Análise | Uncharted: Drake’s Fortune – Remastered (revisitando)
Disponível para PlayStation 4
Uncharted: Drake’s Fortune é uma aventura originalmente lançada em 2007, para o PlayStation 3, que se apreciado cerca de 15 anos depois de sua estreia ainda pode trazer certo encanto, colocar em perspectiva em como jogos de aventura e ação em terceira pessoa ainda podem ser marcantes, sem o atual inchaço de durabilidade que muitos dos atuais games entregam simplesmente por acharam que quanto mais, melhor.
Já mencionei aqui no site, por diversas vezes, que passei alguns anos afastado dos consoles da Sony, basicamente pulando as eras dos PS3 e PS4, atraso este que venho tirando aos poucos, desde que adquiri um PlayStation 5 ano passado. E a franquia Uncharted é uma destas séries que nunca tive a oportunidade de conhecer com mais afinco. Então, achei que seria divertido fazer essa viagem ao passado e conhecer onde tudo começou.
Para isso resolvi jogar a versão remasterizada do jogo, lançada em 2015, para PlayStation 4, dentro da coletânea Uncharted: The Nathan Drake Collection, pois roda tranquilamente no PS5. Obviamente irei jogar as demais sequências, contudo para esta vez, achei que seria legal e interessante fazer essa viagem exclusivamente pela primeira aventura de Nathan Drake.
Apesar de conhecimento de senso comum, nunca deixo de comentar os desenvolvedores dos jogos aqui analisados. Neste caso, a série Uncharted é criação da Naughty Dog, uma subsidiaria da Sony Computer Entertainment, que a adquiriu em 2001. Estúdio por trás da criação de franquia icônicas no PlayStation, como os primeiros jogos de Crash Bandicoot e Jak & Daxter.
Quanto aos cuidados com a versão remasterizada da coletânea do PS4, esta ficou a cargo do estúdio Bluepoint Games, que também detém outros remasters e remakes em seu portfólio, como o de Shadow of Colossus de 2018 e Demon’s Souls de 2020. Recentemente, em setembro do ano passado, o estúdio também foi adquirido pela Sony.
Envelhecimento de um clássico
Explicar com muitos detalhes do que se trata Uncharted: Drake’s Fortune, 15 anos depois de seu lançamento original, me parece algo completamente desnecessário. São raríssimos os casos como o meu, de jogadores que nunca tiveram muito contato com a franquia. Acho que a discussão que vale a pena aqui é se o jogo envelheceu desde então e se ainda é divertido sua apreciação, especialmente com tantos outros jogos que existem no atual mercado. Drake’s Fortune ainda é relevante?
Veja bem, trata-se de um jogo de aventura com perspectiva em terceira pessoa, com muitos seguimentos de shooter, segmentados em um misto de exploração linear e avanço por plataformas. Poderia mencionar os puzzles, mas estes são bem singelos mesmo, estão ali pela intensidade da narrativa de caça ao tesouro e nada mais.
Fazendo um olhar ao passado, retrocedendo a geração de games em que o jogo foi lançado, e considerando especialmente que este é um título que veio seis anos antes do reboot de Tomb Raider, os elementos que o jogo entregam são bem impressionantes. Uncharted tem certos elementos que soam inspirados dos clássicos jogos de Lara Croft, contudo possui elementos bem distintos, e assim nunca soa como um clone ou cópia. Além disso, seu mérito é tanto que o reboot de Tomb Raider, em 2013, também parece ter muita inspiração do que a franquia Uncharted já estava fazendo em sua época.
Outra ponderação temporal é que o sistema de cover wall (se esconder nas muretas) veio aproximadamente um ano após essa mecânica de combate fazer um sucesso tremendo em Gears of War, no console concorrente da Sony. Só que até nisso ele é ligeiramente diferente, menos pesado, até mesmo menos essencial, está ali porque faz sentido estar. Contudo o que realmente me chamou a atenção foi a mudança da mira entre os ombros do personagens, alterando a direção entre esquerda ou direita. Algo que é tão comum em certos jogos hoje em dia, mas que naquela época, não eram tão comum assim a flexibilidade de mudar a posição do personagem na tela para atirar em tempo real da ação. É uma mecânica que já estava pensando a frente de seu tempo.
Também é muito bacana como Drake’s Fortune consegue trazer aquele DNA que a própria Naughty Dog apresentava quando trouxe ao mundo Crash Bandicoot, com segmentos em que Nathan precisa correr em direção a tela, fugindo de algo que está lhe perseguindo, sejam criaturas bizarras, ou dezenas de veículos já que os vilões aparentemente possuem uma “concessionária” de jipes dentro da ilha a qual buscam o tesouro. Esse segmento do jipe é muito maneiro, especialmente para a época em que foi feito.
E toda a aventura não se resume apenas a ser a mesma coisa sempre. Há estes segmentos de fuga, tem então os momentos em um jet ski, a qual convenhamos que os controles não são os melhores do mundo, já que impossibilitam dirigir e atirar ao mesmo tempo, algo que o jogo deveria possibilitar já que ele colocar a ideia de que enquanto Nathan dirige, Elena atira, mas tudo bem, novamente dou o braço a torcer pela época em que isso foi idealizado. E toda a ventura segue com esse misto de situações em que o jogador está explorando um ambiente, ainda que bem linear e sem duplos caminhos, em meio a hordas de inimigos que vão surgindo conforme o jogador vai eliminando-os, algo bem característico dessa geração PS3/X360.
Na hora da trama brincar um pouco com puzzles, dada a temática de caça ao tesouro, a minha impressão é que a Naughty Dog realmente quis se distanciar um pouco do que Tomb Raider sempre soube brincar, dando ao protagonista de Uncharted um caderno que basicamente tem todas as resposta. Você segue a trilha de migalhas ali do caderno e está tudo certo. Não existe uma quebra de ritmo, então funciona, ainda que me decepcione um pouquinho.
Até mesmo nas partes de plataformas o jogo é muito bem idealizado para sua época, trazendo muito do que o reboot de Tomb Raider reciclou alguns anos depois, como os raríssimos quick time events e plataformas que o jogador precisa pular rapidamente porque a mesma está se esfarelando com o peso de Nathan. É bem bolado, ainda que hoje em dia isso já não seja nenhuma surpresa. Mantém a boa essência que um game de espaço tridimensional que se utiliza de saltos e plataformas.
A parte do combate de tiroteio, essa sim talvez seja o elemento do jogo que mais envelheceu, sentido o peso de uma era depois com tantos jogos de tiro em terceira pessoa. Apesar que… para a época em que foi lançado, pensando no estilo de tiroteio do primeiro Gears of War, sinto que eu já teria achado que o combate em Drake’s Fortune inferior ao que outros jogos estavam fazendo naquela época, até mesmo pensando que Dead Rising, da Capcom, é dessa época também (2006).
Não que seja ruim o combate, ou seu sistema de cover. Só é… estranho. Melhor dizendo, ele entrega uma sensação bem de arcade shooter, fora que é um pouco impreciso na questão de headshots. Houve um momento do jogo em que simplesmente estava contando quantas balas de cada tipo de arma eram necessário para eliminar os inimigos, independente de onde os acertassem, com exceção da cabeça. Com o tempo, os mesmos inimigos, passam a ficar mais resistentes, exigindo mais tiros da mesma arma que até então os eliminavam com menos balas. Dá uma sensação bem de um… videogame. E tudo bem, antes que alguém queira me condenar por dizer isso.
E talvez o próprio jogo entenda isso, especialmente quando limita ao jogar apenas carregar dois tipos de armas, uma de porte menor, como uma pistola ou submetralhadora, ou um fuzil ou espingarda. Acaba sendo um sistema de equilíbrio, entre manter uma arma que você se dê bem, ou pegar o que estiver ao seu alcance porque a munição está acabando. Dito isso, a meu ver a pistola é simplesmente a melhor arma do jogo, sendo mais eficiente do que o fuzil, que apesar de causar mais dano, exige muito mais munição do jogador e é menos precisa do que a pistola, a qual os tiros quase sempre certeiros.
Simplicidade a serviço da qualidade
Apontar que um jogo possui simplicidade muitas vezes é colocado como uma crítica em relação a certa obra, mas essa característica nem sempre precisa ter tal conotação. Jogos podem ser complexos e isso podem comprometer sua experiência. Jogos podem ser complexos e estragar o trilho de jogabilidade que estava sendo construído. Ser simples, ajuda no dinamismo de uma obra, além de permitir o bom trabalho de ritmo da experiência.
Simplicidade não precisa aqui ter a conotação de algo normal ou medíocre. Nada disso. Nos pontos em que Drake’s Fortune se propõe a criar, ele o faz muito bem. A atmosfera de aventura funciona, os personagens são cativantes, especialmente a dinâmica de Nathan com a Elena, enquanto o gameplay te vende um bom ritmo de aventura, entre situações diversas, dentro das limitações que existiam a época em que o título foi desenvolvido. Lembra aquela pergunta que fiz alguns parágrafos acima? Este jogo ainda é relevante?
Penso que sim. É uma obra que vale a atenção e o estudo, de como boas ideias constroem uma franquia, sem que uma enxurrada de coisas incham a proposta e a falta de foco comprometa a obra como um todo. Sabe que estúdio tem feito isso, de inchar seus jogos, com frequência? A Ubisoft, algo que venho alertando em muitas das análises que tenho feito da empresa por aqui nos últimos anos.
Se posso ter um jogo que dura 10 horas com um gameplay com boa dinâmica, de boa jogabilidade, sem quebra de expectativas e ritmo em detrimento a outro que vai durar 40 horas, mas repleto de momentos cíclicos, que se repetem pela simples meta de esticar o tempo de jogo, alargando sua progressão principal com uma gordura que no final das contas não acrescenta em nada… bem, eu fico com o jogo de 10 horas.
E sei que esse ponto pode soar polêmico. Tem uma geração de jogadores na atual indústria que gosta dessa cenoura na ponta de uma vara. De voltar todo dia a um mesmo jogo, repetir as mesmas ações do dia anterior, e ficar nessa fermentação de dezenas de horas, pelo puro prazer de se manter em um universo confortável. Eu já fui um jogador assim até pouco tempo atrás, e ainda sou em algumas exceções de franquia que realmente me pego entretido em seu meio. Contudo, no geral, você se torna um adulto, com emprego, família e aquele luxo de jogar tempo fora… bem, vai ralo abaixo. Verdade seja dita.
Por isso adorei a minha breve experiência com Drake’s Fortune. Uma semaninha jogando, de pouco em pouco, fechando seus rápidos 22 capítulos, pausando quando me sentia cansado dos combates, e no fim, a viajem, além de nostálgica, foi muito prazerosa.
Claro que se você está pensando que 10 horas é muito pouco para uma aventura single player, lembre-se que estou jogando esse título dentro da coletânea Uncharted: The Nathan Drake Collection, o que significa que ainda tenho mais duas sequências para apreciar assim que concluir este texto. É o bastante, se pensar dessa forma, não?
E mesmo que você ache que a aventura original que deu início a franquia é curta demais, até mesmo nisso se pensou naquela época. A aventura apresenta 60 colecionáveis escondidos pelo mundo do jogo, e ainda que o caminho seja bem linear, é bem fácil deixar escapar um monte delas até o final da aventura.
Não só isso, mas este primeiro game também entrega cinco níveis de dificuldade, do fácil ao brutal. O jogador pode jogar capítulos selecionados, e assim procurar os colecionáveis a partir de qualquer ponto da campanha. Quer mais? Dá para jogar esses mesmos capítulos em uma espécie de modo Time Trial, a qual se corre contra o relógio, outro elemento bem característico do estúdio, que o coloca em seus jogos desde os tempos de Crash Bandicoot.
Entretanto, talvez a coisa mais legal para a longa cauda de replay desse jogo sejam as recompensas e extras destraváveis, que permitem que o jogador ligue e desligue diversos elementos ao rejogar a aventura principal. Mundo espelhado, diversos filtros de cores, diversas skins de personagens, incluindo o de Sully, Elena e até mesmo uma versão gordinha de Nathan (no melhor do bom humor que o estúdio sempre teve). É possível até mesmo selecionar armas para carregar e destravar munição infinita, dentro outras coisas como apenas um tiro já matar o inimigo. É o tipo de brincadeira que muitos jogos perdem a chance de brincar.
Considerações finais
Uncharted: Drake’s Fortune é uma obra prima de seu tempo, não há como negar. Pode ter envelhecido um pouco se apreciado em 2022? Pode sim, mas isso não tira nem um pouco de seu brilho e principalmente de sua diversão e apreciação. Parte disso por conta de um desenvolvimento muito competente, sem que exista perda de foco ou inchaço de jogabilidade, apenas para enrolar sua longevidade.
O título tem inspirações em clássicos jogos de aventura, mas consegue ter seu charme próprio. Nathan, Elena e Sully são bons personagens, com boas personalidades, sem soarem clichês demais. A trama de caça ao tesouro, ainda que meio tímida neste primeiro jogo, dão o tom certo e funciona. Os vilões que ficam se traindo não chegam a terem um grande destaque, sendo que o maior risco ao protagonista é sempre a aventura em si.
A campanha, de aproximadamente 10 horas, é o suficiente para construir esse universo que já ganhou diversos outros jogos, e certamente já evoluíram muito mais essa base construída aqui. O jogo é objetivo, muitas vezes aposta em ser direto e simples, sem se complexar demais, o que também o torna muito acessível a uma maior game de jogadores.
Mesmo curtinho, sua cauda, com ares meio arcade, funciona muito bem. Caça aos colecionáveis, rejogar capítulos correndo contra o tempo, os extras que ligam novas skins e mudanças no jogo em si, como espelhar todo o ambiente, permitir que o jogador escolha as armas ou os muitos níveis de dificuldade. Tudo isso torna agradável repetir a experiência mais um ou duas vezes.
Aliás é impressionante ver que a franquia Uncharted está localizada em português, com dublagem em nosso idioma, desde essa primeira aventura. E é uma ótima dublagem, com as vozes que combinam muito bem com os personagens. Foi uma surpresa encontrar Drake’s Fortune dublado em português, ainda que a geração PS3/X360 tenha mesmo dado o pontapé nessa iniciativa no mercado brasileiro. Lembro de como Halo 3 causou essa comoção também em 2007.
Um último detalhe: para uma versão remasterizada para o PlayStation 4, visualmente o jogo não está feio não. Claro que dá para notar que trata-se de uma obra mais antiga, porém os personagens tem boas expressões faciais, as texturas funcionam e alguns elementos como a água e fumaça de explosões estão de acordo com o esperado. Soa mesmo como um jogo repaginado para o PS4, com aquele pezinho da geração anterior. Rodá-lo no PS5 não faz nenhuma mágica nesse sentido gráfico, contudo o carregamento é basicamente automático. Não presenciei em nenhum momento telas de loadings, nem mesmo quando morria em meio ao combate, com a ação sempre retornando de imediato.
Encerro essa experiência de Uncharted: Drake’s Fortune muito satisfeito. Um pouco envergonhado de só estar conhecendo-o agora, é verdade. Mas antes tarde do que nunca. Fora que conforme envelhecemos, essa coisa de revisitar antigos games tem um apelo nostálgico a tempos mais simples, e que ainda são realmente divertidos, especialmente com jogos icônicos e bem desenvolvidos. Agora com licença, que irei para as próximas aventuras de Nathan Drake.
Galeria
Dando nota
Nostalgia pura de outros tempos, em que jogos de aventura podiam ser mais objetivos, sem quebra de ritmo - 9
Naughty Dog manteve muito de seu DNA quando deu início ao que depois se tornou a franquia Uncharted - 9
Na parte visual o tempo o envelheceu um pouco em certos aspectos, mas ainda é um jogo bem agradável - 8
Entrega uma divertida aventura de caça ao tesouro, passando por florestas, montanhas, cavernas e templos. - 8.5
Combate foi o que mais envelheceu, mas ainda assim diverte com sua característica mais arcade - 8
Mocinhos são carismáticos, enquanto os vilões são mais fracos enquanto ficam se traindo entre si - 8.5
Aventura de 10 horas é o suficiente, sua longa cauda ficar por conta de extras e colecionáveis cativantes - 8.5
8.5
Clássico
Uncharted: Drake's Fortune em sua versão remasterizada para o PlayStation 4, incluso na coletânea The Nathan Drake Collection, é um título divertido, mesmo sendo apreciado mesmo depois de tantos anos de seu lançamento original. É um jogo que precede outros que se inspiraram nesse retorno aos jogos de aventura, enquanto também foi feito inspirado em obras que existiam antes. A Naughty Dog fez um grande trabalho de releitura desse gênero lá em 2007. Fazendo um olhar pensando nesse passado, Drake's Fortune vem de uma época em que os jogos não precisavam de certa gordura que muitos jogos assim possuem atualmente. É objetivo, direto e por isso entrega bom ritmo e dinamismo. Ainda diverte, mesmo nos dias de hoje. Um clássico, que ainda se mantém bem até os dias de hoje.