Análise | Exit the Gungeon
Disponível para Nintendo Switch, PC e Apple Arcade
Exit the Gungeon surgiu como um spin-off do incrível Enter the Gungeon, um indie game de bastante sucesso, lançado originalmente em 2016. Esta sequência, também desenvolvido pelo estúdio Dodge Roll, enquanto mantido a parceria de distribuição com a Devolver Digital, surgiu em outubro do ano passado, no lançamento do serviço de jogos Apple Arcade, mas teve um pouco mais de visibilidade agora no último mês de março, quando finalmente chegou ao Steam e Nintendo Switch.
Diferente do jogo que deu origem a esse universo – um jogo isométrico de tiro dedicado a elementos roguelike -, Exit the Dungeon é um jogo de tiro em plataforma com tela fixa, que aposta em uma simplicidade maior do que o jogo anterior, mas sem que haja a perda dos elementos originais que o torna tão viciante e divertido. Aqui também estão de volta os elementos aleatórios, mas eu os colocaria como um roguelite. O que torna o jogo menos punitivo e até mesmo menos imprevisível que a primeira aventura no Balabirinto.
Também faço elogios a ótima ideia do título. Se no primeiro os jogadores tinham que adentrar em uma masmorra que porta uma arma lendária que pode matar até mesmo o “tempo” como o conhecemos, a qual muitos buscar “matar o passado”, aqui o objetivo é justamente fugir desse local batizado de Balabirinto. De tanto usar a lendária arma, os exploradores desestabilizaram o Balabirinto e o local inteiro está prestes a ruir. Agora todos aqueles que estão lá dentro devem escapar antes de tudo vir abaixo.
Gosto dessa objetividade que ambos os títulos da série Gungeon entregam de cara aos jogadores. É uma boa sacada para uma sequência – ou série derivada, se preferir chamar assim – sem ter que repetir o título anterior e colocar apenas um número sequencial.
A saída é subindo
Sua meta então é escapar antes da destruição do Balabirinto, que continua recheado de balísticos inimigos querendo lhe matar. O conceito de design vem do jogo anterior, a qual é um mundo envolto em poderosas armas e na qual os inimigos em grande parte são projéteis vivos. Há muitos elementos que brincam com essa ideia. Enter the Gungeon, o primeiro jogo, brinca com essa ideia para entregar aos jogadores o que chamamos de bullet hell, um jogo em que há tiros por todos os lados, a qual pesa na jogabilidade o desafio de conseguir desviar de uma enxurrada de balas enchendo o ambiente. Exit the Gungeon respeita muito esse conceito.
A mudança na perspectiva da tela não muda essa ideia do jogo. O desafio ainda está em desviar insanamente de diversos projéteis que serão colocados em sua direção, enquanto tenta lidar com diferentes classes de inimigos, que surgem de diferentes direções. É um shooter que não lhe deixa ficar parado um segundo sequer. A grande diferença é que no primeiro o jogador explorava um ambiente amplo, com aquela visão superior, enquanto tentava encontrar a saída para o próximo andar, e aqui temos um esquema de tela fixa a qual o jogador deve sobreviver hordas e mais hordas de inimigos, sem ter como avançar pelo cenário para se esconder ou respirar.
Isso se dá por conta de uma nova abordagem que é dado ao Balabirinto em meio a sua destruição. O jogador não tem mais como subir os andares convencionais a qual utilizou no jogo anterior. A fuga precisa ser improvisada e para isso há um personagem que está ao fundo do Balabirinto que improvisou um esquema de elevadores, mas estes ainda seguem repletos de inimigos que querem a sua cabeça. Preso em um elevador, não há muito para aonde ir, e aí o jogo empresta mecânicas de plataformas para dar mobilidade ao jogador, permitindo assim que ele pule para lá e para cá enquanto desvia de tiros, seguindo atacando tudo aquilo que olhar feio pra ti e aguardando o elevador subir até um andar em que uma troca precisa ser realizada, até o topo do Balabirinto.
Cada um em seu elevador
Ao todo são cinco níveis de elevadores, mas o legal é que o jogo inicialmente disponibiliza quatro personagens e cada um deles tem seus próprios estágios de elevadores, com a exceção do primeiro, que é comum a todos. Dentro da história é como se cada um tomasse um caminho diferente para o topo, o que incentiva o jogador a testar todos os personagens e caminhos. Uns são mais fáceis, outros nem tanto. E todos são bem criativos.
Há elevadores que podem se mexer, fazendo o jogador se deslocar minimamente para esquerda ou para a direita, enquanto tenta desviar de obstáculos que não podem se prender na sua plataforma. Em outro, as plataforma estão presas por balões, enquanto que espinhos ficam caindo para estourar estes balões, que são repostos após um tempo. Em outro, as plataformas se tornam inimigos que passam a atirar em você se ficar muito tempo sem pisar nelas. Há elevadores que se mexem, com um buraco no meio e até mesmo um que se torna um vagão de um trem, o único momento em que existe a sensação de avanço lateral do jogo, já que em todos os demais você está sempre subindo. Mas até mesmo neste elevador do vagão de trem, a tela é estática em um vagão, não permitindo o jogador avançar para outro. O que casa com toda a estrutura proposta.
Entre as trocas dos elevadores, o jogador encontrará a lojinha que permitirá comprar itens, desde aqueles que repõem a sua saúde, para aqueles que oferecem habilidades bônus durante aquela partida. Se continuar subindo, eventualmente também haverá outras salas especiais, a qual personagens libertados irão surgir para lhe dar uma mãozinha extra com itens ou até mesmo oferecer participar de certos mini games para também ganhar itens raros.
E tal como mencionei, o título possui a estrutura de um roguelite, o que significa que cada partida é única. Morrer significa recomeçar tudo novamente, perdendo os itens comprados ou adquiridos em fase da partida anterior. Nesse esquema dos elementos aleatórios estão as hordas de inimigos, que nunca surgem nos mesmos locais ou mesmas ordem, assim como os chefes encontrados ao final de cada estágio. Você nunca sabe qual irá trombar, independente do andar que chega para trocar de elevador.
A única coisa que se mantém fixo em Exit the Gungeon, além da ordem dos elevadores de cada personagem, é a habilidade ativa de cada personagem. Todos possuem uma. Por exemplo, um deles tem uma mira melhor ajustada, enquanto outro em um pequeno animal de estimação que fica recolhendo itens de forma automática. E mesmo estas habilidades podem ser encontradas nas partidas, pois itens e habilidades também surgem de forma aleatória.
Armas sortidas, sorte ou azar?
Talvez o elemento mais controverso em Exit the Gungeon e que colabora com os elementos aleatórios que tornam cada partida única diz respeito ao esquema das armas que são colocadas à disposição do jogador. Aqui é esquema é bem diferente do jogo anterior. Lá o jogador podia manter as armas preferidas para usar até o final da partida, enquanto recusava ou trocava entre as que melhor eram oferecidas. Diferente do esquema aqui, a qual seu personagem é abençoado com uma mágica ao começo de cada partida que faz com que sua arma fique mudando e alternando em diferentes armas.
Essa troca é feita em questão de pouco tempo. Não acredito que sequer fique com uma mesma arma por um minuto inteiro. Isso cria o efeito sorte e de se adaptar à situação dependendo com a arma que estiver em sua posse por essa questão de segundos. Boa parte do arsenal é inclusive conhecido por todos que jogaram o primeiro. E há armas boas e armas muito ruins!
Cada arma tem um tipo de dano, um formato de disparo e até mesmo uma cadência mais rápida ou lenta de tiros. Há uma arma que solta uma bigorna que precisa se manter o botão de tiro pressionado por agonizantes milissegundos, mas que causa uma grande devastação. Não posso dizer a mesma coisa de uma outra arma que lança um projétil verde que também precisa ser carregado, porém que causa menos dano, mas com a “vantagem” que de ficar rebatendo na parede. O mesmo vale para o inverso, armas que tem uma cadência muito grande de tiros, porém que causam pouquíssimo dano, a exemplo aqui posso citar uma arma que dispara pregos que tem um péssimo raio de acerto.
Em grande parte do jogo, estas armas atrapalham mas não estragam o desafio, que está justamente em se adaptar a estas situações. O ponto que mais me incomodou mesmo foram as vezes em que armas ruins surgem em batalhas contras chefes. Aí o jogo frustra um pouco o jogador, entregando uma partida a qual boas armas saem contra inimigos fracos e na hora em que se precisa de um poder de foco para um chefe, o jogo fica lhe dando armas ruins, com uma cadência baixa de tiros ou que precisa ficar carregando. Aí a paciência vai para o ralo, enquanto a saraivada de balas dos chefes não lhe dão um momento de descanso. Entendo que faz parte da dinâmica, mas tenho a sensação de que o primeiro game me deixava ter um controle melhor das minhas decisões de como entrar no combate de uma situação. Aqui a sorte e o azar podem desbalancear a capacidade do jogador em lidar com o desafio proposto.
Claro que parte disso tende a ir melhorando conforme partidas são perdidas e novas tentativas são realizadas. Derrotar qualquer chefe do jogo, seja do primeiro, ou adiante, garante ao jogador uma moeda especial que pode ser gasta em uma loja no fundo do Balabirinto (o hub do jogo), a qual novas habilidades, e mais importante, novas armas são destravadas. E assim armas destravadas passam a aparecer na rotatividade aleatória das partidas. E estas armas tendem a serem melhores do que as básicas das partidas iniciais, colocando uma maior variedade de armas boas, frente as armas que você pode considerar ruins.
Entretanto há que se elogiar a criatividade da equipe de desenvolvimento da franquia, pois as armas da série Gungeon são extremamente criativas, e até mesmo engraçadas em algumas delas. Há, como mencionado, uma arma que atira bigornas, em outra a arma é uma guitarra que dispara notas musicais, assim como uma que é um botão de D-Pad que atira para quatro direções simultâneas. Há armas que atiram caveiras, outra setas, armas que tocam música enquanto atiram, que atiram pinhas e tijolos. Armas de gelo e armas lasers. Há bazucas, rifles de snipers e mísseis. O mais engraçado talvez seja arma que é uma bala que atira pistolas – sim, isso não está errado.
Considerações finais
Exit the Gungeon acaba possuindo um escopo menor do que o primeiro jogo desse universo, mas nem por isso torna-se um título inferior. A proposta de ser algo de partidas rápidas, porém com bastante agitação casa com a proposta, tanto por ter saído primeiro em uma plataforma mobile (Apple), quanto até mesmo no Nintendo Switch, que tem uma boa acessibilidade com jogos portáteis. A meu ver combinou. É um título que se tivesse surgido na geração passada, casaria totalmente com a proposta da Xbox Live Arcade.
Não posso dizer qual a sensação de jogá-lo em um smartphone, pois meu teste na aventura se deu pelos controles do Nintendo Switch. Até mesmo com controles tenho lá algumas ressalvas. É uma jogabilidade difícil de se acostumar, ainda que depois fique mais natural. Use-se muito os gatilhos, ao invés dos tradicionais botões ABXY, que ficam meio sub-inutilizados, enquanto que o analógico R passa a ter importância para controlar a mira. Fica aquele jogo meio com os dedos todos espalhados, saca? Mãos aberta. Tem um dedo no analógio L para se movimentar, outro no analógico R para mirar, enquanto os botões de gatilhos e bumbers servem para a esquiva e o tiro, em uma dança frenética. E tudo bem, faz sentido os comandos que dão os verbos da ação do jogo estarem nos botões superiores já que o analógico R precisa estar em uso constante. Mas é difícil de acostumar. Vendo meu pequeno (de 7 anos) testando, não acostumado com isso, senti que ele se frustrou um pouco ao começar, mas eventualmente acabou pegando o jeito.
Aliás, já mencionando o filhão, ficamos meio triste ao descobrir que o título não tem nenhum função que o faça funcionar em multiplayer. Como saiu primeiramente em smartphones até faz sentido isso, mas era de se esperar que em consoles pudesse haver algum aprimoramento. É um jogo que poderia permitir partidas em modo cooperativo para dois jogadores, como o primeiro permite, que agregaria bem mais valor a obra. Me soa como um desperdício de oportunidade para aprimorar todo o conjunto da obra.
No geral, Exit the Gungeon me conquistou. Tem uma bela pixel arte, que parece em alguns momentos até mais bonita do que o jogo anterior, com um excelente trabalho tanto na trilha sonora, quanto nos efeitos dos disparos das mais diferentes armas, a ponto do jogador conseguir identificar as mesmas apenas com o som das balas.
Gosto como o jogo tem esse elementos aleatórios que tornam as partidas únicas. Há perks e habilidades dão uma sacudida nas partidas, desde aquelas que aumentam os projéteis, para as que desaceleram o tempo e até mesmo botas que ao pular causam dano quando se volta ao chão. Tem de todos os tipos, e podem ser adquiridas nas lojas em cada andar em que se troca de elevador, outro surgirem flutuando nos estágios e funcionarem apenas temporariamente. São elementos que brincam com a ação e com as mecânicas na hora do combate.
Com isso vem o senso de progressão que o jogo apresenta. Mesmo com elementos roguelite, o jogador vai aperfeiçoando sua experiência dentro da ação. Há celas que são encontradas no meio do segundo elevador que permitem libertar NPCs presos no Balabirinto, e assim eles vão surgir posteriormente, no avanço pelos elevadores ou na sub-fenda, que é de onde você começa as partidas e serve como Hub. Depois disso, vendedores surgem para lhe oferecer destravar novas armas, itens e habilidades que vão surgir quando for tentar escapar novamente do Balabirinto. Então morrer e recomeçar nunca é perda de tempo, pois sempre há algo que pode vir a ser destravado. Inclusive os quatro personagens iniciais não são os únicos oferecidos aqui. Há mais dois que são destravados cumprindo certas condições ao finalizar o jogo.
Exit the Gungeon é um pouco curto. Suas partidas tendem a levar entre 15 minutos há 30 minutos (caso você consiga escapar). Mas fechar o jogo, logo de cara, nesse tempo, me parece impossível. São horas e horas testando personagens, destravando coisas até a realmente ficar bom. E mesmo vencendo e escapando do Balabirinto, não significa que você nunca mais vai querer jogar o título. Seu valor de replay está justamente em apresentar algo que é repetitivo de forma proposital, sem que haja perda da diversão. É um destes jogos perfeitos para partidas rápidas para aquele momento em que não dá para jogar algo muito expansivo.
Com um charme singular, somado a um alto valor de ser viciante e divertido, Exit the Gungeon cumpre tudo aquilo que se propõem a ser. Entrega algo emocionante, instigante, que forma uma repetição sem ficar maçante, em um universo criativo e original. Entrega um desafio de boa qualidade, em meio a fases repletas de adrenalina, intercalando com um senso gostoso de descoberta e interessantes chefes que sempre vão lhe deixar atento a querer decorar seus movimentos e encontrar sua própria técnicas para derrotá-los com o menor dano possível afim de manter-se saudável para o próximo elevador. É um game bem arcade, mas com todo o mérito desse segmento. Soa como uma excelente indicação para quem estiver afim de algo nessa direção de diversão com um videogame.
Galeria
Dando uma nota
Segue o universo e elementos do primeiro jogo, sem a perda da essência - 8
Nova perspectiva de tela combina com a jogabilidade repleta de adrenalina - 7.5
Elementos roguelite garantem o valor de replay, evitando que se torne enjoativo - 7.8
Ótimos chefes, oferecendo um bom desafio - 8
Armas aleatórias que ficam mudando tem prós e contras - 6.5
Efeitos de som e trilha sonora merecem seus elogios - 8.5
Excelente para partidas curtas, mas é uma pena que não haja multiplayer - 7
7.6
Bom
Exit the Gungeon é um divertido jogo de ação em plataforma que mistura shooter bullet heel com elementos roguelite. Honra suas origens e não se perde ao apostar em uma novas perspectiva, em meio a ideias mais simples. Oferece um bom desafio, enquanto recompensa a persistência. É um excelente jogo para rápidas partidas e com alto valor de replay para esse estilo bem arcade.