Análise | A Knight’s Quest
Disponível para PlayStation 4, Xbox One, Nintendo Switch e PC
A Knight’s Quest é uma aventura colorida, altamente inspirada nos clássicos jogos de aventura 3D de mundo aberto e desafios em plataforma de tempos mais simples. Desenvolvido pelo estúdio canadense Sky9 Games, e distribuído globalmente pela Curve Digital, teve seu lançamento acontecendo no começo de outubro, entre os dias 10 e 11, para todos os consoles da geração e PC. A versão utilizada para este review foi a de Xbox One. É um jogo que lhe apresenta a clássica jornada do herói.
Qualquer jogador de mais idade, ou até mesmo os mais novinhos nesse lindo meio de entretenimento, já jogou ou ouvi sobre aquele que escreveu a história dos jogos de aventura (mais de uma vez): The Legend of Zelda, série que sempre aparece nos consoles da Nintendo e que é consagrada no mundo dos games. Aqui, pense um pouco nos jogos mais antigos de The Legend of Zelda, de quando o 3D reinventou a franquia.
A Knight’s Quest soa inspirado e bebe um pouco desta popularidade nostálgica da fórmula dos Zeldas antigos mais icônicos. Talvez até exista uma discussão entre tentar demais se parecer como um The Legend of Zelda e conseguir entregar uma ideia apenas inspirada, porém diferente o suficiente para não ser chamado de cópia ou clone. Um ponto a qual acho válido discutir para entender o que o título oferece aos interessados em conhecê-lo.
Há espaço para ser algo próprio?
Rusty está explorando uma caverna e com suas ações acaba encontrando um cristal mágico. Ao se atrapalhar acontece o inesperado e, de repente, o mal é invocado ao mundo. Com isso toda a existência como a conhecemos pode acabar devido a um erro de Rusty. Assumimos então o controle deste jovem, e com isso cai em nossas mãos a responsabilidade de tentar consertar essa bagunça e salvar o mundo. De algo que o próprio protagonista causou.
Devo dizer que achei interessante o visual de Rusty, o jovem tem um braço mecânico e usa sempre um fone de ouvido gigante, com o qual recebe mensagens de sua amiga Valy, que obviamente é a mais esperta da turma e está sempre estudando sobre as lendas e dando instruções à Rusty, Informando-o onde é a sua próxima parada em sua jornada para consertar seu erro e salvar todo mundo.
A chegada deste mal causa um grande alvoroço na cidade e em uma reunião geral na frente da cidade, onde todos se lamentam pelo provável fim do mundo, ficamos sabendo diretamente da boca do prefeito Munsch sobre a lenda dos poderosos três guardiões, que com seus poderes poderiam dar cabo de tal maldade afligindo o mundo. Assim o prefeito incube a Rusty, que estava por ali não tanto por acaso, a missão de encontrar os três espíritos guardiões da famosa lenda. Os espíritos guardiões, por sua vez, estão bem espalhados por Regalia (o nome do reino), um está em Gusty Florest, um na Icy Mountain e o último no Fiery Desert.
A premissa é direta e a missão principal nunca é esquecida. O diálogo entre os diversos personagens sempre é alegre, embora possa parecer infantil algumas vezes. O que não chega a ser um problema, o jogo tem essa coisa colorida e extrovertida, justamente para encantar um público mais novo.
Mas espere um pouco, já não ouvimos ou passamos por algo parecido envolvendo cristais em outros jogos? A resposta é sim, pois A Knight’s Quest tem em sua veia esse e outros conceitos extremamente clichês em vários games de fantasia. Recordo que cristais encantados fazem parte da maioria dos jogos mais clássicos da série Final Fantasy, por exemplo. É comum histórias de fantasia trazerem esse conceito, de cristais que estão envolvidos em algo maior e podem causar destruição ou salvação, dependendo de como forem usados. E pra ser sincero, a própria ideia de despertar guardiões sagrados, de lendas e afins, também não é lá muito original.
Semelhanças não param por aí. Sabe aquela animação com música de quando abrimos um baú em algum Zelda, com aquela cena clássica do item ficar gigante sobre a cabeça do personagem e aquela musiquinha “TARARARAM”… pois bem, temos quase isso aqui também. E as semelhanças com Zelda não param por aí não… temos até o conjuntinho básico de escudo gigante (que após uma substituição passa a poder refletir tiros/flechas), espada sempre em mãos capaz de dar o golpe giratório carregado… tudo isso confere. Tem cara de algo que conhecemos, ainda que não exatamente isso.
Temos também uma verticalidade na exploração, com vários trechos de pular em plataformas e até as clássicas corridinhas na parede, algo bem parecido com o que víamos em Prince of Persia, uma franquia deixou saudades, diga-se de passagem.
Normalmente jogos não nos fazem ficar pontuando o que são parecido com outros clássicos do passado, porém tem algo em A Knight’s Quest que nos coloca a pensar sobre estes clichês. Talvez porque o jogo não consiga exatamente pegar estas ideias e transformá-las em algo propriamente original para si mesmo. Não que isso seja ruim, a mistura de clichês e elementos oriundos de outros jogos deixa o jogo divertido, mas quase nunca o dá uma cara própria.
Conhecendo sua atmosfera
O mundo de A Knight’s Quest é vasto e temos muito território para explorar, sendo este dividido em cidades, montanhas, campos e cavernas, estas por sua vez repletas de puzzles, tesouros e, sem esquecer, é claro, dos combates contra monstros, esqueletos, morcegos, e por aí vai. Uma pena é que teremos que gastar muita sola de sapato para explorar esse mundo, pois no tanto que joguei os fast-travels não estavam funcionando da forma esperada. Somente me levavam para fora dos dungeons e não de volta a cidade… e isso me levava a ter que voltar as cidades todas as vezes.
Os quebra-cabeças chamam a atenção desde a primeiro dungeon, que fica acessível após adquirirmos a magia do vento (permitindo assim a utilização de uma rajada de vento no formato de um mini redemoinho). Aqui estas rajadas vão ser utilizadas na movimentação de cata-ventos que nos levará a modificação de áreas do cenário, movimentação de plataformas, portas, grades, paredes e pilares. Esse conceito de adquirir habilidades para acessar novas áreas e novas dungeons segue toda a progressão de sua campanha.
Pra mim, onde A Knight’s Quest mais brilha são em seus quebra-cabeças, desafios de plataformas e mapa diversificado. Resolver muitos quebra-cabeças do jogo é um feito gratificante. Os fãs de plataformas apreciarão a mecânica do muro, evitando obstáculos perigosos, como pontas e serras, e descobrindo como descobrir novas áreas do mapa. A verticalidade das áreas do mapa também enriquece a exploração, recompensando a curiosidade de um jogador com baús e itens colecionáveis.
Inimigos e confrontos
O combate aqui não é assim tão difícil de ser dominado, embora cause alguns problemas às vezes, quando optamos por tentar usar a esquiva, que é bem difícil de ser dominada. Temos um botão para ataque com a espada, outro para a defesa (ao pressionarmos ele e o botão de uso de item podemos refletir flechas e magias – isso ocorre mais à frente do game, quando adquirirmos tal habilidade), o analógico da esquerda que obviamente movimenta Rusty, há também um comando para fixar o alvo nos inimigos (mas não é bem desengonçado, não se engane achando que vai ajudar), um botão dedicado as esquivas e o botão para as magias que Rusty também aprenderá pela jornada.
Todas as áreas guardam alguns inimigos mais fortes que não podem ser derrotados uma primeira vez em que forem vistos, pois não teremos a capacidade necessária. Essa ideia me soa um pouco como a mecânica que existe em The Legend of Zelda: Breath of the Wild, na ideia de deixar o jogador encontrar aquilo a qual não pode dar conta momentaneamente. Normalmente o jogador requer alguma arma ou habilidade necessária para lidar com estes inimigos. Não é exatamente uma questão de level up. O jogo quer que você siga adiante, e na próxima vez que cruzarem novamente contra estes adversários o destino pode nos dar a chance necessária para vencermos em um novo duelo.
As batalhas contra chefes oferecem um desafio interessante envolto com momentos de descoberta. Não teremos ninguém nos dizendo o que ou como fazer, teremos que analisar a situação apresentada e bolar a estratégia que vai nos levar a vitória, consequentemente nos levando a adquirir uma nova magia ou habilidade no final do mesmo. Lembre-se os chefes apresentados acabaram de derrotar os espíritos guardiões dos templos então, digamos que eles não sejam tão fracos assim. Suas batalhas são memoráveis e realmente bem planejadas. Apenas o combate rotineiro não empolga muito bem, sendo desengonçado e um tanto sem graça.
Em busca de um pouco de humor
Outro ponto que me chamou a atenção foi que o título tem sua certa dose de bom humor. Daquela vai lhe levar a dar aqueles sorrisos bobos sozinho. Só lamento que temos que acompanhar toda a ventura em inglês ou em outro idioma estrangeiro de sua escolha, exceto o português, que não é uma das opções disponíveis. E há muitos segmentos de textos que ditam os rumos em que o jogador deve ir. Não acompanhar o texto talvez torne um pouco da progressão meio confusa.
Sobre o tom de humor, posso dar um exemplo. Logo que chegamos na cidade de Regalia temos o jovem Jeck, que além de lhe dar uma bronca por você ser o responsável pelo provável fim dos tempos, entra em pânico por talvez ficar sem leite hahaha e logo mais em um conjunto de banheiros públicos um indivíduo pede algo mais macio que papel para se limpar… e sim, essa acaba se tornando uma missão opcional do game.
Outra tirada cômica é que toda vez que Valy entra em contato com Rusty ele realiza uma dança engraçada quando ouve a música da chamada. Eu achei realmente engraçadinho e nas primeiras vezes me arrancou um sorriso no rosto do jogador. Há também o pequeno caracol que te cobra para curar sua energia na sua fonte especial e que se chama “Alexandre o Grande”. E cá entre nós, ele não é grande não.
Essas pequenas interações criam um sentimento bem humorado com o jogador que se deixar levar por essa brincadeira. E tem muito mais gente maluca nesse mundo. Puxar conversa com todos os NPCs que você encontrar acaba se tornando um passatempo divertido, e pode render cenas hilárias ou apenas mais atividades secundárias, como encontrar fogo para a forja do ferreiro ou minérios a qual seremos recompensados com uma picareta pelo minerador da cidade.
O único problema na exploração deste mundo tão grande pode ser não existir um caminho determinado para os templos dos guardiões, todos eles ficam bem afastados da cidade, que acaba sendo o ponto central do game. Temos marcado no mapa o destino final e uma bússola no topo da tela, mas não temos como imaginar quanto tempo demoraremos para chegar até lá e nem como chegaremos, pois a marcação de sua localização no mapa somente muda quando trocamos de tela e temos o loading, antes disso nada é salvo e nada muda no mapa. Essa parte do save é um detalhe bem preocupante, requer que o jogador fique sempre atento antes de parar a aventura, certificando-se de quando foi a última vez que salvou seu progresso (e não há save manual).
Considerações finais
A Knight’s Quest certamente não é nenhum The Legend of Zelda ou Prince of Persia, mas o título realmente se esforça para soar como um pouco de cada. Só é preciso ponderar as proporções disso, especialmente sendo um jogo independente, o que claramente significa que seu orçamento é menor do que tais produções famosas.
Certamente o título acerta em deixar o jogador brincar e explorar seu mundo aberto, criando ótimos momentos de desafios em plataforma em um ambiente tridimensional, do tipo que realmente não se vê tanto hoje em dia. Soa apenas problemático que com tudo isso seu sistema de save não seja tão amigável e camarada, fazendo o jogador tomar cuidado ao morrer ou até mesmo a bugs e crashs que o jogo pode ter. Um save manual certamente faria a diferença aqui.
Já a parte do combate, este sim parece ser o elo mais fraco de A Knight’s Quest, entregando ao jogador um sistema bem singelo, sem peso ou impacto na hora de usar golpes, com baixa resposta dos inimigos sobre a eficácia de seus golpes. Vira um sistema de apertar um botão e desviar uma vez ou outra. Não tem uma tecnicalidade que poderia ter. Mais a frente da aventura, quando se consegue mais habilidades elementos, esse sistema melhora um pouco, entrando ao jogador novos equipamentos, como luvas para combate com punhos com elemento de fogo ou um martelo de gelo que pode congelar certos elementos. Isso torna um pouco do combate mais complexo, mas nunca melhora nessa parte de resposta de batalha e impacto das coisas em inimigos.
Os puzzles merecem elogios. São interessantes e o jogo não fica pegando na mão do jogador para ensinar seus soluções. É preciso pensar, observar e tentar. Não é todo jogo que tem essa paciência com o jogador, mas aqui o jogo consegue ter. Some isso as interessantes batalhas de chefes, e nesse sistema que cabe a você descobrir como derrotá-los. Além disso há todo um mundo aberto realmente grande, que lhe deixa explorar cantos à vontade, expandindo um pouco o valor de replay do jogo, com uma quantidade legal de missões e atividades secundárias. A trama talvez seja clichê, mas isso é apaziguado com uma escrita bem humorada, que deixa a coisa menos séria e mais natural ao resto dos elementos apresentados.
Sendo assim, dá para concluir que se levarmos tudo na obrigação e terminar a missão principal o mais rápido possível, e não tivermos muito senso de humor para rimos das piadas internas que nos são apresentadas, e apreciar os pontos em que o jogo consegue entreter, certamente você pode enjoar do game rapidamente, levando inclusive a achar que estão faltando várias coisas. Talvez até estejam, mas lembre-se do escopo mais modesto, vindo do segmento de jogos independentes. Olhe para A Knight’s Quest com um pouco mais de cuidado e sem tanto comprometimento. Não leve a mal tudo o que parece se inspirar, sem tentar reverter para algo seu. Aprecie seus pontos divertidos, pois querendo ou não, este é um gênero realmente difícil para um estúdio pequeno trabalhar. O resultado aqui é, ao final das contas, dignos de elogios, mesmo com pequenos problemas. Vale aos curiosos.
Galeria
Dando uma nota
Tom bem humorado faz que o jogo não se leve muito a sério - 8
Mundo realmente grande e visualmente agradável - 7
Locomoção pode ser cansativa e os pontos de save não são nada generosos - 6
Combate é fraco, sem impacto, carente de melhor refinamento - 7
Quebra cabeças são inteligentes e não pegam na mão do jogador - 8.5
Ótima verticalidade, bons desafios em plataforma - 9
Inspirado em clássicos como Zelda e Prince of Persia, com um certo exagero - 7
7.5
Bom
A Knight's Quest é um jogo independente que entendo que tem limitações, mas que mesmo assim tem um escopo que desafia essa lógica. Ele tem inspirações fortes em grandes títulos e muitas vezes não consegue pegar estes elementos e criar algo pra si, o que talvez o enfraqueça um pouco. A exploração de mundo aberto, desafios em plataforma, puzzles e chefes são seus pontos altos, trazendo problemas apenas aos sistemas de salvamento e confrontos normais que não possuem um impacto correto para torná-los mais interessantes. É um título que vale a curiosidade, especialmente se você sente falta desse gênero e estilo de gameplay quando não agregado a grandes franquias da indústria.