mas sua pontuação final sofrerá uma severa punição. Ou seja, é possível vencer nesse modo, independente da dificuldade, mas o melhor ranking e pontuação nem sempre é fácil de ser almejado.
O ponto final aqui é que My Hero One’s Justice apresenta um bom leque de opções para o jogador solitário. Um modo história repleto de lutas e narrativas, outro com missões com algumas regras próprias que dão uma experiência de time e de gerenciamento de dano para sobreviver até o fim e a clássica disputa mano a mano do modo arcade. Além de tudo isso, você sempre pode chamar um amigo localmente para um mano a mano ou tentar surrar alguém no matchmaking online.
Mecânicas triangulares de batalha
Falei um pouco do que o título tem a oferecer e ainda não expliquei como funciona o sistema de combate de My Hero One’s Justice. Sobre as mecânicas, técnicas e jogabilidade na hora que tem que partir para a ação contra um adversário.
Basicamente o jogo funciona em um esquema de pedra, papel e tesoura para os três principais comandos de ação de todos os personagens no elenco. Isso não ficou muito claro pra mim inicialmente, mas depois de pesquisar um pouco na internet, do porquê certos momentos meus golpes interrompiam ou não o golpe do adversário, passei a entender melhor o esquema.
Há três tipos de comandos: normal, contra ataques (personagem fica amarelo) e ataques não bloqueáveis (personagem fica em vermelho). Cada um realizado por meio de um botão no controle. E funciona assim: ataques normais interrompem ataques não bloqueáveis (vermelho), contra ataques (amarelos) interrompem ataques normais e, pela lógica, ataques não bloqueáveis interrompem contra ataques.
Por isso é normal em meio a ação das batalhas do jogo você estar batendo no oponente e, apesar de estar causando dano, o adversário está se movendo e armando um ataque que irá interromper sua sequência, impedindo a eficácia do seu ataque e quebrando sua possibilidade de realizar um combo. E na hora do ação é sempre um pouco confuso saber qual tipo de ataque seu oponente está usando ou irá usar. As cores, vermelho e amarelo, ajudam, mas elas aparecem mais como um indicação de que a quebra do ataque foi bem sucedida e não pode mais ser impedida. É mais como um sistema de conferência para dizer que o jogo fez a interrupção correta. Mas estas são apenas as mecânicas básicas.
Entendido essa regra é preciso compreender que todos os personagens possuem suas próprias peculiaridades, ataques e movimentos que fogem do padrão do sistema triangular de ataques. E aí estamos na esfera das habilidades individuais de cada um dos personagens presentes no game.
Há ataques que quebram tudo, habilidades que interrompem tudo, campos de energia ou de congelamento que paralisam o adversário que se aproximar. Personagens que atacam muito bem à distância, enquanto outros que ao colar no oponente fazem um estrago tremendo.
Existe também um sistema que arremessa o personagem e que pode travá-lo na parede do estágio (com a cabeça no concreto e as pernas para fora – como em um desenho animado dos anos 70), e se o jogador que o arremessou for de encontro contra o adversário preso o cenário gira e a luta acontece nas paredes do cenário (o que é bem incrível).
Para não dizer que todo o cenário é destrutivo, o que normalmente causa um efeito muito impressionante em alguns estágios. Há um dentro da academia, em uma classe de aula, em que carteiras e paredes voam para longe! Só lamento que nada no cenário seja interativo no sentido de poder pegar e arremessar no oponente. Seria interessante pegar um blocão de concreto, um hidrante, árvore ou até mesmo uma carteira para arremessar na fuça do oponente.
Além disso há o sistema de time. O jogador luta com um único personagem, mas pode ter dois personagens de suporte à sua escolha. E estes são convocados durante as lutas para lhe auxiliar, executando um golpe que pode ou não quebrar o ataque oponente. Dependendo do personagem escolhido. Há alguns que prendem o adversário em alguma armadilha e outros que saem atacando. A barra de suporte, é claro, não é infinita. Cada personagem de suporte tem a sua, mas ao ser usado, é preciso esperar que ela se encha para poder usar o suporte mais uma vez.
E aí entram os golpes especiais, que possuem três níveis de poder, utilizando uma, duas ou três das barras de especiais. O golpe de uma barra e o de duas são totalmente diferentes entre si, sendo que obviamente o de duas barras é muito mais poderoso e tem uma cena de animação mais época. Se o golpe especial finaliza a luta, temos os dizeres famosos da série PLUS ULTRA na tela.
Só me decepcionei um pouco com o terceiro golpe especial, que nada mais é do que o golpe especial de uma barra adicionando os golpes especiais dos personagens de suporte. Esperava que o golpe de três barras pudesse ser algo original envolvendo os três personagens do time, como uma combinação que geraria uma animação própria, mas não é nada disso.
Aliás, dependendo do seu time, esse golpe não funciona de forma tão eficaz assim, parecendo que os personagens não possuem um bom sincronismo ao usar seus especiais ao mesmo tempo. Acredito que o efeito desejado aqui fosse algo parecido com os especiais de times dos jogos da série Marvel vs Capcom, que também podem vir a ter essa problema de eficácia e sincronismo dependendo do time que o jogador montar.
Os golpes especiais não são ao final, tão imponentes quanto se pode achar que são. É bem comum o adversário conseguir quebrar o golpe (se já estiver atacando com um ataque de interrupção de ataque) ou se desvencilhar estando muito longe do oponente. Além disso há personagens que exigem estarem muito próximos ou serem muito exatos, enquanto outros funcionam de forma com um raio de ataque mais abrangente e à distância. Não é o tipo de especial que sempre salva uma partida quase perdida. Não se deve ser usado no desespero, sem planejamento. Até porque estas barras podem levar um round inteiro para se encher.
Por último, um dos pontos legais do sistema tridimensional de arena de My Hero One’s Justice é a mobilidade dos personagens. As arenas são bem grandes, e destrutíveis. Sendo possível muitas vezes pular muito alto (mas nunca voar), além de correr muito rápido para longe do oponente. Com isso as lutas possuem muitos momentos de gato e rato, onde é preferível fugir ou perseguir seu adversário, variando muito se o seu personagem é bom para ataques próximos ou distantes. O sistema de perseguição é muito bom, tal qual a mira semi automática dos ataques a distância, não sendo injusta o suficiente para que o adversário nunca consiga se esquivar.
Ao fim, as mecânicas de batalhas de My Hero One’s Justice são um pouco diferentes do que normalmente se encontram em jogos de batalhas baseadas em séries japonesas. Não saberia apontar se funcionariam bem em um cenário profissional, até porque há personagens que soam no jogo mais fortes do que outros (All Might claramente é mais apelão do que alguns do elenco dos jovens estudantes, o que faz total sentido). O que posso afirmar é que são lutas divertidas, ainda que nem sempre sejam precisas ou complexas. O modo de combo automático, por exemplo, é um tanto prático demais, a ponto de não instigar o jogador a testar o modo manual, onde há uma liberdade, meio limitada, para testar algumas coisas a mais.
Considerações finais
My Hero One’s Justice é a primeira investida da série em um modelo de jogo de luta. E para tal tem um bom começo, sem atingir plenamente o potencial que poderia ter, mas claramente estando no caminho correto. Sem copiar o que existe em outros jogos de séries japonesas, e correndo atrás de um estilo próprio.
Peca talvez em não apresentar de forma apropriada o universo de My Hero Academia para aqueles que estão chegando à serie diretamente por meio de seu jogo de videogame. Poderia ter rolado alguma preocupação maior nesse sentido, restando claramente a visão de que o título foi planejado mesmo com a ideia de atrair principalmente aos fãs da série.
O combate é bem divertido, ainda que perceptível que o mesmo precisa de um melhor polimento para potenciais sequências. Há um certo desbalanceamento lógico entre os personagens, ainda que exista uma preocupação em não deixar isso tão transparente assim.
Só tenho uma reclamação no que diz respeito a localização em português dos combates: as falas de introdução, e dos golpes especiais, dos personagens não possuem legendas em nosso idioma (e o idioma do game é unicamente em japonês). Não dá para saber o que estão dizendo. Exceto, como informei, em modos onde estes diálogos são feitos como narrativa de uma história. As falas genéricas, como aquelas nos modos local e online estão todas sem legendas. Que mancada!
O elenco para um primeiro jogo da série é satisfatório, ainda que claramente certas ausências vão ser sentidas por alguns fãs (como personagens de outras escolas ou professores). Pra mim, aqueles a qual achava mais interessantes estão presentes aqui, sem exatamente ter dado falta de alguém que não esteja.Talvez o Minoru Mineta ou o Hanta Sero? Não sei. Certamente é uma pena que toda a classe 1-A (a do Midoriya) não esteja presente no elenco. Também acho que seria legla ver professores como o Cementoss e o Space Hero Thirteen.
Também acho uma pena que a Bandai Namco tenha deixando Endeavor como um personagem adicional pago, mesmo tendo sido dado de graça em pré-venda. E é curioso que My Hero One’s Justice também não possua um passe de temporada, entretanto personagens adicionais vão ser lançados por meio de DLCs pagos. O primeiro inclusive já foi: Inasa Yoarashi. Dá para suspeitar que eventualmente uma versão do tipo “complete edition” possa a vir a ser lançada. Não seria uma surpresa.
O Modo Online, que tanto andou se criticando ao longo de alguns títulos lançados pela Bandai Namco ao longo de 2018 (como Naruto to Boruto: Shinobi Striker), está funcionando muito bem aqui em My Hero One’s Justice. Nos meus testes as partidas foram facilmente encontradas e as lutas rolaram sem engasgos ou problemas de desconexão. Fiquei bem satisfeito com isso. E no online, mesmo lutando contra outras pessoas, senti que o caos e experiência do jogo se mantiveram exatamente como os modos single player. Dá para se divertir e não se frustrar contra oponentes reais.
Acho que também vale comentar sobre a possibilidade de personalizar os uniformes dos personagens, heróis ou vilões, com máscaras, chapéus, trajes e afins. É legal, mas é puramente coméstico. Não muda nada dos atributos dos personagens, ainda que hajam algumas opções legais envolvendo o Mineta. O ponto é que todos estes itens são desbloqueáveis limitados a certas ações no jogo ou em ganhar moedas para compras tais itens. Não é muito prático desbloquear exatamente o que se quer, mas é um elemento interessante para dar um senso de progressão e ser recompensado por continuar tentando atingir melhores rankings nos modos principais de jogo.
Ao fim, My Hero One’s Justice entrega um bom pacote de opções. Mais do que certamente poderia se esperar para uma primeira investida. O jogo roda bem, sem problemas técnicos. Funciona para os fãs, é divertido e inusitado. Para quem gosta desse universo, e dos personagens, não vi nada que poderia desagradar esse grupo. O ponto fica apenas para quem não conhece a série: talvez não seja o melhor jogo de apresentação, mas as mecânicas de batalhas podem agradar e divertir independente do contexto narrativo em si. Que esse seja apenas o primeiro de muitos outros jogos (para consoles) com base em Boku no Hero Academia.
Extra — 40 minutos iniciais do Modo História
Dando uma nota
Bom começo para a série nos consoles - 7.5
Combate pode ser confuso inicialmente, mas se acostuma - 7.9
Principais personagens da série estão presentes - 8.5
Muitos modos de jogos, boa diversidade - 8.5
Narrativa estática no Modo História está um tanto ultrapassado - 6
Boa localização, mas falta legendas em algumas situações - 7.5
Agradável aos fãs da obra original - 8
7.7
Bom Início
My Hero One's Justice é a primeira investida da série em um modelo de jogo de luta. E para tal tem um bom começo, sem atingir plenamente o potencial que poderia ter, mas claramente estando no caminho correto. Sem copiar o que existe em outros jogos de séries japonesas, e correndo atrás de um estilo próprio.