Análise | Prince of Persia: The Lost Crown

Disponível para PlayStation, Xbox, Nintendo Switch & PC

Prince of Persia: The Lost Crown te leva a uma nova jornada pelas areias do tempo da mitologia persa, trazendo um novo universo juntamente com um novo protagonista em uma aventura num espaço onde o tempo é relativo e os desafios acabam num limiar entre a vida e a morte, dentro de um labirinto repleto de armadilhas e inimigos mortais.

O jogo é um dos primeiros grandes lançamentos de 2024, tendo sido lançado no último dia 18 de janeiro, e disponibilizado tanto para os consoles da atual geração, PlayStation 5 e Xbox Series X|S, quanto para a geração anterior, PlayStation 4 e Xbox One, assim como para plataformas que transitam entre estas definições, o Nintendo Switch e o PC.

Seu desenvolvimento ficou a cargo da Ubisoft Montpellier, estúdio francês dos muitos pertencentes pela Ubisoft, sendo um dos maiores estúdios do grupo, responsável, em grande parte, pelos muitos jogos do universo de Rayman, desde o moderníssimo Rayman Legends (2013) aos clássicos Rayman 2: The Great Escape (1999) e Rayman 3: Hoodlum Havoc (2003). Quer mais um? É o mesmo estúdio que também trabalhou no clássico Beyond Good & Evil (2003). Ou seja, é um dos estúdios mais competentes da Ubisoft quando se pensa em jogos de aventura, que tem sobrevivido as décadas e gerações de jogos.

A respeito do mundo de Prince of Persia, para este lançamento não é importante que os jogadores entendam muito a respeito do legado dos jogos anteriores da IP, pois é um novo recomeço, sob uma nova proposta, até mesmo de gênero em si. Contudo, é sempre curioso apontar que o primeiro Prince of Persia é um jogo lançado no distante ano de 1989, como um jogo de aventura em plataforma, criado por Jordan Mechner.

A Ubisoft entra na história de Prince of Persia somente em 2003, quando adquiriu os direitos da franquia e criou o reboot que reviveu esse universo: Prince of Persia: The Sands of Time, que inclusive trouxe de volta Mechner como consultor criativo, e também para criação de design e criação de cenários. Isso deu origem a uma trilogia de jogos de muito sucesso, um filme para os cinemas, um segundo reboot (altamente injustiçado) em 2008, assim como também é considerado um dos jogos que inspirou a criação de uma das maiores franquias atuais do estúdio: Assassin’s Creed.

Prince of Persia: The Lost Crown é a mais nova tentativa da Ubisoft de reativar esse universo, que ficou estagnado por muitos anos, dado justamente o sucesso de Assassin’s Creed. E para isso, se tornou necessário uma nova história, sem conexão com os protagonistas anteriores, assim como uma repensada no gênero, deixando de lado a tentativa de um jogo de exploração, plataforma e aventura 3D para um jogo de ação metroidvania 2.5D, que é um formato com bastante evidência nos dias atuais.

Príncipe sequestrado

A trama de Prince of Persia: The Lost Crown envolve certos elementos históricos reais, porém envoltos em um conto de fantasia, sem que haja um comprometimentos com eventos reais, porém é muito legal que haja esse aspecto. Por exemplo, o protagonista é membro de um grupo de guerreiros chamados Os Imortais, uma denominação que de fato existiu no Primeiro Império da Persa, a qual eram classificados soldados pesados de alta elite do exército. No jogo, contudo, há somente sete destes guerreiros, cada um com habilidades assassinas únicas, de alto poder de combate.

Nosso protagonista, Sargon, se vê envolvido em uma trama a qual o Príncipe Ghassan é sequestrado logo após o grupo dos Imortais terem saídos vitoriosos numa sangrenta batalha dentro do reino. O sequestro parece envolver a mentora do guerreiro, a General Anahita, que tudo indica era uma pessoa de confiança e amiga de Sargon. Imediatamente após o sequestro, o grupo dos Imortais recebem a missão de irem atrás de Anahita e assim resgatar o príncipe.

Alias, curioso que aqui temos um príncipe sequestrado, não? É tão clichê de videogame o herói sair atrás de uma princesa. Contudo, não dá para esquecer que há “Príncipe” (Prince) no título do jogo, e que o protagonista desta vez, não é o príncipe, mas um guerreiro que serve ao reino. Ou seja, um encaixe apropriado para que o título funcionasse.

Os Imortais seguem em uma jornada até o Monte Qaf, um local que também tem um pé nos contos reais da mitologia do Oriente Médio, envolvendo uma lendária montanha da região, que no jogo serve de local para uma cidade amaldiçoada. Tão logo chegam ao local, os membros do grupo de Sargon resolvem se separar e logo descobrem que o tempo passa diferente para cada um. Enquanto o jogador acompanha os primeiros minutos e horas de Sargon no Monte Qaf, para os outros Imortais, dias, semanas, meses e até anos se passaram. O que está acontecendo?

Esse elemento do tempo e espaço é uma característica primordial da franquia desde The Sands of Time (2003), e é importante para o DNA da série. Sendo que é bem interessante que haja esse reflexo aqui tanto na narrativa, quanto posteriormente na jogabilidade em si, em habilidades que Sargon irá aprender dentro do labirinto que o Monte Qaf irá se apresentar. Desmaterializar objetos, criar clones temporais, se deslocar no ar, e até mesmo começar a encontrar cópias suas perdidas no tempo que desejam seus poderes para possam continuar suas buscas pelo príncipe.

Fórmula metroidvania

Prince of Persia: The Lost Crown não segue exatamente a jogabilidade estabelecida pelos jogos anteriores da era Ubisoft, que envolviam ambientes 3D com desafios em plataforma, exploração de mundo e combate de ação frenético, contudo respeita muito bem certos verbos dessa fórmula. Por exemplo, os momentos em que o jogador irá se sentir desafiado com elementos de plataforma ainda são frequentes, assim como o combate frenético onde a esquiva e a defesa são tão importantes quanto um bom combo de ataques.

Esta nova investida na série consegue respeitar estes parâmetros e moderniza-os para um ambiente 2.5D em que a jogabilidade de avanço lateral (side-scrolling) dá o tom da perspectiva desta nova jogabilidade. Claro que num ambiente de jogo 2D os momentos de plataforma são muito mais sobre precisão e o momento exato de pulo do que quanto num jogo 3D, onde este dá mais liberdade ao jogador para ser criativo ou exigir que ele observe melhor o ambiente afim de descobrir o próximo pulo. Aqui a precisão e o entendimento do ritmo são mais importantes e equilibram bem essa troca.

Já no combate o sentimento de evolução e modernidade demonstram uma evolução para a IP. Prince of Persia: The Lost Crown apresenta combates em uma perspectiva 2D que podem não soar tão desafiantes quanto um combate de um Dark Souls, contudo, isso não quer dizer que não exista desafio e atenção do jogador. Não é um combate de pressão ou amassar botões, pelo contrário, inimigos vão se defender, quebrar seus combos e impedir que sejam eliminados instantaneamente. As batalhas contam com esquivas, parry (defletir um ataque) e contra-ataques. Observar os inimigos é importantíssimo aqui.

A aventura conta com diversos tipos de inimigos, desde criaturas da mitologia persa, quanto soldados, de mortos-vivos e de tribos locais, que arremessam projéteis (envenenados) ou que brandam enormes armas, como machados, espadas, lanças e, claro, adagas duplas, uma característica desse universo. Inimigos possuem ataques especiais, em que uma aura vermelha significa um ataque indefensável, a qual se esquivar é a única solução, quanto um ataque de aura amarela, que indica que se o jogador o defletir no momento exato, poderá executar um ataque que instantaneamente mata seu oponente, numa cena de execução única bem impressionante.

O sistema de combate é tão bem idealizado que o jogador não irá batalhar com dezenas de inimigos esponjosos ao mesmo tempo, pelo contrário, o número será sempre pequeno, normalmente um ou dois, o que irá se perceber que mesmo assim estes duelos se tornarão mortais. Esse elemento é exaltado pelo fato de que o jogador nunca terá uma barra de saúde que irá suportam muitos ataques, ainda que como todo bom metroidvania, você irá aumentá-lo gradativamente com sua progressão pelo mundo interconectado do jogo.

Agora, falando justamente do elemento medroidvania de Prince of Persia: The Lost Crown, o que posso dizer é que o título idealiza muito bem essa fórmula, contudo não reinventa nada dentro do gênero. Não é como no caso de Ori and the Blind Forest, que quando lançado em 2016, colocou os metroidvanias em ascensão num mercado na época que não dava a mínima para tal gênero. O que se percebe é que The Lost Crown existe porque houve jogos como Ori para criar essa possibilidade. Não só isso, mas quando olho para os desafios de plataforma não consigo deixar de pensar em como Super Meat Boy trouxe muito para estas mecânicas de ritmo e velocidade em plataformas 2D, e que funcionam muito bem aqui.

Claro que não reinventar, não significa que é preciso dar deméritos para Prince of Persia: The Lost Crown. Como disse, a obra idealiza muito bem o que quer e suas mecânicas funciona bem ao gênero apresentado. Os elementos estruturais do universo de Prince of Persia estão muito bem inseridos aqui e a jogabilidade entrega muito bem qualidade e precisão, tanto no combate, quanto na exploração.

Como um metroidvania o título também observa muito bem certas opções de acessibilidade, servindo muito bem para apresentar o gênero a jogadores não habituais com o mesmo. Existem muitas opções de acessibilidades, desde os ícones que se apresentam no mapa, quanto a regras de parry com tempo mais generoso, entre vários níveis de dificuldade afim de evitar a frustração de um gênero em que o jogador precisa ir e voltar por ambientes em que ele precisa conhecer bem seus cantos e buracos. Ele é desafiador, mas não pelos padrões do gênero, e sim pelos elementos corretos de um videogame (boa jogabilidade, narrativa, respostas dos controles), o que é uma decisão corretíssima da equipe de desenvolvimento. Isso é admirável.

Considerações finais

Prince of Persia: The Lost Crown é um título que pode dividir a comunidade fã da franquia Prince of Persia, que poderia esperar algo mais parecido com suas obras anteriores, enquanto a entrega aqui é sim uma proposta diferente, mas que respeita elementos e legado a qual a série representa. Também não é uma edição que parece ter a aspiração de se tornar grande quanto um Assassin’s Creed atualmente é. Soa exatamente como algo paralelo, um spin-off de uma franquia aclamada.

O jogo tem uma boa apresentação inicial, porém admito que o ritmo levou um tempo para me convencer. Até Sargon chegar ao Monte Qaf, a jogabilidade inicial se arrasta um pouco, se preocupando em montar a narrativa, arrastando bastante a curva inicial de jogabilidade. As coisas melhoram após a primeira habilidade de deslocamento aéreo, permitindo que Sargon aumente a distância de seus saltos e assim sua mobilidade pelos ambientes, que passam a ser mais inspirados por conta disso.

Até a trama melhora com o progresso da aventura. Os efeitos do Monte Qaf nem sempre são sentidos pelo jogador, enquanto os NPCs parecem sofrer bastante com isso, e é até uma pena que o ambiente não consiga transparecer isso diretamente ao gameplay, contudo as versões alternativas de Sargon dão um toque curioso a estes eventos. Também fiquei surpreso com a reviravolta que ocorre pela metade da campanha, que vai exigir que Sargon tenha novos objetivos que num primeiro momento parecem impossíveis de serem conquistados. É possível vencer a morte? Bacana, bacana.

Na questão do gameplay, também faço elogios ao sistema de combate, que se mostrou muito interessante para um jogo de perspectiva 2.5D, onde o jogador não vai vencer os inimigos simplesmente amassando os botões. É preciso observar os padrões dos inimigos, esperar para defletir seus ataques, executá-los quando tiver a chance e evitar ao máximo tomar dano em combate, já que a saúde leva tempo pra se restaurar, assim como a morte não lhe fará renascer no mesmo local, levando-o de volta a pontos de checkpoints do jogo, o que é típico do gênero em si.

Também acho agradável o sistema de amuletos, que criam bônus e status extras para o jogador, desde um ataque adicional em seu combo, aumento da barra de saúde, resistência aprimorada a venenos ou até mesmo a possibilidade de tornar visível a barra de saúde dos inimigos, o que pra mim é quase que obrigatório se manter equipado. Há muitos amuletos que criam estes buffs em seu jogador, porém o número de slots é limitado, então sempre se faz necessário pensar quais deixar ativados e quais são melhores a depender da área explorada.

Além disso, a aventura ainda conta com uma forja, a qual o jogador pode gastar cristais, a moeda do jogo, para aprimorar suas armas, aumentando seu dano, ou até mesmo aprimorando seus amuletos, permitindo o aumento de seus bônus e atributos.

No que diz respeito ao layout do mundo interconectado, característico de um metroidvania, Prince of Persia: The Lost Crown o faz de uma forma bem inteligente, criando atalhos convenientes entre as áreas, uma vez que se tenha descoberto novas habilidades para acessá-los ou simplesmente quebrando barreiras entre portas quando se consegue ir para o lado inverso das mesmas. Cada área também tem sua ambientação peculiar e inimigos próprios, além de suas armadilhas que podem ou não ser únicas. É uma ótima construção de mundo, com boas conexões entres suas áreas.

Não cheguei a mencionar, mas Prince of Persia: The Lost Crown chega ao mercado brasileiro totalmente localizado em português, com textos e diálogos apresentando legendas em nosso idioma. Isso pode até parecer óbvio em tempos atuais, mas sempre acho importante ressaltar essa conquista, dado o fato de que ainda existem empresas e jogos que chegam por aqui sem localização, enquanto a Ubisoft segue acreditando em nosso mercado e localizando seus lançamentos. Então, ainda é preciso parabenizar as empresas por isso.

Ao fim, Prince of Persia: The Lost Crown soa como um jogo que talvez não merecesse uma grande atenção neste começo de 2024, contudo não acho um pensamento correto. O título tem muitos mérito, e traz de volta uma franquia muito querida pelos fãs. Tudo bem que a aventura não será o suficiente para sanar a vontade de um jogo no modelo mais tradicional do reboot de 2003, num ambiente de exploração tridimensional, contudo esse novo universo se apresenta com muitos aspectos bacanas que podem voltar e ser explorados em outros jogos, em diferentes gêneros. E é aquela coisa, se os fãs não acreditarem, a franquia volta a hibernar.

Para fãs de jogos no estilo metroidvania, que não são poucos hoje em dia, Prince of Persia: The Lost Crown, cumpre todos os requisitos para uma ótima aventura, especialmente quando se ultrapassa a hora inicial de jogo, quando a jogabilidade finalmente se apresenta e os desafios de plataforma e o combate começam a brilhar. Boas batalhas contra chefes enormes, boa direção de roteiro, excelente resposta dos controles e muitas opções de acessibilidade vão agradar a diferentes jogadores, enquanto também apresentam o gênero a quem mais quiser conhecer. Muitos acertos nesse sentido. Vai impressionar muitos, enquanto se mostrar competente a quem é veterano ao gênero. Vá, volte, ganhe uma nova habilidade, e avance por uma aventura repleta de elementos incríveis da mitologia persa.

Galeria

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Dando nota

Retorno de uma amada franquia, em uma nova abordagem, respeitando os elementos de legado - 8.5
Sargon é um bom protagonista, e a aventura prende o jogador através desta jornada de traições e reviravoltas - 8.5
Jogabilidade metroidvania funciona, mesmo sem reinventar nada, e não mata a saudade em relação aos jogos de aventura 3D - 8
Combate é sagaz e divertido, com muitas opções de combos, habilidades, , finalizações, esquivas e parry em diferentes adversários - 9
Ótimos momentos de plataforma, com pulos que vão exigir ritmo e precisão - 7.5
Curva inicial é um pouco lenta e a jogabilidade demora um pouco a se apresentar - 7
Bom ambientes, apresentam inimigos únicos, armadilhas próprias e exigem habilidades distintas, tudo bem conectado e com bons atalhos - 8

8.1

Ótimo

Prince of Persia: The Lost Crown realinha uma franquia de sucesso em uma nova proposta, sem desrespeitar elementos e parâmetros estabelecidos em jogos passados. Muda o gênero, porém a aventura continua na mesma atmosfera, o combate está ainda mais sagaz e os desafios em plataforma continuam expressivamente divertidos. A jogabilidade metroidvania, ainda que não reinvente nada, se apresenta como uma boa ideia e entrega um gameplay muito agradável e responsivo, que atrai tanto veteranos ao gênero, quanto a quem está conhecendo-o agora, encontrando diversas opções de acessibilidade para diferentes níveis de jogadores. A trama conquista, e o ritmo ganha força após uma lenta curva inicial.

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