Análise | Pokémon Scarlet & Pokémon Violet
Disponível para Nintendo Switch
Pokémon Scarlet & Pokémon Violet é um convite para a 9ª geração de pokémons, novas criaturas, em uma nova região, Paldea, em uma nova jornada para se tornar (novamente) um mestre pokémon. O título tem como grande trunfo a expansão do conceito de mundo aberto, elemento explorado nos últimos jogos da franquia, ainda que continue entregando uma campanha semi linear, enquanto como contratempo, haja muitos problemas de tecnicalidade que vão atrapalhar um pouco a imersão dentro da aventura.
O jogo foi desenvolvido pela mantenedora principal da franquia, responsável por todas as nova gerações da série, a Game Freak, é claro. A distribuição global segue pela Nintendo e a The Pokémon Company, sendo esta última responsável de cuidar da marca e todos os produtos relacionados ao universo Pokémon, desde jogos, brinquedos e produções na TV e em outras mídias. Scarlet e Violet são jogos exclusivo do console Nintendo Switch e tem como data oficial de lançamento o último dia 18 de novembro.
Como tradição na série, são duas versões de um mesmo jogo, a qual cada versão tem pontos de características distintas. No geral as diferenças se resumem a alguns pokémons que são vão surgir apenas em determinada versão, da mesma forma como certos personagens que irão orientar e interagir com o jogador. O tema central da história também muda de uma versão para outra, sendo em que Scarlet o jogador investiga muito mais o passado da região, enquanto em Violet se estudo o futuro, isso inclusive reflete nos lendários existentes em cada versão. Dito isso, a pokédex é a mesma, assim como os ginásios, os objetivos principais e o mundo em si.
Outra pontuação inicial importante a ser feita é que apesar de ambos os jogos possuírem localização em 8 idiomas – alemão, chinês simplificado, chinês tradicional, coreano, espanhol, francês, inglês, italiano, japonês – ainda não foi desta vez que os fãs brasileiros irão desfrutar de uma jornada pokémon em nosso idioma. A Nintendo tem trabalhado com alguns jogos em português do ano passado pra cá, contudo, ainda não foi a vez de Pokémon. E seria tão importante ao público mais jovem, especialmente o infantil, poder desfrutar de um Pokémon em português… resta que os jogadores brasileiros continuem nessa campanha reiterando a importância da localização de tais jogos.
Mundo aberto, com ressalvas
Um dos maiores destaques de Pokémon Scarlet e Pokémon Violet é a forma como ambos os títulos apresentam o mundo ao jogador, dando lhe o poder de explorar livremente a região de Paldea, excluindo as clássicas rotas fechadas, que ainda existiam na 8ª geração, em Sword & Shield, quando optaram por manter essa estrutura, e em paralelo também entregava imensas áreas abertas intermediárias, apenas em pontos chaves do mundo.
E assim, a Game Freak também experimentou bastante com Legends: Arceus, lançado no inicio deste ano. O título spin-off explorou o conceito de vastas áreas abertas, mas segurava a progressão do jogador em uma grande base central a qual sempre se fazia necessidade retornar. Essa regra cansava um pouco a jornada, pois criava esse cenário de ir e vir pelo mundo, passando por certos locais com muita frequência, o que fadigava um pouco.
De olho na expansão de tal conceito, Scarlet & Violet abre os horizontes de possibilidade. Sem rotas fechadas, sem bases para retornar, Paldea é realmente um grande mundo livre a se explorar, com realmente poucos espaços fechados inicialmente, como ilhas e lagos a qual o jogador vai precisar aprender a navegar pela água antes de atingir tais pontos. Contudo, de florestas, desertos, cidades, tudo é possível acessar muito prematuramente no jogo, desde sua hora inicial.
A estrutura da campanha parte do princípio da clássica jornada pokémon, a qual o jogador é um jovem que acaba de se matricular em uma grande escola de treinadores, sendo que entre aulas e aprendizados, os alunos saem pelo mundo atrás de vencer os oito ginásios.
Porém como novidade para esta geração, o jogador recebe mais dois objetivos primários, que devem ser almejados em paralelo as vitórias de ginásio: encontrar e batalhar contra cinco pokémons gigantes (denominados Titãs) que dominam certas áreas, em busca de uma planta mística (que lhes conferem tal tamanho), assim como invadir e derrotar os líderes da Team Star, que estão causando problemas pela região, em meio a uma missão diferenciada de batalhas automáticas, a qual explicarei melhor daqui a pouco.
Então são três caminhos: Victory Road (ginásios), Path of Legends (titãs) e Starfall Street (malvadões). No momento em que o mundo se abre, logo após uma rápida introdução na escola, todos os líderes, pokémons e bases são apresentadas no grande mapa do jogo, deixando para o jogador decidir o que fazer primeiro, para onde ir, e qual rota tomar para cada área.
Parece incrível, não? E em parte é, contudo há algumas ressalvas importantíssimas que acabei descobrindo as duras penas. Logo que o mapa me mostra todos os líderes e caminhos que posso tomar, decidi escolher os ginásios com base nos tipos de pokémon, tendo como base o fato de ter escolhido o pokémon inicial do tipo água. Vencido o ginásio mais perto do ponto de partida, o que obviamente ficou claro que deveria ser o primeiro a ser enfrentado, escolhi um outro mais distante.
Ao longo do percurso notei que os pokémons foram ficando mais fortes, de nível maiores do que os meus. Só que isso não foi problema, porque ao batalhar com estes pokémons selvagens, para capturar e ir completando a pokédex, meu time também foi acompanhando o nível destes pokémons. Ao chegar no local desse próximo ginásio, meu time já estava acima do nível 22, e os pokémons estavam entre 25 e 28, o que achei razoável.
Lidar com o líder desse ginásio foi suado, o que pessoalmente achei épico. Mas aí percebi que pokémons acima do nível 25 não me obedeciam direito. E tudo bem, isso é uma característica da série. Conforme se vence os ginásios é que pokémons de níveis maiores acabam lhe obedecendo. Então achei estranho vencer um ginásio de nível 30 sendo que pokémons acima de 25 não me obedeciam direito. Meu inicial, já na segunda evolução, salvou minha batalha nesse ginásio.
Depois dessa vitória, segui para outro ginásio, e aí o nível dos pokémons escalou para acima do nível 38, com ocasionais pokémons de nível 40. E minha progressão travou, pois a obediência dos meus pokémons não batia com o nível do local. Não venceria meu terceiro ginásio. Então resolvi consultar a internet para entender o que não tinha entendido desse conceito “faça como quiser nesse mundo aberto“.
Foi aí que descobrir, apesar de ser mundo aberto, cada área de mundo tem um nível fixo. Existe uma ordem certa de ginásios para ser vencida, assim como de bases do Team Star, e dos Titãs a serem vendidos. Aí descobri meu erro. Pulei dois ginásios, que ficavam no lado circular contrário do mapa, que deveria ter ido antes de ir para aquele de nível 30. O jogo não lhe informa isso, porque não diz na legenda do mapa o nível de cada área ou de cada ginásio. Um erro grosseiro a meu ver. Se existe uma ordem, há que ser informada. Jogador não é vidente.
Então estava numa progressão com duas vitórias de ginásio e uma equipe de pokémons que evoluíram tanto que não me obedeciam mais, na exceção do meu inicial. O que precisei fazer? Fui a estes ginásios que pulei com outra equipe. Capturei pokémons de níveis menores, só que mesmo assim, já estava amaciado. Venci estes dois ginásios com uma mão nas costas. Zero dificuldade. O que me entristeceu um pouco. Se tivesse ido na ordem que o jogo foi programado, talvez a experiência tivesse sido melhor.
Então qual é o erro do conceito de mundo aberto de Pokémon Scarlet & Pokémon Violet? Simples, o nível das áreas e dos pokémons, assim como dos objetivos principais, precisam acompanhar o nível do jogador e de seus pokémons. Ou então informar o level de cada área (o que provavelmente é mais fácil de se fazer). Mas o ideal seria o mundo acompanhar o jogador. Se você venceu um ginásio, o mundo passa a funcionar inteiramente no nível 2 de dificuldade. Venceu o terceiro? Escala tudo para nível 3. E assim por diante. E aí sim, você tem a real sensação de liberdade total para fazer sua jornada pelo caminho que bem entender. Como não é, ficam estas ressalvas e procure na internet o level e/ou ordem para se bater as missões do jogo.
Deixando de lado esse engasgo progressivo no mundo aberto, digo que esse conceito torna a aventura muito mais agradável e divertida do que a antiga fórmula de rotas fechadas e campanha estritamente linear. Ter que interpretar o mapa, olhar possíveis rotas, descobrir que não é preciso apenas seguir a estrada de terra, e que as áreas são bem amplas e repletas de itens para coletar e pokémons para capturar, torna tudo muito agradável. Algo que você tomaria 10 minutos pra ir do ponto A ao ponto B, facilmente vira uma hora de exploração, batalhas e colecionáveis.
Também gosto da forma como o mundo de impõe ao jogador. Os pokémons estão todos visíveis, nada de grama alta com pokémons invisíveis. As batalhas ocorrem em tempo real. Os treinadores que ficam pelo caminho não engatilham batalhas obrigatórias, você batalha com eles se quiser, e ao chegar em casa cidade, há um NPC que conta com quantos batalhou pelo caminho, e lhe dá uma recompensa se atingir um número mínimo. E então você descobre que também tem treinadores escondidos/afastados fora da trilha padrão.
A captura de pokémons selvagens volta ao sistema clássico de batalhar para enfraquecer ou então colocar para dormir, e então capturar. Aquele esquema (básico demais) de apenas jogar a pokébola que vimos em Legends: Arceus não foi reutilizado aqui – o que certamente foi uma boa decisão. O jogador ainda arremessa uma pokébola, já que o pokémon está visível pelo mundo, contudo isso engatilha uma batalha ali mesmo, em tempo real.
Tecnicamente problemático
Seguindo adiante, impossível não comentar alguns pontos fraquíssimos de Pokémon Scarlet & Pokémon Violet no que diz respeito as questões técnicas do jogo. Assim, a minha percepção é que graficamente o jogo é inferior a direção de arte encontrada em Pokémon Sword & Pokémon Shield, títulos que abriram a 8ª geração em 2019, e também foram desenvolvidos com exclusividade para o Nintendo Switch. Problemas de cenários e texturas mal carregadas, ou simplesmente feias mesmo, em alguns momentos acentuam o problema.
E só posso chutar o que aconteceu, por meio de palpites. O primeiro é que Sword & Shield são jogos muito mais lineares, o que permite trabalhar melhor ambientes auto contidos, ainda que me recordo que as áreas abertas tinham certo cuidado com detalhes. Por outro lado, Scarlet & Violet são jogos muito mais abertos, com uma área de exploração muito maior, o que torna mais complicado trabalhar tantos ambientes e detalhes, principalmente com algumas limitações técnicas do Switch. Ainda que jogos como Xenoblade Chornicles 3 tenha demonstrado que colocar a culpa no hardware do console é uma justificativa infundada, pois dava para melhorar isso.
Contudo é interessante apontar que enquanto Sword & Shield atualmente ocupe (individualmente) um tamanho de armazenamento de 12GB no Switch, já Scarlet & Violet possui um tamanho muito menor. Cada versão pede em média 7GB de espaço no console. Tudo bem que isso é louvável para quem está preocupado com espaço do HD do console, contudo, não sob a consequência de um jogo graficamente inferior.
Há também uma segunda causa que pode se somar a tal inferioridade gráfica: trata-se de uma obra que precisou passar por parte de seu desenvolvimento durante a pandemia do coronavírus, e sabemos que muitos estúdios japoneses tiveram suas dificuldades para lidar com o trabalho em home office e se adaptar ao trabalho remoto. Não só eles, é verdade. Toda indústria de jogos eletrônicos sofreu um gargalho complicado nestes últimos dois anos. E não vamos nos esquecer que em paralelo a este lançamento, a Game Freak também estava desenvolvendo o Pokémon Legends: Arceus, e que saiu no começo desse ano.
O ciclo de desenvolvimento de cada geração de jogos de Pokémon é normalmente três anos, mas vamos admitir que estes últimos três anos não foram normais em relação aos três anos de desenvolvimento de Sword & Shield. O resultado é o que temos hoje, um jogo que em certos aspectos parece inacabado. Talvez a Nintendo e a Pokémon Company devessem ter quebrado a regra dos 3 anos e dado a Game Freak mais um ano. A bem verdade é que Legends: Arceus poderia ter sido o jogo de Pokémon de 2022. Dava para ter segurado a 9ª geração para 2023 se o objetivo fosse aprimorá-lo visualmente.
Até porque o título não sofre apenas de uma direção de arte complicada, mas a própria taxa de quadros do jogo é terrível. Isso já havia sido pontuado em Legends: Arceus, mas ficou ainda mais acentuado em Scarlet & Violet. Personagens e pokémons andando ao fundo dos cenários com uma baixíssima taxa de quadros ocorre a todo o momento. Andar pelas cidades do jogo é uma experiência muito ruim nesse aspecto. Rompe constante a imersão da aventura.
Também me incomoda muito como o mundo aberto funciona em relação a forma como os pokémons vão aparecendo. Normalmente você chega a uma área aberta sem nada, ou com um ou dois pokémons apenas andando, e aí conforma a câmera vai rodando, o jogo vai colocando pokémons ao seu redor nos pontos em que a câmera não está mostrando em tela. Então numa área vazia, de repente você gira a câmera e ali estão pokémons que não estavam ali um segundo atrás.
Ainda comparando com Legends: Arceus, isso não aconteceu lá, onde os pokémons eram visto de uma grande distância, mesmo que em baixa taxa de quadros, e frequentemente surgiam nas proximidades em seu campo de visão. Claramente se tentou algo diferente aqui, mas deixar as áreas vazias e ir colocando eles enquanto a câmera está mostrando outro ponto de visão tornou um pouco perturbador pra mim. Preferia vê-los surgindo do nada, mas ciente que o jogo estava carregando os mesmos.
Fora que se o jogador estiver correndo pelo mundo, demora-se demais para os pokémons surgirem, dando a impressão de mundo vazio. É preciso parar em cada área, ficar rodando a câmera, e deixar o jogo carregar os pokémons. É estranho e sigo com a questão de quebra de imersão a todo momento.
Na parte de bugs e glitchs, as redes sociais tem demonstrados personagens voando, braços malucos, NPCs deformados e etc, porém não presenciei nenhum momento assim. Na parte de crash, o jogo fechou comigo uma única vez, ao invadir a uma base da Team Star, mas como há um salvamento automático, não tive nenhuma perde significativa no progresso da aventura.
Acho que o máximo do que posso chamar de bugs que presenciei foram os que ocorreram em algumas batalhas contra pokémons selvagens, pois como os confrontos ocorrem no mundo em si, as vezes o ângulo da câmera se fixa em um ponto que vaza o cenário do chão, especialmente se o combate ocorre em um terreno íngreme. O que depois você, como jogador, conserta porque pode mexer a câmera livremente assim que a batalha inicia. Um detalhe bobo, mas que novamente demonstra essa sensação de que o estúdio não teve tempo de finalizar essas miudezas estéticas e que causam certa deselegância a experiência de jogo.
No mais também quero apontar que nas cidades há muitos locais de lojas para compras de itens que não possuem seu interior. O jogador chega na loja, entra, e vai direto para um menu de compra de itens. Em outros locais, pode-se entrar e apreciar o interior e os NPCs presentes aqui. É meio difícil definir porque uns locais tem interior e outros não. Deixa a impressão de que tem interior aquilo que deu tempo de desenhar e colocar no jogo, e aquilo que não deu tempo de finalizar ficou apenas no menu mesmo.
Um último ponto, e aqui não é uma crítica específica deste título, e que também foi feita nos últimos jogos da série lançada para o Switch, é a completa ausência de voz para personagens nas cenas de animações, algo que era total compreensível quando a franquia estava nos portáteis da Nintendo, mas que nada se justifica ter se mantido no atual console híbrido. E não qualquer motivo para que isso continue assim.
E o jogo tem cutscenes bonitas, quando a música sobe, tem efeitos sonoros, e o personagem mexe a boca e então… nada. Um pequeno texto silencioso aparece em cima da cena e mata completamente a alma do que a cinemática está tendo fazer. Vou exemplificar: há uma cena muito bonita em que um personagem explica sobre a busca dele por um remédio milagroso para curar o pokémon canino idoso dele, já velhinho e super fraquinho. Toda a cena é muito tocante, mas tudo realizado em texto, tentando (em vão) dar a intensidade do que está sendo falado. Não faz mais sentido manter a série sem áudio nestes momentos tão bem construídos.
Não estou dizendo que o protagonista tem que ter voz, porque existe essa tradição na Nintendo por heróis silenciosos, contudo a restrição para os demais personagens NPCs não faz sentido em um console como o Switch, a qual aguenta tranquilamente arquivos de áudios para diálogos. Sequer estou dizendo que seria necessário dublar o jogo nos 8 idiomas suportados pela obra, mas ao menos em japonês e inglês, no mínimo.
Para encerrar, a grande questão que se pode tirar disso tudo é: estes problemas comprometem a qualidade de Pokémon Scarlet & Pokémon Violet? Com certeza. Contudo há dois pormenores a se considerar aqui. Primeiro que patchs futuros podem otimizar um pouco mais o jogo, no visual e na taxa de quadros. Se virão, não dá para saber ainda*. Segundo que o nível de diversão que o jogo pode, para a maioria dos fãs, contrabalancear merecidamente todos estes problemas. E esse é o próximo ponto desta conversa.
* pequena nota editorial 01.dez.22 – A Nintendo avisou em suas redes sociais que o jogo está recebendo uma atualização, nesta data, versão 1.1.0, e que os comentários dos jogadores estão sendo levados a sério e que vão trabalhar em melhorias. (leia o tweet aqui).
Diversão de qualidade
Problemático ou não, Pokémon Scarlet & Pokémon Violet ainda é um título dessa aclamada franquia em que você tira 30 minutos para jogar e quando se dá conta se passaram mais de 3 horas. O tempo voa e você não sente o peso disso. Esse é o elemento diversão proporcionada, que não se compromete mesmo com tantos pontos críticos apresentados.
Se você me indagar se prefiro um jogo mais bonito, com rotas lineares, em detrimento ao conceito de mundo aberto visualmente ainda não refinado, vou dizer que o mundo aberto é infinitamente melhor e sem dúvida seria a minha escolha. Percebe o impacto disso? Se o desenvolvimento passou por problemas com tempo necessário e pandemia, a Game Freak deu atenção ao elemento mais importante para a experiência, conseguindo entregar algo que diverte bastante, enquanto não soa mais do mesmo, como a fórmula da franquia já soava alguns gerações atrás.
Sair pelo mundo é sensacional. Descobrir os pokémons de cada área, tentar capturá-los. Olhar os diferentes tamanhos, algumas interações inusitadas entre eles, ver como alguns se posicionam no mundo, sejam andando em grupos, fugindo do jogador, ou partindo pra cima, voando, escondidos em árvores, escondidos na areia, nadando em poças ou em rios e no mar. Nesse ponto, é uma experiência agradável de observar.
A apresentação da Pokédex também é de tirar o chapéu, pois o catálogo de Paldea apresenta 400 pokémons para serem capturados, dentro novos pokémons e clássicos de todas as demais gerações. É um número muito grande de espécies, ainda que você vá sentir falta de alguns que não estão ainda presentes aqui, e que somente em 2023 poderão adentrar via conexão com o Pokémon Home, vinda de outros jogos.
Mas o que realmente gostei da pokédex é seu visual, que agora possui algumas artes visuais dos pokémons sendo exibidos como uma capa e contra capa de um livro, com os registros dos pokémons sendo visualizados em uma espécie de biblioteca digital, a qual cada monstrinho representa um livro na imensa prateleira de 400 livros.
Já mencionei em alguns parágrafos acima que o método de captura se mantém no formato clássico, de batalhar até enfraquecer. Nessa questão das batalhas, a fórmula segue muito fiel a estrutura já conhecida. Cada pokémon ainda possui quatro movimentos, sendo que ao aprender um novo, é preciso se desfazer de um dos quatro em uso. Tipos ainda seguem a mesma regra de fraqueza e ataques super eficazes. Água vence fogo, que vence grama, que vence água. Não há novos tipos aqui, mas o repertório segue dentro os clássicos, desde elétrico, rocha, fada, psíquico, fantasma, escuridão etc. Tudo está de volta, e segue as regras de um bater o outro.
Além disso o jogo tem algumas facilidades que foram inseridos nos últimos jogos da série. Por exemplo, não preciso estar em um centro pokémon para mexer nas caixas que mantém todos os pokémons que já capturei, já que a minha equipe só pode ter seis pokémons ativos como uma equipe. Então tudo que capturar vai para a reserva, e sigo podendo, a qualquer momento tirar alguém da reserva no lugar de alguém já da equipe. Nas batalhas, todos mundo ganha experiência e vão subindo de nível juntos, como uma equipe, o que facilita muito manter a equipe melhor balanceada em um único nível de força. Golpes esquecidos podem ser reaprendidos via menu, sem ser necessário encontrar um NPC específico no Centro Pokémon. Coisas assim foram adicionados nos jogos mais recentes e seguem a tendência por aqui. São aspectos modernos que se mantém nestas edições e que dão ritmo e tornam o título menos burocrático e mais acessível.
Dentre as novidades de gameplay, destaco a possibilidade de tirar o pokémon principal da equipe, o que está em primeiro na fila, da pokébola e deixar o mesmo andar livremente pelo mundo. Nas áreas abertas, ao fazer isso, seu pokémon irá batalhar com tudo que estiver em seu caminho, em um sistema de batalhas automáticas. Isso não leva nem 2 segundos quando seu pokémon bate de frente com outro. Se o pokémon adversário for muito forte, o mesmo pode nocautear seu pokémon, mas se mantiverem no mesmo nível, é sempre certo que o seu pokémon ganhe, mesmo contra tipos que levam vantagem ao tipo do seu pokémon, e aí ele terá um pouco de perda de energia. O melhor disso tudo? Mesmo nas batalhas automáticos, seu pokémon e todos da sua equipe, seguem ganhando experiência a cada vitória.
Esse novo modelo de andar por aí com seu pokémon também acaba sendo utilizado dentro das missões principais da campanha. Nas invasões de base dos chefões da Team Star, seu pokémon precisa bater um certo número de pokémons dentro de um tempo limite. Nestas missões é possível arremessar os primeiros três pokémons da sua equipe, e aí cada um pega um pokémon adversário que está protegendo a base. Claro que quando chegar o confronto contra o chefão da base, aí a batalha volta ao formato tradicional, e é o jogador quem deve vencer, ao escolher os movimentos do pokémon ativo no confronto.
Outro elemento que achei interessante neste edição, que mexe um pouco com a estrutura da franquia é a aquisição do pokémon lendário de cada versão, logo no momento inicial do jogo. Claro que nesse ponto o jogador ainda não poderá usá-lo em batalhas, contudo, o pokémon irá lhe acompanhar por toda a aventura e terá habilidades de exploração no mundo aberto. Poderá andar em sua versão motoca, depois correr, nadar e até mesmo sair voando conforme se vai progredindo pela aventura. O lendário faz parte da trama principal, e cabe ao jogador descobrir mais sobre o mesmo, além de destravar seu poder oculto. Muito mais interessante do que aquele aspecto de só enfrentá-lo e capturá-lo no final da aventura.
Trio inicial
Também não posso deixar de comentar sobre os iniciais dessa nona geração. Sprigatito, Fuecoco e Quaxly. A tradição se manteve com três iniciais do tipo grama, água e fogo. Até aqui tudo bem, não acho que há que se mudar a fórmula, ainda que não me importaria se repensassem isso, até porque se for olhar no conceito atual destes iniciais, todos possuem um segundo tipo no estágio final de evolução (grama/escuridão, fogo/fantasma e água/luta). Então meio que não deixa de ser meio trapaça da Game Freak, por assim dizer.
Contudo, preciso discutir a decisão do design das evoluções destes pokémons. Não sei, mas tenho a impressão de que os desenvolvedores perderam um pouco a mão e exageram onde não precisavam exagerar. Tome por exemplo o Quaxly, um patinho irado com um baita topetão descolado. O estágio final desse patinho se chama Quaquaval, e independente de ser macho ou fêmea, o visual dessa evolução é uma mistura um pato/pavão carnavalesco, tipo uma versão pato meio passista de samba, comum ao nosso carnaval (daí o nome imagino). Não curti não pela referência carnavalesca, mas por achar incompatível com o design inicial, de um patinho todo descolado de topete.
E os demais iniciais também passam por algumas esquisitices. Fuecoco evolui para Crocalor, e que bicho feio. Era pra ser um sombreiro de fogo em sua cabeça? Felizmente sua terceira evolução é um crocodilo/lagartão de fogo super irado. Mas tipo… já tivemos um crocodilo como inicial, não? Saudades de você Totodile. Boa época em que as evoluções ainda eram condizentes com a forma inicial de cada pokémon (na maioria das vezes).
Não é muito diferente com Sprigatito, a qual sua última evolução é Meowscarada, que é mais uma versão humanoide gato. Não tenho problema com pokémons com cara de digimons, mas sinto saudades das evoluções mais animalescas, mais feras mesmo. Torterra e Venusaur são bons exemplos. O gatinho não podia virar um gato selvagem irado ou até mesmo um dentes de sabre? Porque um gato humano de máscara? Tudo bem, o conceito era de que os iniciais teria algo meio alegórico em suas evoluções, mas sei lá. Achei um design bem horroroso. No caso do Quaxly até mesmo incoerente com sua versão inicial.
Não tira o brilho do jogo, mas certamente acho que muitos não devem manter estes pokémons em sua equipe ao fim do jogo. Talvez fiquem durante a campanha, por conta do nível alto que vão acabar tendo, mas há novos pokémons mais interessantes no jogo, a qual o design é muito bem acertado. Ao todos são aproximadamente mais de 100 novos pokémons para Scarlet & Violet, o que é um número bem aceitável para um nova geração, dentro de uma franquia já muito inflada de criaturas.
Enfim, visual das criaturas provavelmente é uma questão de gosto. Há quem curta, há quem não curta. Eu estava lá quando a primeira geração foi lançada, então claramente tenho certa nostalgia pelos clássicos, com um design mais simples e óbvio, enquanto a franquia cresceu e se permitiu tomar direções diferentes aqui e ali, criando estes pokémons que muitas vezes me lembra um pouco o formato de design dos Digimons. Mas fico com as minhas impressões quando aos iniciais dessa nona geração, achando que poderia ter tomado uma direção de arte diferente, mantendo o charme do visual inicial de cada um também em suas evoluções.
Tudo cristalino
Algo que tem ocorrido a cada geração de jogos de pokémons, desde a sexta geração, quando se criou as mega evoluções (saudades disso), foi o conceito de transformações temporárias dos pokémons durante as batalhas, que potencializam os poderes dos mesmos, conferindo-os condições únicas e em uma única vez a cada batalha. Em Sword & Shield, por exemplo, os pokémons podiam ficar gigantes com o que chamaram de fenômeno dynamax!
Em Pokémon Scarlet & Pokémon Violet há o fenômeno da cristalização, chamada Terastal no game, que literalmente cristaliza os pokémons nos combates, permitindo que realizem certas proezas. Quando ativado a cristalização, que só pode ocorrer uma única vez, com um único pokémon, por partida, o pokémon literalmente recebe uma camada de cristal por todo seu corpo, assim como um adorno enorme de cristal surge em sua cabeça. O visual desse adorno vai depender do tipo é o pokémon, por exemplo, um de fogo terá um candelabro, enquanto um de fada terá um coração enorme de cristal, assim com o pokémon elétrico terá uma enorme lâmpada.
A cristalização não torna o pokémon maior, como ocorria em Sword & Shield, mas fortalece seus ataques, dando a vantagem para quem o fizer, meio que obrigando a contra parte na batalha a fazer o mesmo ou segurar o tranco com alguma estratégia. Contudo como a cada geração a transformação tem algum revés interessante, aqui em Scarlet & Violet, a proposta é que os pokémons possam possuir um tipo elemental extra, a qual até então um pokémon de certo tipo nunca poderia ter. Isso o jogo chama de Tera Type.
Isso explica, por exemplo, porque um Pikachu pode usar um movimento Fly, a qual somente tipos voadores de pokémons podem ter. Quem adquirir qualquer uma das versões do jogo no lançamento e usar a Mystery Gift, irá receber um Pikachu exatamente com essa Tera Type voador, juntamente com o movimento Fly.
Ao longo da exploração do mundo, jogadores irão notar que alguns pokémons estão pelo mundo com um certo brilho especial, isso indica uma batalha Terastal, e que o pokémon irá iniciar a batalha cristalizando-se, e normalmente isso também indicará que o mesmo possui um Tera Type especial. Posso dar outro exemplo, no litoral cheguei a encontrar um Sandygast, que é um pokémon do tipo fantasma (ghost) e terrestre (ground), mas como ele sofria desse fenômeno que atinge Paldea, ao batalhar ele se cristalizou e mostrou que seu Tera Type era grama (grass), o que lhe permitia usar o movimento Giga Drain, que normalmente essa espécie de pokémon não pode usar.
Percebe como isso é interessante? Pokémons com movimentos que habitualmente não poderiam ter, de tipos a qual não são característicos. Isso permite ao jogador criar estratégias e surpreender oponentes. Claro que visualmente não é tão icônico ou memorável quando os pokémons ficando enormes como ocorre em Sword & Shield, mas ainda é uma proposta válida. Claro que nem todo pokémon tem um Tera Type incomum a sua espécie, e aí o fenômeno da cristalização serve apenas para fortalecer ataques e sua defesa.
O único revés dessa tática de batalha é que após o jogador utilizar em batalha, uma nova cristalização só pode ser possível se você levar a orb que permite sua utilização em um Centro Pokémon, para que a atendente faça a recarga na orb. Então mesmo na exploração do mundo aberto, é preciso usar com sagacidade da técnica, pois caso contrário, é preciso ficar retornando ao centro para recarregar o artefato que lhe permite usar o fenômeno.
Não posso deixar de comentar que as Batalhas de Raid (Incursão) retornam em Pokémon Scarlet & Pokémon Violet. O formato é bem semelhante ao de Sword & Shield. Quatro jogadores online se reúnem para lutar contra um pokémon cristalizado, de um nível de forma superior aos encontrados no mundo aberto, e aí final da batalha, cada jogador pode escolher capturar esse pokémon. A disposição destes encontros permanecem em beacons ao redor do mundo, grandes pedras brilhantes de luz que podem ser observados de grandes distâncias. Ao interagir com uma destas pedras o jogo lhe pergunta se gostaria de batalhar online ou offline, a qual se pode colocar três jogadores controlados pela CPU para lhe auxiliar.
Mas assim, na boa? Achei estas batalhas muito fáceis, bem mais do que as encontradas em Sword & Shield contra pokémons gigantes. Mesmo diante do nível de batalhas, rankeado por estrelas. Os jogadores online são bem apelões, e normalmente um ou dois golpes acabam com o pokémon. A novidade aqui fica que agora você não precisa mais esperar que cada jogador faça seu movimento. Escolheu o golpe, seu pokémon já sai atacando. O que acho justo e coerente.
Para quem não tem paciência de fica procurando os beacons no mundo aberto, no menu do jogador há uma opção de Portal Online, a qual se pode escolher batalhas Raid diretamente por ali, de jogadores que estão procurando membros para batalhar em equipe. O que certamente é muito prático em eventos, como o que ocorreu no último final de semana (25 a 27 novembro), com Eevees de diversos Tera Types. Foi muito mais prático procurar estes pokémons pelo menu online do que caça-los em seus beacons no mundo aberto.
Considerações finais
Pokémon Scarlet & Pokémon Violet reafirmam essa nova fase da franquia Pokémon com a experiência de mundo aberto, menos linear. Expande o conceito a qual vinha sendo inserido nos últimos jogos de maneira mais condita e escancara o padrão para os futuros títulos da série. Não que a fórmula antiga não possa retornar em algum momento, mas não é o que parece indicar a partir desse ponto. E não deixa de ser uma influência do que The Legend of Zelda: Breath of the Wild fez ao reinventar o conceito de jogos de mundo aberto a qual você realmente tem uma experiência de poder escolher seus caminhos.
O único problema é que Scarlet & Violet esbarram nos muitos problemas técnicos que estão evidenciados neste momento de lançamento. Graficamente é um título que parece inferior aos jogos da franquia que se encontram no Switch, como o próprio Sword & Shield, de três anos atrás. Se houve problemas no tempo de desenvolvimento, porque houve uma pandemia que atropelou tudo e obrigou o mundo a se reorganizar, seria ideal que o estúdio se posicionasse, que houvesse o diálogo a respeito e até mesmo a possibilidade de adiar mais alguns meses o lançamento. E agora que já foi, atualizações virão e vamos acompanhar o desempenho do jogo após isso.
É um título que soa inacabado nestes aspectos visuais, que apresenta problema de taxa de quadros constantes, algo que é inerente ao hardware do Nintendo Switch, que tem envelhecido rapidamente frente aos consoles concorrentes, mas que outros estúdios tem sabido lidar. Será que a Game Freak não precisa atualizar sua engine? Alguma coisa é preciso ser feita. Isso não há dúvidas. Até mesmo o relato do jogo crashar (desligar) durante a jogatina é algo que os jogos da Nintendo não costumam sofrer e que tem tido relatos disso acontecendo pelas redes sociais. E comigo ocorreu uma única vez, felizmente.
Contudo, e há um gigantesco (melhor dizendo, um cristalino) porém no que diz respeito a tais críticas que Scarlet & Violet está sofrendo: o jogo é um dos mais viciantes pokémons de todos os tempos. É feinho, engasga um pouco, mas ainda assim é genuinamente divertido. E quando se trata de jogos com qualidade Nintendo, a diversão é sempre um dos fatores mais importantes. É um jogo de 20, 30, 40 horas que você não sente as horas passar, que lhe pega e vicia, como é tradição na franquia Pokémon e em cada nova geração.
E querendo ou não, esse é só o ponto inicial de uma nova geração. Não se sabe ainda se os jogos receberão novos conteúdos, ou se uma terceira versão virá eventualmente, mas está certo que em 2023 a Pokémon Home será liberada e novos pokémons devem invadir as batalhas e trocas online. Eventos liberando novos pokémons em Tera Raid também estão confirmadas. O que me perece que este lançamento não é a linha de chegada para esta nova fase, e sim apenas um ponto de partida. Uma partida truculenta, mas ainda assim um começo, e um divertido começo, repleto de novas experiências no mundo Pokémon.
Galeria
Dando nota
Graficamente o jogo tropeça em diversos aspectos, principamente em ambientes abertos e sua pobreza em detalhes - 6.5
Taxa de quadros também incomoda bastante, assim como a demora para os pokémons aparecem no mundo aberto - 6.5
Mundo aberto funciona, sem rotas lineares, faltou progressão acompanhar o level do jogador, o que limita certa liberdade - 8
Fator diversão está no nível máximo aqui, pois mesmo com problemas, você joga e não vê a hora passar - 10
Fenômeno Terastal é interessante, mas não vence a gigantização da geração anterior - 8.2
Seguimos com mais uma geração sem localização em nosso idioma, o que cria barreiras ruins de acessibilidade - 7
Capturar, batalhar, andar pelo mundo de Pokémon parece nunca cansar, é impressionante - 8.5
7.8
Divertido
Pokémon Scarlet & Pokémon Violet parecem esbarrar em problemas de desenvolvimento inerentes aos anos de pandemia, que de fato atrapalhou toda a indústria de jogos. O resultado é um título que soa inacabado em certos aspectos mais técnicos. Contudo, na parte que realmente interessa, a diversão, é um dos melhores títulos das últimas edições, finalmente abraçando o conceito de mundo aberto. Mesmo que haja certas ressalvas quanto a liberdade de vencer as coisas em qualquer ordem. É uma boa nova geração de pokémons, mesmo com pormenores em diversos aspectos. Funciona, diverte e entretém. E para Pokémon, é isso que importa.