Opinião | Onde estamos errando com os jovens no Brasil?
Apenas um desabafo em um dia de bastante tristeza...
O assunto deste texto é complicado. Tudo bem que não é a primeira vez que escrevo sobre coisas complicadas aqui, mas enfim. Hoje, 13 de março de 2019, houve o triste caso da escola Prof. Raul Brasil em Suzano, em quê ex-alunos da escola entraram a assassinaram adolescentes e funcionários da escola, para logo em seguida se suicidarem. Um horror. Mas não é exatamente sobre isso que estou querendo escrever a respeito – notícias sobre o caso dá para encontrar em portais como o G1.
O que gostaria de refletir um pouco, escrevendo aqui a respeito, diz mais respeito ao ponto em que os jovens chegaram em nossa atual sociedade para que casos assim ocorram de tempos em tempos, não só no Brasil, mas também em outros lugares pelo mundo.
Digo isso porque não é natural assim jovens matando outros jovens, especialmente dentro de escolas, seus amigos e aqueles que são os portadores do conhecimento para o amadurecimento e crescimento dos mesmos. Para logo depois decidirem terminar suas próprias vidas. Qual o propósito de tamanha atrocidade? Hoje sou pai, um pequeno de seis anos, e é excruciante pensar que as crianças hoje em dia sofram tantos dilemas e problemas a ponto de criarem saídas terríveis como a que ocorreu hoje em Suzano.
Vale apontar que não sou especialista formado em nada que possa dar uma resposta concreta sobre isso. Não acho que o meu diploma de Direito possa responder isso. Mas certamente não é um impeditivo para me fazer pensar a respeito. Tudo aqui é apenas uma opinião de um cara de 34 anos, hoje papai, e que não tem boas memórias do tempo em que ia para a escola em sua adolescência.
Banalizamos a violência?
Talvez a primeira coisa que alguns políticos, especialistas de TV e afins dirão é que o mundo banalizou a violência e que isso tem refletido muito mal nas crianças e jovens, que crescem cada vez menos sensíveis as pessoas e o mundo ao seu redor. Não demorou muito para alguém vir e falar que os videogames são violentos demais e isso pode estar prejudicando as crianças. Putz, sério mesmo que é esse o discurso?
O Portallos é um site que fala 90% do tempo sobre videogames. Jogos eletrônicos são parte da minha vida adulta, tal qual foram quando fui adolescente e quando criança. Meu filho de seis anos está jogando Super Smash Bros. Ultimate no exatamente momento em que este parágrafo está sendo escrito. Jogos, por si só, não são a ameaça aqui.
Mas vamos lá, vou comprar esse argumento por conta de alguns pequenos detalhes. Crianças jogam coisas sem supervisão dos pais. Isso é real e mais comum do que talvez você ache que não seja. E nem todos os jogos são realmente boas influências para determinadas faixas etárias. Eu não deixo meu pequeno jogar jogos como Call of Duty, dado o realismo a qual o jogo trabalha com armas, mortes e a violência como estrutura fundamental para o jogo funcionar. Onde o game enaltece matar para se sobressair sobre um desafio.
Isso não só com jogos de guerra e matança de seres humanos e armas realistas. GTA é outro que não vejo porque crianças (menos de 10 anos só pra dar um número) deveriam jogar. E eu já vi casos de pequenos com a idade do meu filho jogando títulos estes mencionados. Eu sequer jogo games assim perto dele, justamente pelo “eu posso, você não“, pra não enaltecer fatores justamente errados em jogos assim (a qual não tenho nada contra e gosto de jogar).
O remake de Resident Evil 2, por exemplo, tem sido um problema pra mim. O jogo é bem visceral e não estou encontrando um momento para jogar sem que meu pequeno esteja orbitando ao meu redor. Mais uma vez, não quero enaltecer a violência visceral que o título possível, até porque não é esse o ponto realmente excelente do jogo. Todo jogo de terror realista tenho esse problema em casa.
O que estou tentando dizer? Jogos eletrônicos tem classificações etárias, assim como filmes, e por um bom motivo. A violência existe e pode ser sim enaltecida, mas normalmente é papel dos pais ficarem de olho nisso e saberem se seus filhos estão com a maturidade certa para entender aquilo a qual estão jogando. E muitos pais não acompanham ou sequer entendem o suficiente para fazer tal monitoramento.
Há um contraponto sobre tudo isso: videogames não são o único meio de entretenimento moderno que banaliza a violência em detrimento do entretenimento. Hollywood tem feito isso com filmes. A TV faz isso, e não só com a violência visceral, mas também banalizam valores e incentivam a ignorância cultural. O mundo do entretenimento tem esse revés hoje em dia, por conta da tecnologia de efeitos especiais que há décadas atrás não existia.
Mas jogos eletrônicos são um pouco diferente de filmes. Jogos são uma espécie de válvula de escape do mundo real. Eles levam a mente dos jogadores a novos mundos. Imersão é um ponto importante aqui. Não é surpresa o porque eles podem ser viciantes e também fazer mal. Então é claro que eles podem banalizar e vulgarizar valores, a ponto de permitir a simulação dos mesmos, em qualquer jogador. O quanto isso pode afetar uma criança que está jogando algo que claramente não foi feito para sua idade? Estudos devem dizer isso. Mas é algo que eu me preocuparia sim. Só estou longe de dizer que videogames são a causa. Não cabe a eles tamanha responsabilidade.
Somos péssimos pais?
Esse é outro ponto importante nessa minha reflexão. Qual o papel dos adultos hoje para com os jovens? E o quanto somos ruins em educa-los, assim como para entendê-los? Crescemos para nos tornar as vezes um reflexo de nossos pais. Se eles são ruins, talvez nós sejamos ruins também? Isso é algo que as vezes me dá pesadelos.
Dito não só isso, há realmente jovens que vivem enormes crises dentro de suas próprias casas. Violência e brigas domésticas, falta de carinho e amor, pais que não tem o menor tato para serem… pais. O peso do mundo recai sobre estes jovens, que precisam amadurecer para saber lidar com adultos problemáticos, que talvez sequer deveriam ter se tornado pais.
E pra ser justo, ninguém é perfeito, eu sei. Pais podem ser ruins, mas não porque são pais, mas porque são seres humanos ruins. Adultos sofrem de problemas e males que as vezes é inerente exatamente de uma juventude e condição econômica ruim que sofreram em toda sua vida. O ser humano, por si só, tem seus problemas. Estamos em um ciclo muito difícil de ser consertado. Um dos motivos pela qual acho o papel da educação das escolas tão importante e que em termos políticos, nossos governos (e não estou falando apenas o atual ou o anterior) tem vacilado muito com essa esfera.
Os jovens precisam de melhores modelos para terem como base para o crescimento pessoal. Se dúvida alguma. E é algo muito difícil em um mundo que tem vulgarizado e banalizado tantos valores. Onde a cultura tem ficado cada vez mais pobre e o emburrecimento mundial tem acionado alguns alertas por aí.
E tem mais: é difícil julgar o teto dos outros. Quem sou eu para dizer que sou um bom pai e que meu vizinho não é? Não poderia jamais fazer isso. O mundo dá voltas. As pessoas tem fases ruins, momentos ruins. E tudo isso vai para as crianças e jovens de formas diferentes, em momentos diferentes e com variações para cada pessoa. Não é uma matemática errada.
O ponto deste capítulo é apenas para dizer que as crianças e jovens estão carente de bons modelos. Nós, os adultos, não estamos tão preocupados com o crescimento da geração mais nova. Não estamos preocupados em lhes dar toda a base, suporte e amor que muitos destas crianças precisam para crescerem sendo muito melhores do que nós não somos.
Isso é claro, é uma visão muito genérica. Não estou dizendo que todos adultos são ruins, que todas as crianças também serão. Que jovens não podem ser tornar melhores que seus pais. Tudo é relativo, mas no geral, eu acho que a geração mais velha está lidando com os mais jovens de uma forma muito errado. Seja dentro de casa, seja dentro das escolas, seja até depois, quando chega o momento em que ela precisa amadurecer, no momento da faculdade, do nutrir um relacionamento, de entrar ao mercado de trabalho. A frustração de ter que se tornar um adulto tão ruim quanto todos nós somos e que talvez seus melhores dias tenham ficado desperdiçados.
Acabei divagando um pouco mais no parágrafo acima. Mas tudo bem, novamente quero dizer que este texto é só um exercício de reflexão. Enfim, tudo começa em casa. Pais precisam prestar mais atenção em seus filhos. Não quando eles estão lhe dizendo algo, mas justamente quando não estão dizendo. Precisamos aprender a trabalhar angustias, tristezas e frustrações deles, mesmo quando eles sequer percebem que estão sofrendo com algo.
Empobrecimento cultural?
Um último ponto a qual gostaria de discutir é sobre o empobrecimento cultural que tem existido em nossa sociedade de algumas décadas para cá. E é muito difícil falar sobre esse tema e acabar não sentido que alguém irá ficar ofendido. Estou pisando em ovos. É muito difícil também não esbarrar no “estou mais velho, quando era mais jovem isso aqui era bem mais legal“.
Enfim, o caso é que sou da opinião que o Brasil tem sofrida uma certa regressão em certas áreas culturais. A música, por exemplo, é um dos meios que mais me dá esse alerta de que as pessoas estão todas malucas no que a massa considera como os melhores hits. Não estou me referindo ao funk como um dos gêneros que mais faz sucesso hoje em dia, mas na forma como as pessoas estão produzindo estas músicas, com letras pobres e arranjos musicais ainda mais pobres.
A cultura como um todo tem sido má incentivada. A televisão aberta sempre foi e parece que sempre será uma piada. Jornais que vendem a tragédia cotidiana como fonte de sucesso. Programas de auditório que mendigam com a classe baixa e média pelo sucesso do ibope. A venda da baixaria, da vulgaridade, da tragédia, como meio de manter as pessoas hipnotizadas em telas inexpressivas.
Tem o mercado editorial, tanto de livros, quanto de quadrinhos, sofre no Brasil, um país gigantesco, com mais de 200 milhões de habitantes. Que diabos estamos fazendo para não gostarmos de livros? Repudiamos ler. É assustador isso. Já vi um jovem falar pra mim “credo” quando sugeri que o mesmo poderia passar um final de semana lendo um bom livro como meio de entretenimento. Credo, por quê? Desde quando ler um livro se tornou algo passível de novo? O que aconteceu?
Posso nesse ponto indicar uma edição recente do Podcast Café Brasil, episódio É Carnaval, em que o Luciano Pires e o pessoal da Panela produtora abordam um pouco sobre a construção da música atual aqui no Brasil, sobre esse empobrecimento cultural musical.
Isso tem um reflexo em toda a sociedade brasileira. Crianças, jovens e adultos. Estamos nutrindo pessoas vazias de conteúdo. Não é surpresa o quanto ódio, intolerância, ignorância são disseminados em tudo quanto é lugar, especialmente pela internet e redes sociais. Não estamos mais pensando, refletindo, debatendo. Parecemos animais jogando cocô uns nos outros em certos momentos. Vá ler comentários no Facebook sobre qualquer assunto polêmico ou contraditório para ver se não é exatamente isso.
A internet, aliás, tem sido palco de um cenário de emburrecimento em geral. As redes sociais tem ajudado muito isso. Ninguém mais quer ler nada (esse texto então… não terá muitos leitores, você que está lendo isso sabe o guerreiro que é por chegar até aqui). Memes, gifs, frases curtas incompreensíveis por erros de digitação ou pontuação são a forma de comunicação na internet. O que tem de gente que sequer usa a bendita interrogação ao pergunta algo pelas redes sociais.
E tudo isso tem reflexo direto na juventude. As crianças e os jovens sobre com o empobrecimento cultural. Isso os tornam mais suscetíveis a se tornaram adultos mais cedo, a enfrentarem angústias e problemas psicológicos de uma forma muito mais agressivos. Nós estamos mais os ensinando a pensar, a refletir. Não há mais essa apresentação do mundo em muito mais cores a qual a rica cultura pode agraciar o ser humano. Afinal, essa é uma das coisas que nos tornam totalmente diferentes dos animais. Nossas habilidades com arte. E arte é pensar, é sentir, é extrapolar sentimentos. E quando tudo isso é feito de forma pobre… bem… na minha opinião a sociedade só tem a perder.
Para terminar
Enfim, assim como normalmente são estes raros textos, em que boto para fora algo que está zumbindo em minha mente, não estou certo se tenho que concluir algo nesse momento. Não estou, é claro, querendo justificar ou sequer defender os assassinos do evento que ocorreu hoje em Suzano. E nem caberia, ambos estão mortos. Apenas nos resta tentar entender o que se passava na cabeça de ambos para conseguirmos entender um pouco mais o que tem acontecido com os jovens em nosso país. Isso talvez seja importante.
Não generalizando, é claro. Pessoas podem ter problemas psicológicos, serem doentes, e não refletir na massa como um todo. Não estou dizendo que todos os jovens são como estes. Longe disso. Mas o Brasil tem enfrentado estes problemas, tal qual Josias de Souza aponta em este artigo em seu blog. Estamos sofrendo um problema de crise de civilidade em nosso país.
E tenho pra mim que tudo está um pouco relacionado. A forma como banalizamos armas, a vingança e a violência. E da mesma proporção como também alimentamos estes sentimentos ruins, como o próprio problema do bullying nas escolas. Por que os jovens são tão maus uns com os outros? Sabe, é algo muito complicado. Vai de classe social, valores ruins, toda uma cadeia de má educação que também volta ao ponto mencionado lá em cima: vem de casa isso.
Hoje foi um dia realmente triste para o Brasil. Será que conseguiremos aprender algo com isso ou já banalizamos a tragédia e apenas aguardamos a próxima vir e nada mudar? É isso.